Por Fabiana Fagundes
A reportagem da Rádio 730 teve acesso ao demonstrativo da Execução Orçamentária do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e observou que a autarquia, responsável pela fiscalização das contas do Estado, não repassou o desconto dos servidores referente à previdência.
De acordo com a Lei nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, que estabelece regras gerais para o Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos (RPPS), as contribuições e os recursos vinculados ao Fundo Previdenciário da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios só podem ser utilizados para o pagamento de benefícios previdenciários dos respectivos regimes.
O repasse da contribuição devida ao RPPS deve ser efetivado até o dia 20 de cada mês, caso não ocorra, incidirão juros de 1% ao mês e multa de 2%, além de atualização monetária de acordo com a variação do índice Nacional de Preços ao Consumidor ( INPC). O Código Penal ordena como crime a ausência de repasse das contribuições recolhidas dos trabalhadores.
A suspeita foi levada ao conhecimento do Tribunal de Contas do Estado em representação feita pelo procurador Fernando dos Santos Carneiro. Ele define a situação como gravíssima, uma vez que coloca em risco o direito fundamental dos servidores públicos de obtenção de benefícios previdenciários garantidos pela Constituição. Na petição representada à conselheira substituta do TCE Heloísa Elena, Fernando Carneiro solicita explicações do presidente do Tribunal de Contas, Edson Ferrari.
Uma vez reconhecidas as irregularidades, o procurador de Contas sugere a quitação imediata dos débitos com juros e multas e as devidas punições para os responsáveis, que podem responder por improbidade administrativa ou até crime. “Se configurar apropriação indébita de contribuição tributária deve haver o encaminhamento de cópia da representação ao Ministério Público Federal e estadual para que tomem as devidas providências”, afirma Fernando Carneiro.
O presidente do TCE, Edson Ferrari, não quis comentar a suspeita de recolhimento e ausência de repasse das contribuições previdenciárias. A denúncia está sendo averiguada pelo auditor Marcos Borges, substituto de Heloísa Helena, conselheira relatora da representação e que está em férias. Borges diz que ainda não tomou conhecimento da ação e pela complexidade do tema precisará de tempo para fazer alguma consideração. “Essa semana eu já comecei a avaliar os processos e no período de 30 dias tenho que atuar em função da instrução interna. Sendo assim, então só poderei falar sobre isso quando tomar conhecimento do teor da suspeita.”
Conforme o assessor de Comunicação do TCE, Antônio Gomes, foi acordado que a contribuição previdenciária recolhida dos servidores seria destinada ao Tesouro Estadual e que a gestão do recurso ficaria sob a responsabilidade da Secretaria da Fazenda. “O Tribunal tem a quitação do repasse da contribuição previdenciária, se esse repasse não foi feito aí tem que ver é com a Secretaria da Fazenda.” Todavia, na Execução Orçamentária consta do débito dessa rubrica. Por meio da Assessoria de Imprensa, a Sefaz limitou-se a explicar que não há servidor inativo do TCE sem receber os vencimentos, o que significa que a contribuição previdenciária está sendo paga pelo Estado.
Representantes da GoiasPrev, autarquia criada há menos de quatro anos para gerir o fundo previdenciário dos servidores públicos estadual, reconhecem que o órgão ainda não tem estrutura para administrar as contribuições previdenciárias de todos os órgãos e instituições do Estado. O diretor de Gestão e Planejamento, João Carlos Potenciano, argumenta que até agora a entidade assumiu apenas a capitalização previdenciária dos servidores do Executivo e da Polícia Militar. De acordo com ele, os poderes Legislativo, Judiciário e fiscalizares, como o TCE, continuam administrando os próprios recursos previdenciários. Isso significa que eles não têm um fundo previdenciário e que a contribuição recolhida do salário dos servidores é gerida pelo próprio TCE e utilizada para pagar benefícios como aposentadoria e pensão dos inativos.
“Aguardamos o governador sancionar a lei que cria esse fundo de capitalização para os servidores nomeados a partir de primeiro de janeiro deste ano e, a partir daí, a contribuição desses servidores serão destinadas a um fundo e essa reserva irá custear futuros benefícios da previdência”, explica Potenciano.
De acordo com a nova lei, serão criados três fundos: dois financeiros, sendo um para arrecadação dos servidores que ingressaram no serviço público até 31 de dezembro de 2012 e outro específico para militares do mesmo período de nomeação; e um previdenciário, exclusivo para os novos servidores. Segundo Potenciano, a criação do Fundo Previdenciário representa solução em longo prazo para o déficit. A informação da Goiasprev é que, apenas no primeiro bimestre deste ano, já houve acúmulo de R$ 170 milhões de déficit. No ano passado, foram R$ 900 milhões. O projeto estabelece que a contribuição do servidor que vai para o novo caixa não poderá ser utilizada para reduzir o déficit do Fundo Financeiro dos servidores antigos.
Sem um fundo previdenciário consolidado, o dinheiro arrecadado dos servidores do TCE pode ser facilmente desviado, fato que preocupa o procurador de Contas, Fernando Carneiro. “Funciona assim: enquanto o dinheiro estiver dado para pagar, o Estado vai empurrando e, no dia que faltar, ninguém vai receber porque o dinheiro recolhido não foi depositado no fundo. É como se fosse feito uma poupança, enquanto guarda tem, mas se ocorrem desvios não haverá reservas e o servidor será o único prejudicado.”
O sindicato dos servidores do TCE ignora a denúncia e se mostra alheio aos riscos. A reportagem da Rádio 730 tentou por diversas vezes falar com o presidente do sindicato, Marcos José Barbosa. Ele não respondeu a nenhum dos recados deixados com a secretária. “ Ele não está e não falou que horas vai chegar. Não tenho autorização para passar o número do celular. Eu já passei seu recado para o presidente, só que ele não confirmou se vai retornar.”
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