Uma reação do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), o primeiro integrante assumidamente homossexual do Senado, a um ataque homofóbico que sofrera no Twitter do empresário bolsonarista Otávio Fakhoury, transformou nesta quinta-feira, 30, o que seria uma sessão corriqueira da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, em um emocionado desabafo contra o preconceito. Ao ocupar a cadeira de presidente do colegiado durante o depoimento de Fakhoury, o parlamentar denunciou o ocorrido, exigiu um pedido de desculpas e pediu investigação do caso.
“Eu aprendi, senhor Otávio, que a orientação sexual não define o caráter, que a cor da pele não define o caráter, que o poder aquisitivo não define o caráter”, disse o senador. “A sua família não é melhor do que a minha.”
No dia 12 de maio deste ano, Contarato, ao publicar uma mensagem no Twitter na qual defendia a prisão do ex-secretário de Comunicação do governo Jair Bolsonaro Fabio Wajngarten, que também prestou depoimento no colegiado, o senador errou a grafia da palavra “flagrancial” e escreveu “estado fragrancial configurado”.
Fakhoury então republicou a mensagem de Contarato no Twitter com ofensas ao parlamentar por causa da orientação sexual do senador “O delegado, homossexual assumido, talvez estivesse pensando no perfume de alguma pessoa ali daquele plenário… Quem seria o ‘perfumado’ que lhe cativou?”, afirmou o empresário. Até o fim da tarde de ontem, a publicação continuava no ar.
Eleito em 2018, Contarato foi o mais votado no Espírito Santo, com 1.117.036 votos. “Essa dor é incomensurável, não tem dinheiro que pague isso. Eu estou expondo mais uma vez minha família, meus filhos, meu esposo para que outros não passem pelo que eu passei”, disse o parlamentar.
A intervenção fez o empresário pedir desculpas ao senador. “Realmente, o meu comentário foi infeliz, foi um comentário em tom de brincadeira. Eu acho que é uma brincadeira de mau gosto”, afirmou Fakhoury. O empresário disse ainda que havia se esquecido da publicação nas redes sociais até ser exposto na CPI “O senhor não deve pedir perdão só a mim”, rebateu Contarato. O empresário então se desculpou com “todos que se sentiram ofendidos com esses comentários”.
A exposição das ofensas do empresário a Contarato provocou reação no Senado. O senador da Rede recebeu apoio de diversos parlamentares, incluindo aliados do presidente Jair Bolsonaro. No Congresso, Contarato faz oposição ao governo. “Lamentável. E digo para o senhor que está aí à frente, que disse que tinha orgulho de ser brasileiro, eu falo que eu tenho vergonha de ter você como brasileiro depois disso daí”, disse o senador Marcos do Val (Podemos-ES) a Fakhoury durante a sessão da comissão.
A CPI da Covid acionou a polícia do Senado e o Ministério Público Federal para apurar a ocorrência de crime de homofobia por parte do empresário, que foi convocado à comissão após ser acusado de financiar a disseminação de fake news na internet. Ele já é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal. O colegiado também vai encaminhar o caso ao ministro do STF Alexandre de Moraes, que conduz a investigação sobre o financiamento de fake news.
Desde junho de 2019, por decisão do Supremo, o crime de homofobia é equiparado ao de racismo e pode ser punido com um a cinco anos de prisão. “Em 2018, o Brasil não tinha um senador gay e a homofobia não era crime. Isso mostra um novo tempo e é possível ver uma evolução em um episódio tão ruim como esse”, afirmou o coordenador da Associação Brasília Orgulho, Welton Trindade.
No ano passado, Contarato acionou o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) após um promotor de Justiça dar parecer contrário ao reconhecimento de dupla paternidade dele e do marido, Rodrigo Grobério, para adoção de uma criança. Eleito para uma cadeira no Legislativo, o parlamentar passou a defender pautas da comunidade LGBTQIA+.
Em julho deste ano, durante o mês do “Orgulho”, dedicado a causas da comunidade LGBTQIA+, o senador da Rede apresentou três projetos de lei para ampliar os direitos desse grupo no Brasil. Entre as propostas, estão a punição para condutas homofóbicas em estádios, a proibição de discriminação, com base na orientação sexual, de doadores de sangue e o agravante de pena para condutas violentas no Código Penal Militar.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. Por Daniel Weterman e Julia Affonso; colaboraram Davi Medeiros, Vinicius Alves e Daniel Tozzi – Estadão Conteúdo
Leia também: