23 de novembro de 2024
Publicado em • atualizado em 13/02/2020 às 10:11

Marconi Perillo e a condução da narrativa – ou: quando uma foto faz mais oposição que a oposição

O que o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), tem feito nos últimos dias é tentar retomar a condução (ou controle) da narrativa. Ele, que está sendo apontado como vilão na história das rebeliões nos presídios do Estado, quer voltar a ser visto como herói.

É apontado como vilão, principalmente, por causa de uma foto dele andando calmamente pela praia, aparentemente ao lado de seu genro, enquanto os goianos, familiares de detentos inclusive, vivem dias de susto com imagens estarrecedoras, como presos fazendo festa regada a bebida e droga, e ameaçando mais rebeliões.

Não pegou bem, para dizer pouco em poucas palavras de fácil entendimento.

Voltar, reunir auxiliares, dar entrevista e apelar para a lógica de que só tirou três dias de folga e tudo estava o tempo todo sob seu controle – “’é muita hipocrisia achar que governante precisa estar presente” –, indicam um posicionamento contra a narrativa dos adversários e a imagem negativa que se alastrou nos últimos dias. Uma reação de resgate do comando da história, elevada à potência máxima com a presença da presidente do STF, Cármen Lúcia, em Goiânia, nesta segunda, 8.

Controle da narrativa é a estratégia que o governador vem usando desde, principalmente, o início do seu terceiro governo. Não que antes, nos governos anteriores, isso não existisse. Existia. Mas estava mais para norma de conduta, com objetivo de firmar o conceito do chamado ‘tempo novo’ estabelecido na campanha de 1998.

Desde 2011, o que mudou foi que o foco virou alvo, e a norma virou algo mais próximo de arma de guerra na propaganda idealizada de um líder inconteste em Goiás e com projeção nacional.

Alavanca muito a ação da assessoria o posicionamento do tucano. Ele é incansável na exposição (fotos e vídeos em abundância) e na argumentação (nada passa sem um comentário ou uma nota sua). Em resumo: ninguém faz propaganda melhor, de seu governo, do que ele mesmo.

O ponto fora da curva foi a foto na praia. Evidência de uma escolha: a permanência no sossego enquanto enquanto a população sofria com a incerteza. Prova – na visão dos críticos da atitude – de pouca atenção a um fato que demandava a presença de um líder para mostrar a saída para o caos.

Resultado: a foto, talvez somada a uma longeva estadia no poder, depois de quarto mandatos e 20 anos no comando direto e indireto do Estado, o que costuma produzir ‘fadiga de imagem’ e ‘cansaço no eleitor’ – as teorias neste sentido são muitas –, fez explodir memes e depoimentos nas redes sociais criticando duramente o governador.

A novidade é que foi algo muito além da oposição.

Porque a oposição política de Goiás pouco aproveitou o momento. Férias? Na crise?

Exceção à regra, o senador Ronaldo Caiado (DEM) até fez críticas fortes em um primeiro momento. O deputado federal Daniel Vilela (PMDB) demorou, mas também criticou. Fora os dois, pré-candidatos a governador, apenas um ou outro oposicionista foi para o campo de batalha das narrativas.

(Por falar em pré-candidato a governador, quem pouco narrou de si, como protagonista que poderia ter sido na ausência do titular, foi o vice, Zé Eliton.)

O governador apanhou geral, como se diz, no twitter, no Facebook, no instagram. No Whatsapp, então, onde parece haver mais espontaneidade e menos cuidado com a escolha das palavras, nem se fala.

Razoável, por isso, considerar que a foto na praia fez mais oposição a Marconi do que toda a oposição goiana desde tempos imemoriais.

O desnorteio do controle da narrativa ficou mais evidente no momento em que a imprensa nacional procurava o governador e pouco havia de explicação. O que ficou: por que não aparece? Onde está que, numa hora dessa, não está em Goiás?

Imprensa nacional: cobrança de fora para dentro, com ressonância elevada por pontuais desacertos na comunicação local.

Tem toda razão Marconi Perillo ao ponderar que todos merecem férias depois de um longo tempo de trabalho. Foram tão somente três dias. Mas, longe de ser hipocrisia, é da política: não basta ser, tem que parecer. E ele é político. Conhece o peso da simbologia dos atos, e a força da percepção dos fatos.

Não será fácil, para o governador, recuperar a narrativa justo no momento em que se prepara para deixar o governo. Ele já anunciou que sai em abril, para provavelmente ser candidato a senador.

E sai assim… depois de tantos anos de luta para estabelecer a imagem de herói de um Estado que é exemplo positivo para o País?… depois de uma gestão que se apresentava impecável até o questionamento nacional quanto ao trato do Estado aos recursos do sistema prisional, potencializada pelo embate na mídia com o Ministro da Justiça?

Marconi não é de deixar barato abalos à sua imagem. Vejam como reagiu na época da CPMI do Cachoeira. E como mantém vivo o relato de que avisou o ex-presidente Lula do mensalão. Ele sobrevive. E muitas vezes se fortalece nessas adversidades do jogo do poder. Tem sido assim.

Também é preciso ponderar que um abalo só não desfaz de todo um legado político, ainda que o momento seja de exaustão política, se é que é isso mesmo. Por ora, é um abalo.

Nos próximos dias e meses, veremos do que ele será capaz. E do que, em contrapartida, a foto da praia foi capaz de provocar em sua história.

Vence quem narra melhor.

 

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Vassil Oliveira

Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).