07 de agosto de 2024
Publicado em • atualizado em 31/05/2024 às 09:40

Os limites da sala de espera

Oito horas da manhã de uma terça-feira e o cidadão já ouve em alto e bom som, e em looping, uma música pavorosa do Gusttavo Lima na sala de espera de uma clínica. Ao lado, eu só conseguia pensar como fones de ouvido são ferramentas incríveis se usados com sabedoria. Seriam mais incríveis ainda se as pessoas soubessem da sua função específica de conseguir ouvir o que se deseja sem incomodar quem está perto.

Como boa reclamona contida, apenas esbocei minha reação de descontentamento revirando os olhos com tamanha força por trás dos óculos escuros, que temi, por alguns segundos, que jamais voltassem a posição normal. Como já era de se imaginar, não adiantou. Ninguém ousa reclamar quando esse tipo de situação acontece. E para nosso azar, desde o advento dos vídeos rápidos nas redes sociais, ela tem acontecido com cada vez mais frequência. 

Nessas horas me pergunto: onde estão os fones de ouvido desse cidadão? Pior ainda: onde está o bom senso desta pessoa? Onde foi parar aquela coisa que nos dava o mínimo de preocupação com o incômodo alheio, que chamamos de capacidade de conviver em sociedade, respeitando os limites do espaço do outro?! Foi-se o tempo em que as pessoas liam revistas, jornais e livros nas salas de espera. 

De música do Gusttavo Lima a áudios bobos que fazem trilha sonora de vídeos mais bobos ainda, em tempos de redes sociais virais, não há mais silêncio e paz nas recepções brasileiras, muito menos no transporte coletivo, diga-se. Cada um com seu celular, ouvindo seu próprio áudio, no volume mais alto, que é para sobressair o barulho alheio. Enquanto isso, o silêncio, esse som belíssimo que tanto prezo, ficou cada vez mais raro. 

E pensar que isso tudo seria resolvido facilmente com o uso do fones de ouvido. O meu silêncio mantido, a música sertaneja ouvida com todas notas e agudos, o vídeo bobo da rede social plenamente compreendido sem interferências. Mas se não há preocupação com o espaço do outro, se não há desconfiômetro do incômodo, se não há capacidade para perceber os olhares de julgamento e os murmúrios ao redor, não há a mínima noção de convivência social, e também, não há mais nenhum resquício do respeito ao próximo. Perdemos esse discernimento do que é ou não é de bom tom, de onde termina o nosso espaço e começa o espaço do outro. O áudio no volume máximo é só uma amostra.

Luana Cardoso Mendonça

Jornalista em formação pela FIC/UFG, Bióloga graduada pelo ICB/UFG, escritora e eterna curiosa. Compartilho um pouco do mundo que eu vejo, ouço e vivo, em forma de palavras, afinal, boas histórias merecem ser contadas