Cerca de sete em cada dez brasileiros são contra propaganda de refrigerantes e salgadinhos feita para crianças. Proporção semelhante é contra a venda de parte desses produtos nas escolas.
Os dados são de pesquisa Datafolha encomendada pela ACT, organização que atua na área de controle do tabagismo e promoção da saúde. O levantamento, feito em agosto deste ano, ouviu 2.573 pessoas em 160 municípios sobre iniciativas de regulação da indústria de alimentos.
Entre os entrevistados, 72% afirmam ser contra, totalmente ou em parte, a propaganda de refrigerantes para crianças. Outros 67% disseram ser contra a propaganda de salgadinhos e 64%, de sucos industrializados.
Já 60% afirmaram ser contrários a ‘qualquer tipo’ de propaganda para crianças, público considerado mais vulnerável à influência dessas informações para o consumo.
Desde 2014, uma resolução do Conanda (Conselho Nacional de Direitos da Criança e Adolescente) classifica como abusiva a publicidade dirigida a crianças e adolescentes a regra, no entanto, é contestada por empresas do setor, para quem é preciso ter lei específica sobre o tema.
Para Isabella Henriques, do Instituto Alana, que mantém o projeto Criança e Consumo há dez anos, os resultados da pesquisa são positivos. ‘Isso reforça nossa percepção de que a publicidade infantil deixou há algum tempo de ser tolerada por toda a sociedade.’
Ela avalia que, apesar de avanços, ainda há excesso de propagandas dirigidas às crianças. ‘Se ligar em qualquer canal segmentado infantil, são abarrotados de publicidade. Há canais mirins do YouTube cheios de propaganda. É como se a criança não tivesse espaço livre’.
Nas cantinas
Além da propaganda, a pesquisa questionou a opinião sobre outras formas de exposição dos alimentos industrializados às crianças. Ao todo, 64% afirmaram ser total ou parcialmente contrários à venda de refrigerantes nas cantinas de escolas do ensino fundamental percentual que cresce entre quem tem filhos e diminui entre mais jovens.
Outros 28% são total ou parcialmente favoráveis e 8% nem contra nem a favor. O levantamento ocorre em meio ao debate, estimulado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e Ministério da Saúde, sobre medidas para reduzir a obesidade. Projetos que limitam a venda de refrigerantes nas cantinas ou proíbem a publicidade também tramitam no Congresso.
‘Quando falamos de criança ou adolescente, o ambiente escolar é determinante’, diz Paula Johns, da ACT. ‘Se promove produtos não saudáveis, isso fará diferença.’
Avaliação semelhante tem Ana Paula Bortoletto, nutricionista do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor). ‘O consumo excessivo de alimentos ultraprocessados está crescendo no Brasil, associado ao aumento da obesidade e doenças crônicas. É bom perceber que a sociedade está mais alerta.’
A pesquisa mostra ainda que 60% são contrários à utilização de personagens infantis nas embalagens dos alimentos. Já 30% afirmaram ser favoráveis, e 10% nem um nem outro.
Outro lado
Questionadas sobre como avaliam a publicidade dirigida a crianças, associações de indústrias de alimentos e bebidas dizem ser contrários à proibição, mas a favor de estratégias de autorregulamentação do setor e educação dos consumidores.
‘A educação, e não a proibição da publicidade, é a forma mais eficiente de instruir a criança para o consumo e criar indivíduos que possam desenvolver o pensamento crítico e o poder de escolha na vida adulta’, avalia a Abia (associação das indústrias de alimentação), em nota.
A favor da autorregulamentação, o presidente da Abir (Associação das indústrias de refrigerantes e bebidas não alcoólicas), Alexandre Jobim, diz que, desde abril, o grupo orienta empresas a suspenderem a publicidade em programas e mídias com mais de 35% do público formado por crianças.
Segundo Jobim, a associação estuda agora recomendar que seja suspensa a venda de refrigerantes para cantinas de escolas. “É uma discussão que no futuro vai ocorrer e estamos nos adiantando.”
Ele reconhece, porém, que não há consenso entre as empresas sobre a medida. ‘Empresas maiores têm variedade de portfólio [com bebidas açucaradas ou não açucaradas], mas as pequenas teriam maior dificuldade’, afirma.
Folhapress
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