Há uma década, as taxas de violência em Goiás aumentam. Para deputados, a causa pode ser a ação do bicheiro na segurança pública.
Ao sair de uma festa em Goiânia, na sexta-feira 20 de abril, às 2h30 da madrugada, a advogada Michelle Muniz do Carmo parou seu carro num posto de gasolina. Foi abordada e assaltada por dois rapazes. Ela tentou fugir e tomou um tiro no peito. A violenta cena foi registrada pelas câmeras de circuito interno do local. Outros quatro jovens, num carro alugado, davam cobertura aos assassinos. O corpo de Michelle foi encontrado, em torno das 4 horas, dentro de seu Honda Civic. O carro estava abandonado na Avenida T-63, área nobre e movimentada da capital de Goiás, em frente a uma distribuidora de bebidas.
Michelle, de 30 anos, era a mais velha de quatro filhos do deputado estadual Luiz Carlos do Carmo (PMDB-GO). De oposição ao governo do tucano Marconi Perillo, ele é taxativo ao rechaçar a primeira suspeita: “Não teve nada de motivação política. É somente violência”. Michelle – e, por consequência, sua família – foi mais uma vítima da crescente violência em Goiás.
Uma análise feita por membros da Assembleia Legislativa de Goiás constatou um aumento das taxas de criminalidade. De 2000 a 2010, houve uma alta de 74,7% nos homicídios na capital, Goiânia (leia o quadro abaixo). Os números não são vistos como uma fatalidade. Chamaram a atenção de duas CPIs, na Assembleia goiana e no Congresso Nacional. Ambas investigam as relações do contraventor Carlinhos Cachoeira com o mundo da política e as instituições. Parlamentares que comandam os trabalhos no Congresso disseram a ÉPOCA que aprofundarão as apurações sobre a violência em Goiás. Eles suspeitam que o crime organizado tenha se apoderado das estruturas e contribuído decisivamente para a explosão da criminalidade no Estado.
De acordo com um parlamentar, o grupo de Cachoeira deixou Goiás numa situação de “calamidade” por ter se infiltrado na polícia, no Executivo e no Judiciário. Segundo a investigação, das 81 pessoas listadas na Operação Monte Carlo como parte da quadrilha de Cachoeira, 41 eram ligadas à segurança pública. Promotores, delegados e policiais civis e militares eram usados para fornecer informações sigilosas, reprimir casas de jogos e caça-níqueis de concorrentes e proteger ações do bicheiro.
O presidente da Agência Prisional de Goiás e tesoureiro da campanha de Marconi Perillo na campanha de 2010, Edemundo Dias, é acusado de negar-se a dar prosseguimento a investigações sobre a organização quando era diretor-geral da Polícia Civil. Ele é apontado como um dos informantes do grupo. Segundo escutas da Polícia Federal, Cachoeira pediu ao ex-vereador Wladmir Garcez, citado no relatório como um dos participantes do esquema, para que ele intercedesse junto a Dias para que a responsabilidade das operações de repressão ao jogo saísse da força da elite da Polícia Civil e passasse para a Força Nacional. Na ocasião da denúncia, Dias negou ter ligação com Cachoeira. João Furtado Neto, que deixou a Secretaria de Segurança Pública de Goiás neste ano sob acusações de envolvimento com o grupo criminoso, é acusado de receber propinas da ordem de R$ 10 mil de Cachoeira. Segundo investigações, a origem do dinheiro é a construtora Delta. Furtado Neto nega.“Esses áudios foram analisados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. Se eles entendessem que eu tive participação em algo ilícito, teriam me indiciado”, disse na ocasião. O procurador-geral de Goiás Benedito Torres, irmão do ex-senador Demóstenes Torres, também foi citado nos diálogos entre Cachoeira e seu irmão. Benedito, por meio de nota do MP, negou as acusações e disse que desconhecia o relacionamento de seu irmão com Cachoeira.
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