Enquanto subo a trilha íngreme, com tudo aquilo que se possa incomodar insistindo em me manter desconfortável durante a caminhada, me pego reclamando, pela milésima vez, sobre a dificuldade da subida até o topo. A vista é linda, a trilha leva até o monte entre as nuvens, eu já sabia das adversidades que me aguardavam, planejei todo o trajeto e escolhi todos os aparatos que levaria comigo, mesmo assim, a reclamação e os pensamentos de desistência me pegaram em cheio.
Ao meu lado, um grupo sobe junto. Alguns passam alegres, cantando e desfrutando da vista enquanto sobem. Outros param para tomar um ar e descansar um pouco. Dois ou três, pelo que percebi, desistem e esperam as forças retornarem para enfrentarem a descida, já que a subida, para eles, deixou de ter sentido. Entre o grupo que persiste, uma moça me gerou identificação, logo começamos um papo, e nele, um choque de realidade se fez.
Falando sobre o que nos motivava a chegar até o destino, no topo da montanha, e das coisas que levaram à escolha da escalada, ela menciona, mesmo sem nenhuma intenção de que a fala fosse direcionada a mim, que uma das melhores partes da experiência era, justamente, a subida. É comum que nos esqueçamos, pelas dificuldades e desconfortos do trajeto, que para chegar ao alto é preciso subir, não há como desviar, se esgueirar e tentar artifícios, faz parte do processo.
Nessas horas, até nos esquecemos que fomos nós mesmos que escolhemos e, muitas vezes, quem pedimos, planejamos, e rogamos aos céus para que a oportunidade da subida acontecesse um dia. Sabíamos da dificuldade, conhecíamos todas as adversidades que poderiam surgir, inclusive, topamos a presepada com tudo incluso, achando o máximo, já que aquilo nos levaria até o destino final.
No início tudo é lindo. A vista salta aos olhos, a brisa bate no rosto, a diversão toma conta, a gente aproveita com encanto cada parte do trajeto. Só que, assim que as primeiras dificuldades começam a surgir, a coisa toda muda de perspectiva e a reclamação e o descontentamento tomam conta. A gente esquece de aproveitar a vista. Às vezes, nem percebe que há uma vista a ser apreciada, de tão envoltos pela dificuldade da subida. Se a intenção e a vontade do topo não forem fortes o suficiente, é fácil desistir.
Esse texto não é sobre escaladas, trilhas ou apreciação da natureza. Esse texto é sobre a vida. A moça companheira de aventura também não é uma visitante do monte, e sim uma fonte, que em uma entrevista me disse muito mais do que perguntei, mais ainda do que ansiava ouvir. Temos a falha mania de nos esquecermos do que pedimos à vida assim que as primeiras dificuldades começam a surgir. Mesmo sabendo que os momentos complicados existem, mesmo tendo ciência de que precisamos passar por eles, mesmo tendo oportunidades de traçar a rota, escolher os métodos e poder apreciar o caminho, que por mais incrível que pareça, é parte importante da subida, já que nos prepara para o topo.
É na caminhada que se fazem as memórias mais incríveis, que se moldam as principais habilidades para sobrevivência no topo, e além de tudo, é onde se passa a maior parte do tempo. Tempo esse que torcemos para passar logo, o mais rápido possível. Antes de reclamar, é importante parar pensar que foi você quem pediu para estar ali, e há algum tempo atrás, estar na caminhada até o topo simbolizava para você a melhor coisa da vida. Não importa qual é o topo do seu monte, qual é a dificuldade da sua trilha, nem quanto tempo você vai demorar para subir, o importante é que desfrute da experiência com a alegria e contentamento de quem está se aproximando exatamente daquilo que sonhou.