Quase metade do endividamento das empresas brasileiras está concentrada em 57 companhias, e uma análise dos balanços mostra que a exposição delas ao dólar avançou em três anos.
Cerca de 40% da dívida desse grupo segue a variação da moeda americana. O índice era de 28% em 2014, quando estourou a Lava Jato. A busca por dinheiro no exterior foi uma reação à retração na oferta do crédito local, em particular após a operação.
Bancos brasileiros tinham volumes elevados de financiamentos em empresas pegas pela Polícia Federal -como Petrobras e Odebrecht. Para se protegerem, reduziram o crédito não apenas para as investigadas mas até para negócios vistos como idôneos.
A recessão piorou o ambiente. Temendo que as empresas não tivessem musculatura para resistir a crise, os bancos se fecharam ainda mais.
A saída para grandes empresas foi buscar dinheiro lá fora. No grupo estão companhias como a mineradora Vale; a Fibria, do setor de papel e celulose; e a Cosan, gigante global em açúcar e etanol.
Dados do Banco Central mostram que a dívida total das empresas atingiu R$ 2,7 trilhões até setembro deste ano e, segundo levantamento da Fitch Ratings, as 57 maiores empresas brasileiras monitoradas pela agência americana de risco devem, no Brasil e no exterior, R$ 1,29 trilhão -quase metade disso, R$ 548 bilhões é da Petrobras.
Antes da Lava Jato, a dívida total era de R$ 962 bilhões.
Risco
Para Ricardo Carvalho, diretor sênior de finanças corporativas da Fitch, ao menor sinal de inversão na rota de retomada da economia, o endividamento dessas empresas pode virar um problema.
“A Petrobras, por exemplo, voltaria para aquela dívida dos níveis agudos da crise”, afirmou Carvalho.
Segundo a empresa de análise financeira Economatica, com base no balanço da petroleira, 79% da dívida de R$ 335 bilhões da estatal está em dólar. Para a Fitch, o endividamento da petroleira é de R$ 548 bilhões, porque inclui outros compromissos financeiros não bancários.
Outras agências de risco também seguem esse critério, incluindo, por exemplo, o pagamento de aluguel por sondas de petróleo.
Segundo a mesma Economatica, a exposição da JBS, uma das maiores produtoras de alimentos do mundo, também é grande: da dívida de R$ 47,8 bilhões, R$ 26,7 bilhões são em moeda estrangeira -pelos cálculos da Fitch, é de R$ 65,5 bilhões.
Na Eldorado, empresa de celulose recentemente vendida pelos donos da JBS, o câmbio interfere em 76% da dívida, que, segundo a consultoria, é de R$ 8 bilhões.
No cenário político incerto das eleições do próximo ano, analistas de agências de risco e dos principais bancos de investimento consultados pela Folha consideram que há risco de exposição cambial caso, por exemplo, a reforma da Previdência não seja aprovada. Para eles, o efeito sobre as empresas seria imediato.
Desde a Lava Jato, com a promessa de reformas do governo Temer, o dólar valorizou-se ante o real, passando de R$ 2,20 para R$ 3,30. Ainda sem um candidato que defenda a política de reformas e o ajuste fiscal -hoje sob o comando do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles-, os bancos continuam cautelosos.
Essas instituições sabem que, ao menor sinal de que a reforma da Previdência não será aprovada pelo Congresso ou por outro solavanco político, os juros futuros começarão a trajetória de alta que marcaria a depreciação dos demais indicadores da economia. Nesse cenário, a expectativa dos bancos para o dólar é de R$ 3,50 apenas num primeiro momento. (Folhapress)
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