Três meses depois de o STF (Supremo Tribunal Federal) autorizar a abertura de inquéritos, as investigações envolvendo a delação de executivos da Odebrecht não avançam.
O caso da empreiteira chegou a ser chamado de “delação do fim do mundo” por envolver políticos de todos os partidos e tendências.
Uma análise feita pela reportagem aponta que tem sido difícil para os investigadores comprovar os relatos feitos pelos delatores à PGR (Procuradoria-Geral da República).
Há outro fator que coloca uma incógnita sobre o futuro das investigações: 24 dos 77 inquéritos abertos desde abril saíram das mãos de Edson Fachin, relator original, e foram para outros ministros. E esse número aumenta a cada dia.
Nenhuma denúncia foi apresentada até agora em relação a esses inquéritos. A delação da JBS, homologada em maio –quase quatro meses após a da Odebrecht–, já virou base para três acusações da Procuradoria, uma delas tendo como alvo o presidente Michel Temer.
Após abertos, os inquéritos da Odebrecht foram enviados para a Polícia Federal, com prazo fixado de 30 dias para cumprimento de diligências. A PF, no entanto, não conseguiu realizar todas as medidas e solicitou mais tempo em cada uma das investigações.
PROVAS
Pela leitura dos andamentos dos inquéritos, que são públicos, é possível verificar que a maior dificuldade tem sido de buscar provas sobre os pagamentos realizados.
Mais de 40 pessoas foram à PF prestar depoimento. Uma série de pesquisas foi solicitada, como a evolução patrimonial dos investigados, acesso e destino de pessoas no Congresso e prestações de contas em eleições.
Todos os políticos ouvidos negaram as acusações. Oito ministros, 39 deputados e 24 senadores foram delatados.
Aos delatores, que também foram chamados a depor novamente, a PF pediu mais detalhes dos repasses, mas em geral teve respostas vazias.
Em alguns casos, a polícia identificou contradições. O ex-diretor de Relações Institucionais Alexandrino Alencar, por exemplo, afirmou ter feito uma reunião com a deputada Maria do Rosário (PT-RS) em 2010 para tratar de doação de campanha.
Ele disse que o encontro foi no escritório da então candidata, em Porto Alegre.
Em seu depoimento, a petista afirmou que só alugou a sala mencionada em 2014, levando como prova seu contrato com a imobiliária.
RELATORIA
Fachin é, desde a morte de Teori Zavascki, em janeiro, o relator da Lava Jato na corte.
A distribuição dos casos para outros ministros ocorre porque, na visão do STF, há nessas investigações falta de conexão com o tema principal da Lava Jato, o desvio de dinheiro da Petrobras.
Com as mudanças, 10 dos 11 ministros decidirão sobre suspeitas referentes à empreiteira, o que deve gerar conflitos, com definições e interpretações diferentes para situações semelhantes, além de debates entre as duas turmas do tribunal.
“Esse é o sistema regimental e não se pode ver nisso qualquer insegurança. O inverso é que fugiria à organicidade do direito”, diz o ministro Marco Aurélio Mello.
“Isso não atrapalha o andamento. A demora se dá mais pelo tempo das investigações”, afirma Gilmar Mendes.
Ministros, investigadores e advogados afirmam que a redistribuição é importante para a celeridade dos processos, mas se dizem preocupados com a possível desigualdade nas decisões.
“É natural que os juízes tenham entendimentos diferentes. Mas o STF, que é a corte suprema, deveria se pautar por uniformizar os tribunais. E eles vão fazer justamente o contrário. Isso vai gerar tratamento desigual para os réus e já esta gerando”, afirma o advogado Leonardo Sica, doutor em direito penal.
Advogados discordam sobre a existência de critérios para a distribuição.
Para Gustavo Badaró, professor de direito da USP, “não tem havido critério seguro para determinar quando um inquérito é conexo com a Lava Jato”. “O STF deveria ser o guardião, mas a gente vê que a conveniência é o que está dando o tom”, diz.
“Acho que o Supremo está observando o critério de forma bastante técnica”, disse o advogado Luis Henrique Machado, que defende Renan Calheiros (PMDB- AL) e outros políticos.
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