(Artigo publicado originalmente no Tribuna do Planalto)
Há quem ainda busque lógica nas alianças políticas no Brasil. Ainda há quem se deixe perder nesse cipoal de incongruências chamado pragmatismo eleitoral. Argumentações de ordem ideológica, histórica, emocional, tudo vale para criticar ou justificar o repentino, ou nem tão repentino assim, alinhamento de um partido com outro, um líder com outro, que era inimigo e virou aliado de primeira hora.
Mas quem pode atirar a primeira pedra?
Em Goiás, o PSDB é aliado do PTB, que apoia o governo federal do PT, seu inimigo direto e declarado. O PSD daqui nasceu com DNA tucano, no entanto não se apõe ao PT no plano nacional. O PMDB é vice de uma petista, porém tem agora um democrata como candidato a senador. Logo do DEM, inimigo figadal da aliança PT-PMDB que tem a presidente da República e o vice.
O PT também tem, em Brasília, o PP como partido companheiro. Em Goiás, não. O PP é filho da antiga Arena, que abrigava os militares e sua ditadura tão combatida pelos petistas e peemedebistas. O DEM igualmente descende da Arena. O DEM. Que está com o PMDB em Goiás. PMDB. Que apoia o PT, que é inimigo do DEM, que é parceiro do PSDB, que é inimigo do PT mas aliado do PMDB em alguns Estados.
PMDB e DEM juntos, em Goiás, não é novidade. O presidente do partido, deputado federal Ronaldo Caiado, apoiou o então candidato a prefeito de Goiânia, Iris Rezende, à prefeitura de Goiânia. Depois, até ajudou a governar por um tempo.
PSDB e DEM juntos é caso antigo. Governam lado a lado desde 1998, quando o governador Marconi Perillo derrotou Iris para o governo. Na época, o PT se posicionou a favor de Marconi, no segundo turno, contra o PMDB e Iris. Em 2008, o PT indicou o vice na chapa da reeleição de Iris.
PMDB e PSDB é caso concreto no Estado, aqui e acolá, no interior. E há pelo menos um município de Goiás onde o DEM faz parte de uma mesma administração integrada pelo PT e comandada pelo PMDB. Estão juntos. Integrados.
O que há de novo no cenário político é outra coisa. A composição política que elegeu e vem sustentando o governador Marconi Perillo no poder já não é mais a mesma. Era uma vez o chamado ‘tempo novo’…
Verdade que o tucano e Ronaldo Caiado se estranham desde 2000, quando PFL (hoje DEM), PPB (agora PP) e PTB se juntaram na candidatura de Darci Accorsi (então ex-petista, neopetebista, e já de volta ao PT) à prefeitura de Goiânia e o PSDB sustentou Lúcia Vânia, acusando os três de dissidência.
Detalhes: 1) embora três, de quatro partidos aliados, estivessem juntos, para os tucanos os dissidentes não eram eles. Lógica própria. Apropriada; 2) todos perderam para o PT (Pedro Wilson).
O ‘tempo novo’ perdeu Ronaldo Caiado, aliado de primeira hora, e o DEM. Ah, mas perdeu em outros momentos, como quando Demóstenes Torres quis o governo – dirão uns. Certo? Nem tanto, já que o DEM, na prática, nunca saiu do governo, e Caiado sempre se manteve à parte, mas sem levar junto o partido.
Agora o DEM não só sai da aliança, como vai para a trincheira inimiga. E vai junto o nome emblemático da construção do marconismo: Armando Vergílio. Dizer que Armando não tem voto é curioso. Quando saiu candidato a governador, em 1998, Marconi era nada menos que um deputado federal, como Armando é.
Armando e Marconi tem história. Marconi e Caiado também. História juntos. Desde a semana passada, história separados. Juntos, eram uma coisa: ‘tempo novo’. Separados, o que são? Inimigos, como ficam?
Este é o primeiro movimento concreto de mudança no eixo político. Sem ideologia. Sem hipocrisia. O novo contra o velho? Dezesseis anos para um, dezesseis para o outro, como dizer quem é mais velho ou mais novo?
Correndo por fora, Vanderlan Cardoso (PSB) quer ser o novo, e Antônio Gomide (PT), o mais novo ainda. São diferentes, uma alternativa aos velhos PSDB e PMDB, mais aliados afins. Vanderlan. Que é do PSB, que acaba de anunciar apoio ao PSDB em São Paulo. PT, aliado nacional do PP, PSD e PTB, que em Goiás estão com o PSDB, contra o PMDB, que indicou e vai indicar de novo o vice de Dilma Rousseff: Michel Temer.
Não. O debate, em Goiás, não está fincado na ideologia. Nem na coerência. Por enquanto, está sustentado na hipocrisia. No frigir dos ovos, vai vencer não o mais novo, o mais bonito, o mais imaculado, ou o menos contaminado. Vai vencer quem jogar melhor. Quem errar menos.
Já começa perdendo, por exemplo, quem apela, quem chora as alianças perdidas feito leite derramado, ou que se queda nas lamúrias contra as regras do jogo. Só quem ganha com lamentações é o adversário. É jogar ou perder.
O fato inegável é que o jogo de forças políticas em Goiás mudou. A partir de outubro, os inimigos serão outros, e os aliados também. E o governo? Não será mais o mesmo.
Vassil Oliveira
Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).