21 de novembro de 2024
Publicado em

Ano político. Promessas de campanha

Foto: Banco de Imagens do Canva
Foto: Banco de Imagens do Canva

Como deve agir o candidato a um cargo político?

Estamos em início de ano eleitoral. Muita conversa de pé de ouvido. Especulações. Visitas sorrateiras. Enquetes descompromissadas. Quem serão os candidatos? Será que fulano vai candidatar de novo? Por que sicrano não entra pra política, afinal ele é boa gente e honesto!…

É o que se ouve com mais frequência nesse momento inaugural. Sabe-se que é entendimento geral, no meio político, que a escolha de candidato só deslancha após o carnaval. E o carnaval está aí.

Enquanto isso, os pretensos candidatos começam a esboçar as suas estratégias para convencimento do eleitor. É que na verdade o próprio eleitor fica ávido para ouvir o que o candidato tem a prometer. Inclusive, há vários jargões na boca do povo nesse sentido: “Candidato que não promete não ganha eleição!… Fulano vai perder, pois o cara não tem coragem de prometer nada!…”.

E nessa ânsia de ganhar a corrida eleitoral (ou eleitoreira), muitos acabam extrapolando e entrando no jogo das promessas vãs. Foi o que aconteceu no passado, há quase meio século, em uma cidade das imediações de Goiânia. Veja a história, a seguir.

Quem levou o cano: o prefeito ou o povo?

De tanto ouvir cobranças das promessas feitas na campanha, certa vez deu na cabeça do prefeito de trocar a encanação de água da cidade. Dizia que o Estado tinha prometido ajudar a bancar a reforma. E determinou a retirada dos canos velhos, para serem substituídos por outros novinhos.

Como não tinha um lugar adequado para depositar tanto cano enferrujado, juntou o útil ao agradável e mandou levar todo o entulho para o povoado de sua jurisdição, distante uns 50 quilômetros, onde havia prometido com toda ênfase a levar água encanada para aquela população. Com esse gesto, atendia-se à antiga reivindicação daquele povo sofrido.

– Mas antes de tratar a água precisa tratar os canos enferrujados, senão o povo vai adoecer! – alfinetavam os adversários.

– A ferrugem é coisa à-toa, fácil de dar jeito – defendiam os puxa sacos, que compunham a equipe encarregada do serviço. – O importante é o benefício para o lugar, não é mesmo! Afinal de contas, não era isso que o povo reivindicava?

– Se fosse só a ferrugem tava bom demais, mas tem também a sujeira lá de dentro dos canos: lodo, micróbios, restos de bicho morto, cocô de políticos da situação… – atacava sem dó a oposição.

– Pois se o povo não estiver satisfeito com a minha boa vontade eu mando levar tudo de volta – rosnava o administrador, já começando a perder a paciência.

– Então leva, que aqui não é depósito de lixo não! – fulminavam os opositores, com a reta intenção de induzi-lo a perder as estribeiras, usando a tática do quanto pior melhor.

Mas ele não teve peito para consumar a ameaça. E ficou lá aquele impasse: o prefeito não levava de volta os tais canos (não tinha onde pôr), porém não providenciava a continuidade da tão sonhada obra, que levaria à população a bendita água encanada prometida na época da campanha eleitoral. Só de birra. Aliás, a promessa de água encanada já tinha servido de trampolim para muita gente chegar ao poder.

O tempo passava, e nada de a obra começar. E o povo, que nada tinha a ver com aquela briga boba, mas era o único atingido pela lengalenga interminável dos políticos, temendo que o prefeito levasse embora os tais canos sujos – o que seria um desaforo a mais –, começou a tomá-los emprestado. Como não tinha com quem falar para pedir o empréstimo, cada pessoa que precisava de um, de dois ou até de mais canos ia, por conta própria, lá no monte e supria sua necessidade. Ninguém falava nada, mesmo por que a nenhum morador foi dada a responsabilidade da guarda da obra-prima.

Um velho que passava na rua, gemendo com duas barras desses canos nas costas, foi interpelado por alguém com espírito esportivo:

– Levando o cano do prefeito, hein?!… Ou foi o prefeito quem deu o cano?…

– Claro. Levando o cano, uai! Diz que ele vai levar tudo pra trás! Do saco a embira, né!

– E isso vai ter alguma serventia?

– Vai: vou encanar a água do chiqueiro lá de casa.

Assim foi que, quando o prefeito deu fé, o monte do disputado entulho tinha sumido do mapa. Passados muitos anos, esses benditos canos ainda eram facilmente encontrados servindo de bica d’água ou de varão de cerca, ou ainda de poleiro de galinha, em diversas propriedades tanto urbanas quanto rurais.

À época, o prefeito alegava que foi impedido pela oposição de cumprir a promessa de campanha, porém, a população, na dúvida, preferiu arranjar um jeito de ser beneficiada, mesmo que por vias tortas e que o benefício se resumisse em canos enferrujados, lamacentos e fedorentos.

Eta polititica danada!…

Elson Oliveira

Elson Gonçalves de Oliveira foi professor de Língua Portuguesa, é advogado militante e escritor, com vários livros publicados.