Os dois principais pontos do indulto natalino assinado pelo presidente Michel Temer que foram suspensos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) não constavam da minuta encaminhada ao Ministério da Justiça pelo CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária).
Formado por juízes, defensores públicos, advogados e promotores, o conselho, vinculado ao ministério, é o responsável por anualmente elaborar a proposta que pode ser ou não ser encampada pela Presidência.
Neste ano, a proposta foi formulada ao longo de meses com a consulta a diversos setores do direito, como conselhos penitenciários estaduais, seccionais da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e tribunais de Justiça nos Estados.
A minuta foi enviada ao ministro Torquato Jardim (Justiça), que poderia ou não fazer modificações, para então ser enviada ao Planalto a fim de se tornar decreto presidencial. A medida foi publicada no último dia 22 com as assinaturas de Temer e de Jardim.
A pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, a presidente do STF, Cármen Lúcia, suspendeu parte do decreto nesta quinta (28).
No texto do indulto constaram dois pontos que não apareciam no texto enviado pelo CNPCP: a necessidade do cumprimento de no mínimo um quinto da pena para não reincidentes em crimes sem grave ameaça ou violência e a parte que prevê o alcance do indulto à “pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União”.
A informação foi dada à reportagem pelo presidente do CNPCP, o desembargador Cesar Mecchi Morales (Tribunal de Justiça de São Paulo). Ele, entretanto, evitou críticas a Temer.
“Quero ressalvar o seguinte, eu digo que [as duas hipóteses] não estavam [na minuta], é um dado de fato. Não estou criticando o presidente por ter feito uma opção diferente”, disse o desembargador, acrescentando que o presidente “também tem toda a liberdade de fazer as modificações que entender necessárias, convenientes”. “O presidente é autoridade política. O conselho é órgão de assessoramento técnico”, afirmou.
A reportagem procurou o Planalto e o Ministério da Justiça nesta sexta (29), mas nenhum dos dois explicou quando ou quem inseriu as duas hipóteses no decreto.
Por e-mail, a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) do Planalto informou que “quem trata desse assunto é o Ministério da Justiça”, que não se manifestou.
Segundo o desembargador Cesar Morales, a minuta enviada pelo CNPCP foi resultado de um trabalho “de vários meses”. “Houve sugestões de várias entidades do país inteiro”, disse.
O subprocurador-geral da República Mario Bonsaglia, coordenador da 7ª Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional da PGR, disse à reportagem que a Presidência não é obrigada a seguir a proposta do CNPCP. “Mas é preciso considerar que se trata de um órgão colegiado, bastante categorizado e dedicado ao exame da situação penitenciária, sendo prudente considerar suas sugestões”, afirmou.
Bonsaglia disse que o Ministério Público Federal também encaminhou sugestões, que, segundo ele, não foram consideradas. “Dentre elas a previsão de que o indulto não deveria ser concedido a condenados por crimes do ‘colarinho branco’ em geral”, disse.
Adiamento
O governo decidiu esperar o STF julgar de forma definitiva o decreto natalino de Temer antes de avaliar a publicação de uma nova medida para substituir os trechos suspensos pela ministra Cármen Lúcia. A decisão foi em caráter liminar, ou seja, provisório. Somente em fevereiro, após o fim do recesso, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, levará o tema a plenário.
O presidente quis aguardar a decisão final do STF para não correr o risco de criar uma crise com o Judiciário.
O Ministério da Justiça afirmou em nota que o indulto não teve a intenção de prejudicar a Lava Jato e que “apoia todas as investigações em curso”. Segundo a pasta, a decisão de Cármen “impede, neste momento, que milhares de condenados por crimes sem grave ameaça ou violência à pessoa possam se beneficiar do indulto, contrariando a nossa tradição”. (Folhapress)
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