25 de novembro de 2024
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Lula, Zé Dirceu e o ex-PT

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro José Dirceu se encontram após os dois serem soltos, no dia 8 de novembro de 2019 Imagem: Twitter/@DirceuMemorias
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro José Dirceu se encontram após os dois serem soltos, no dia 8 de novembro de 2019 Imagem: Twitter/@DirceuMemorias

O PT tem dois nomes que mexem com os instintos do partido: Lula e Zé Dirceu. Mostrando vigor físico, mental e disposição para liderar o Brasil e mundo nas pautas mais duras e delicadas, como a guerra na Faixa de Gaza, Lula respira e inspira paixão. Dirceu mostra cansaço, um corpo pesado de outras guerras, mas mantém-se na luta; pensa, formula, vigia, fala, fala, fala, e aí incansavelmente.

Juntos, Lula e Zé Dirceu formaram a maior dupla da política brasileira nas últimas décadas, a que levou os rincões e as periferias ao poder em Brasília e promoveu mudanças significativas na vida das pessoas. Mais de 30 milhões saíram da linha de pobreza, lembremos. A dupla que elegeu a esperança das classes baixas e da classe média quando isso era apenas discurso e letra bonita em programas de governo.

Acontece que a dupla não é mais a mesma. Cada um no seu canto, cada qual com seu pranto e as suas bandeiras. Companheiros, sonhadores, mas a seus modos. Por conta de desgastes de imagem, vigilância adversária, ataques estratégicos justamente para impedir que caminhem lado a lado à frente das causas comuns e militâncias naturais, eles evitam o alinhamento aberto, a exposição conjunta.

Lula e Zé Dirceu são lideranças de um partido que se fez História e na História, goste-se ou não. Na trincheira, linha de frente da batalha, Dirceu foi abatido no Mensalão e se afastou. Tornou-se um líder petista à parte, preservando Lula e o PT na labuta. Foi assim que viu o impeachment de Dilma e o fundo do poço da Lava Jato. E a retomada da luta, com a volta de Lula ao comando do País.

Nessa caminhada, Zé Dirceu e o PT acumularam desgastes, carregando o estereótipo da corrupção carimbada pelos adversários. E viram emergir uma nova desordem mundial, com o reflexo aqui de um Jair Bolsonaro anti-PT, anti-instituições – anti-democrático na prática -, anti-sistema, anti tudo que estava aí por obra e gosto da República. Viram o PT perder, ganhar e deixar de ser o povo no poder, para ser mais, hoje, o povo petista no poder.

Este ano, o dilema é a imagem do presidente em 2026, quando Lula tentará ou não a reeleição. O maior adversário deixou de ser Bolsonaro para ser o bolsonarismo enraizado e um Centrão que está saindo do baixo clero no Congresso para ocupar os maiores partidos, aqueles com os mais vultuosos fundos partidários. Nesse imbróglio é que o PT se enrosca, Lula dança e Dirceu se levanta como voz que tenta colocar juízo nos seus e mostrar que é preciso trilhar um novo caminho. Qual? A se descobrir.

O PT precisa antes decidir se o seu maior problema é de Comunicação ou Política. Se tem um bom governo que não consegue mostrar o que faz, ou se tem uma estrutura partidária acomodada e desorientada a ponto de não conseguir vencer o PL e a máquina de notícias enviesadas e fabricadas sob medida para a mentira virar verdade e apenas o seu caos metodológico prevalecer como fato incontestável.

O PT não sabe o que faz diante de um inimigo que aprendeu a mobilizar e dominar parte importante e relevante das redes sociais e das redes das ruas – a turba, os patriotas, os (novos?) cidadãos bolsominions. O PT e Lula não conseguem controlar a pauta no Congresso; sofrem o estica e puxa dos interesses do momento, fora as bolas nas costas, como de repente ver Nikolas Ferreira tornar-se presidente da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, (in)consequência para o governo e para o Brasil.

Dirceu não tem mais poder interno na legenda como antes para ditar os rumos; então, dá entrevistas. Lula faz o que pode, e parece lutar direto à frente de militantes e voluntários, por falta de outras vozes de comando ao seu lado. Onde estão os líderes do PT e da esquerda para dividir com Lula as frentes de batalha? Onde estão os aliados, ministros e críticos para comunicar e politicar enquanto ele governa – melhor: para ele não ter de governar sozinho?

O governo Lula tem muito o que mostrar. Mas quem vai mostrar? Lula está recolocando o País nos trilhos. Mas onde estão as provas e as linhas humanas e os argumentos de defesa? Arcabouço aprovado, mais baixo desemprego desde 2014, crescimento acima das expectativas, inflação em queda. Não é um bom começo? E por que a queda nas pesquisas de avaliação? O governo Lula parece só ter Lula mostrando o bom do governo Lula. E só Lula apanha pelas falhas e inapetência de todos.

Falta o bom combate. Falta corpo a corpo nas ruas, sobram tuítes de lacração contra lacração nas redes. Falta luta: PT para o PT – cadê o PT?. Falta Zé Dirceu para o PT e para Lula. Há muita História em jogo, passada e futura. Palavras de Zé Dirceu:

“Sem alarmismo, mas com responsabilidade, devemos avaliar nossa relação com as forças políticas, lideranças e setores sociais que votaram contra Bolsonaro e em Lula, numa perspectiva de defesa da democracia e de um programa que na campanha nos reuniu e nos deu a vitória. Essa aliança e esse diálogo têm de estar presentes no governo e na sua comunicação, sob pena de perdemos esse eleitor cidadão que nos deu a vitória.”

Quer mais Dirceu? Leia: Sinal amarelo

Vassil Oliveira

Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).