Elaborado por juristas e economistas, o plano de governo que seria encampado pelo ex-juiz Sérgio Moro (União Brasil) pode acabar nas mãos de outro candidato ao Planalto. Integrantes do grupo que elaborou propostas admitem contribuir com outras campanhas e afirmam que o projeto, em vias de ser divulgado, pode ser aproveitado por outro político, caso Moro não consiga voltar à disputa pela Presidência.
O documento está quase pronto, segundo seus colaboradores. Entre os principais tópicos, estão políticas voltadas ao desenvolvimento econômico e social e um pacote de iniciativas anticorrupção, além de sugestões para uma reforma do Judiciário. Os grupos de trabalho são liderados pelo ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore e pelo jurista e professor Joaquim Falcão.
“O projeto estará disponível para candidatos fora dos extremos. Ou seja, para os da terceira via”, afirmou Pastore ao Estadão. Falcão disse que continua à disposição de Moro, e também “de todos que entendam a necessidade de um processo eleitoral plural e democrático”.
O criminalista Marcelo Knopfelmacher, que contribuiu para o pacote anticorrupção do programa de governo, afirmou que avalia ajudar na “redação do programa” do pré-candidato João Doria (PSDB). “Mas também há conversas para colaborar com o ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos) no programa de governo para o Estado de São Paulo”, afirmou.
DINHEIRO
O clima entre os juristas e o pré-candidato esquentou após o Estadão revelar, anteontem, que o coordenador da pré-campanha, Luis Felipe Cunha, amigo do ex-juiz, recebeu R$ 60 mil da fundação Podemos sob a justificativa de ter participado de discussões sobre plano de governo. Os valores foram pagos a uma empresa de consultoria do advogado, a Bella Ciao.
Nenhum dos juristas que ajudaram a elaborar o programa de governo foi pago. Todos dizem ter feito o trabalho “pró-bono”. A insatisfação se agrava na medida em que Cunha nem sequer participou dos grupos de discussão, relataram os integrantes ao Estadão. Entre os que cobraram explicações estão Knopfelmacher e o diretor da ONG Contas Abertas Gil Castello Branco.
Cunha chegou à campanha em meados de janeiro, e partiu dele a escolha do marqueteiro Pablo Nobel, e aproximação com o publicitário Paulo Vasconcelos. O advogado também promoveu encontros de Moro com empresários e brigou por R$ 70 milhões para a campanha – o Podemos se dispôs a bancar R$ 40 milhões. Cunha também auxiliou Moro a trocar o Podemos pelo União Brasil, em uma negociação que deixou ressentimentos no antigo partido e envolveu a suspensão da candidatura ao Planalto na atual legenda
Ao Estadão, o advogado afirmou que a Bella Ciao foi contratada “formalmente pela Fundação Podemos para elaborar um projeto de melhorias para o País, visando subsidiar uma possível candidatura presidencial”. “O trabalho vinha sendo desenvolvido regularmente com a previsão de pagamentos mensais. Entretanto, somente as duas primeiras parcelas referentes à prestação do serviço foram efetivamente quitadas”, afirmou. Cunha disse ainda que a legenda ficou inadimplente com a equipe de marketing da pré-campanha.
PROPOSTAS
Os juristas propuseram mudanças para enxugar o sistema processual brasileiro e, assim, economizar recursos públicos. A verba excedente, segundo a proposta, poderia ser revertida em políticas sociais. Entre as propostas, a ampliação da Justiça itinerante nas periferias.
Doutor em direito econômico, o advogado Luciano Timm propôs iniciativas para enxugar a máquina processual. Uma das ideias é criar uma espécie de arbitragem para costurar acordos em processos de cobrança da União contra devedores. Segundo ele, os processos se encerrariam mais cedo, o que poderia acelerar a arrecadação, já que estas ações duram anos no Judiciário.
Liberal na economia, o plano de governo também prevê que o Estado deixe grande parte dos investimentos em infraestrutura nas mãos do capital privado. Ao Estado, caberia o foco maior em investimentos na área social.
Também previa a volta de itens do pacote anticrime que foi bancado por Moro no Ministério da Justiça e desidratado no Congresso, como a prisão após condenação em segunda instância e o chamado “plea bargain” – acordo para confissão de crimes em troca da redução de pena – entram no pacote.
Por Luiz Vassallo e Gustavo Queiroz, Estadão Conteúdo