Se há um negócio em alta para recomendar como oportunidade de ocasião é o da fabricação de mentira. Tá bombando. Ninguém dá conta da demanda e o combate aos seus efeitos anda em baixa. Taí: outro bom negócio é montar fábrica de combate à mentira. Você dirá: será verdade? Não sei se o produto de combate é a verdade. Muitos usam, mas nem todos conseguem resultados palpáveis.
Fosse eu médico da área, recomendaria, sempre. Mas sou jornalista, e mesmo a gente tendo objetivo final sempre a verdade, estamos em baixa. E não fabricamos nada. Somos meio. Logo, recomendar não é receitar. A receita vem de berço, embora se perca no meio do caminho. Enfim, complicado. Principalmente porque os próprios jornalistas não estão ajudando a restabelecer as bases da profissão. Sigamos.
Voltemos aos negócios. Outros negócios, digo. Fabricar mentira é fácil. Pegue uma pitada de fato comprovável e misture bastante teoria da conspiração. Não precisa açúcar, embora a dependência que causará seja a mesma. Espalhe o caldo grosso da suruba de raciocínio torto na mente tumultuada dos elementos frágeis da sociedade – cada um na sua – e balance, balance, balance como se fosse arrancar a cabeça do cidadão. Pronto.
A aplicação pode ser feita em Drive Thru, o que é fácil de montar e garante fila de diversão para quem aprecia uma boa dose de platitude e diversionismo. Quem quiser tomar em casa, basta enfiar a mente no liquidificador ou, não o tendo, na descarga da privada. Efeito imediato garantido. Ou seja, você fabricante de mentira não precisará propriamente de uma fábrica, apenas de pretensos inteligentes espertos – os genéricos idiotas de plantão – pré-fabricados. Cobre o que quiser diretamente nos grupos de WhatsApp. Bingo!
Um ex-presidente e parlamentares e youtubers de plena direita ou plenos poderes de persuasão sem ideologia mestra e todos os valentes patriotas que estão cientes dos imediatos resultados pecuniários do produto estão aí de prova. O negócio não falha. As maiores mentiras envolvem, já aviso e recomendo, a moralidade alheia. Não importa que você seja pedófilo, faça rachadinha, tenha matado o próximo ou defenda tortura e chacina pública. O seu produto em nada de negativo vai impactar na sua vida, só no seu bolso, e positivamente.
Fabricar mentira tem feito um estrago no Brasil, é verdade, mas diga que é mentira, que na verdade você está desmascarando as mentiras dos seus adversários, esses anti-brasileiros que não comungam com seus negócios, e tudo ficará bem, porque você provará ser verdade o que diz sustentando que você, sim, é um homem ou mulher de bem. Feito isso, viva em riqueza abundante, escancare sua esperteza e aponte o dedo para qualquer sinal de riqueza de dignidade e moral alheia. Você não tem nada a esconder, muito menos a sua safadeza e as suas tramoias.
Quem tem a esconder é quem tem consciência, respeito aos outros e essa coisa chamada alteridade e suas correlatas. Esse pessoal cheio de humanidade, na prática, não produz verdade e nada que tenha efeito contra sua genuína produção nacional de mentiras. E mentira eles definitivamente estão inaptos e ineptos – ainda, espera-se, opa, é fato – a colocar no mercado. Quando muito, conseguem fazer cócegas com umas mentirinhas mais risíveis do que críveis. E não se sabe por virtuosismo ou incompetência mesmo.
O mundo não está para brincadeira, mas está para mentira. Assim sendo, será longo o reinado das mentiras e mentiracões – as tais narrativas de elevada caloria mentirosística – nos próximos anos. É, definitivamente, sua sinuosa oportunidade de empreender no mundo da maldade rentável, o que é bem mais lucrativo do que tentar viver de maldade pela maldade. Maldar, como dizem, é ainda lucrar é o melhor dos mundos, isto posto.
Não perca tempo, não perca a oportunidade. Monte logo sua fábrica de mentiras antes que outro tome seu lugar. Antes que todos compreendam como fazer e então descubram, ou só reste, uma saída, estratégica ou mortalmente falando: a mentira ser a única verdade possível, caindo por terra todo seu atual efeito mitológico e divino-profético. No olho por olho, dente por dente, a verdade é chocha.
Pior: antes que o mundo acabe. Estou dizendo. Acredite: o mundo vai acabar amanhã, se você não mentir depressa. Agora balance a cabeça e se jogue na privada. Acelera, cidadão!
Vassil Oliveira
Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).