Há uma diferença muito grande entre um político ou uma política que consegue vencer eleições, articular-se bem e chegar longe na hierarquia do poder, e aquele ou aquela que se edifica no tempo, como exemplo, como referência, como estadista.
O presidente Michel Temer chegou longe. Hábil nos bastidores, cumpriu com competência a liturgia da ascensão. E, quando teve oportunidade, deu o golpe final na linha do tempo de sua trajetória: foi lá e tomou a Presidência.
Porque, nessa cartilha, poder não se conquista: poder, toma-se. Custe o que custar. A literatura que explica ou substancia isso é farta. Golpe de mestre? Há quem defina assim. Há quem enxergue em tudo apenas golpe de sorte. E quem nem golpe veja. Enfim, há diferença muito grande entre povo e… povo. Se é que me entendem.
Mas poder não é só conquista. E os dias, semanas, meses têm mostrado algo insofismável: se Temer foi ‘grande’ na conquista, tem se mostrado menor no exercício.
O exemplo mais recente disso é sua visão sobre a mulher. Ele falou demais. Falou bobagem. Detalhe: “Não foi gafe do presidente. Ele é assim”, anotou a jornalista Mirian Leitão, em um artigo que mostra, mais que tudo, desalento. “(Temer) Estava convencido de que era uma homenagem às mulheres quando disse toda aquela coleção de frases feitas e velhas que confirmam o papel tradicional da mulher.”
Para dizer pouco, Temer ainda é um presidente fora de seu tempo. Do tempo histórico, do tempo razoável, do tempo político. Do tempo que passa e muda a realidade. Ele ainda é de um tempo que se foi. Que só existe na memória, para em boa medida servir de exemplo, para o bem e para se evitar o mal.
Como um país pode se inspirar em um presidente que o envergonha? É este o ponto que mais incomoda hoje em Temer. Ele envergonha mesmo aqueles que gostariam de ter motivos para defendê-lo. Nem chegou ao ponto de ser ponto pacífico – a defesa de seus atos e posições – em conversa de boteco. Como chegará ao palco?
Persegue Temer, além da ilegitimidade da conquista do cargo, esse incauto incômodo provocado pelo seu comportamento que não se mostra ainda à altura da missão. Longe de se firmar acima do questionamento ao impeachment, e de se consolidar como norte independente dos fins que lhe deram os meios, ele se revela aquém. Está, principalmente, aquém da imagem que se tinha dele: a de alguém preparado para estar onde está.
Reparem que cuidei de dizer que Temer ainda está fora do tempo e ainda não se mostrou à altura do cargo. Porque tenho esperança… ainda. Torço para que ele vá além da vergonha alheia aos olhos do mundo. Que ele se encontre com o seu tempo, o nosso tempo. E que, quem sabe, conclua o mandato pelo menos maior que o trocadilho que inspira. Porque, por ora, é a única coisa que inspira.
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