27 de dezembro de 2024
Brasil • atualizado em 13/02/2020 às 10:14

Acampamento pró-Lula tem Moro como ‘belzebu’ e adaptação de funk

Moro foi alvo de protestos (Foto: Agência Brasil)
Moro foi alvo de protestos (Foto: Agência Brasil)

O funk rivalizava com a fala de João Pedro Stedile, um dos principais porta-vozes do MST, para quem “não é Lula no banco dos réus, e sim o Judiciário”.

Ali perto, um grupo se mune de voz, bateria, passinhos e bandeiras do Movimento dos Sem Terra para adaptar o hit “Oh Novinha”, do MC Don Juan. Em vez de “Oh novinha, eu quero te ver contente, não abandona o ‘piru’ da gente”, fica assim: “Oh trabalhador, eu quero te ver contente, vem defender a democracia com a gente”.

Pois cerca de 10 mil pessoas foram e ficaram para acampar no gramado do Anfiteatro Pôr do Sol, segundo a Frente Brasil Popular, que organizou as caravanas pró-Lula que viajaram até Porto Alegre para fazer uma vigília durante o julgamento do ex-presidente no Tribunal Regional Federal da 4ª Região nesta quarta (24).

Malhar “inimigos da democracia” é um dos esportes prediletos por ali. O juiz Sergio Moro: “Belzebu com gel no cabelo”. O presidente Michel Temer: “Mordomo do capeta”. O governador Geraldo Alckmin: “Rei dos coxinhas”.

A animosidade não é só contra políticos. “Grande mídia” vira palavrão, e gritos contra a Rede Globo competem em popularidade com o slogan “eleição sem Lula é fraude”. “Partido da Imprensa Golpista [PIG, que, em português, significa porco] roubou o mandato de Dilma”, diz o cartaz ilustrado pelo mesmo animal, com terno e expressão raivosa.

Com uma camisa puída onde se lê “rural sustentável”, João Maria, 69, come pedaços de galinha amontoados no pratinho de plástico enquanto caminha e diz à reportagem “amar muito o Lula”. Ao chegar à sua barraca, um amigo o adverte: nada de falar com jornalistas. João consente.

Há barracas de todos os tipos. Uma das mais arrumadinhas tem na porta uma embalagem já vazia de “chips de mandioquinha fit”.

Outra, improvisada com madeira e lonas pretas, traz dezenas de colchões colados uns aos outros, mala rosa que serve de mesa (onde repousa um boné com o lema “vida loka”) e pacotes e mais pacotes de rolos de papel higiênico.

“A gente se limpa. O que tem de gente que faz merda em Brasília e fica por isso mesmo…”, diz uma militante que pede para omitir o nome.

A hostilidade não é unânime. O ambulante Demetrius Borba, 42, que vende cervejas e drinques na barraca Treme-Treme, aproveita para “descolar uns trocados” enquanto compartilha seu “drama”.

Os anos lulistas, esses, sim, “eram bons”, diz sobre uma época que “foi comprar cigarros e ainda não voltou”. Ele tinha emprego de mecânico, mas foi demitido em 2017, “depois que Temer entrou e tudo começou a mudar, mudar, mudar”.

Se Lula é inocente mesmo, isso Demetrius não sabe dizer. “Todo mundo rouba… O pessoal da direita rouba pra caramba”, relativiza.

Ainda não é meio-dia quando a aposentada Helena da Costa, 59, pede a Demetrius uma caipirinha de limão com “pouquíssimo açúcar”. Amargo, para ela, é viver “num país cheio de golpe, que quer impedir o cara de esquerda com reais condições de lutar por um Brasil mais justo”.

Helena veio com uma turma do Sindicato dos Bancários. Gastou pelo menos R$ 1.000 para voar do Rio e se hospedar num hotel.

Enquanto tira da pochete dinheiro para pagar a bebida, endossa a declaração de Lindbergh Farias, líder do PT no Senado, de que não é “hora de uma esquerda frouxa”.

“A direita se uniu e deu o golpe. A gente não tem união, fica cada um na sua caixinha”, afirma Helena.

A poucos metros, o morador de rua Antônio dá goles numa “cachacinha” e cambalhotas, aos clamores de “viva Lula!”. “Bebe que passa”, aconselha à turma com bonés da CUT que passa perto.

(FOLHA PRESS)

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