O homem que matou três pessoas em um ataque a bomba na Maratona de Boston em 2013 tinha 19 anos. Em 2017, atentados na Catalunha, foram executados por jihadistas que tinham entre 17 e 24 anos. No mesmo ano, uma alemã de 16 anos foi presa por ter se unido ao Estado Islâmico ao se apaixonar por um combatente pela internet.
Se os jovens são os mais visados por recrutadores de grupos extremistas, é para eles que devem ser dirigidas as mensagens antirradicalização – e esse trabalho tem que ser feito nas redes sociais, onde boa parte das mensagens de ódio são propagadas.
Foi essa ideia que deu origem ao Words Heal the World (palavras curam o mundo), projeto criado por uma brasileira que produz conteúdo na internet de combate à intolerância e ao extremismo.
A jornalista Beatriz Buarque, 32, envolveu-se com a temática quando fez um curso em Israel sobre conflitos no Oriente Médio, em 2015.
“Naquela época, os jihadistas estavam recrutando muita gente. Fiquei tocada quando vi que produziam um conteúdo altamente profissional na internet. Voltei pensando que queria intervir de alguma maneira”, afirma.
Dois anos depois, ela foi para Londres fazer mestrado na área. Antes de se mudar, porém, já tinha dado início ao projeto, que começou com um site e passou a atuar também em outras frentes, produzindo campanhas para redes sociais, documentários, palestras e eventos.
“Existem várias organizações que estão usando a palavra para prevenir o extremismo, mas a maioria não tem equipe de mídia social por falta de recursos. Elas são praticamente invisíveis na internet”, afirma Beatriz. “Buscamos dar visibilidade a essas iniciativas.”
Atualmente, o projeto tem parceria com 22 entidades – três são brasileiras. A Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras) também é parceira.
O conteúdo é produzido por estudantes de comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e da Universidade de Westminster, no Reino Unido.
“Achei importante colocar os jovens como principais atores do processo. Isso preenche uma lacuna muito usada por grupos radicais, que oferecem um senso de pertencimento, puxam aqueles que não se sentem incluídos na comunidade dizendo que entrarão para uma causa maior”, diz ela.
Um vídeo com uma canadense que perdeu o filho para um grupo jihadista, uma entrevista com um ex-combatente que teve contato com grupos radicais no Afeganistão e uma transmissão ao vivo de um somali desconstruindo mitos sobre o Islã são exemplos de posts já feitos.
O foco inicial no radicalismo islâmico foi ampliado para incluir também o combate ao racismo, à homofobia, ao antissemitismo e à intolerância religiosa. Um documentário sobre ataques sofridos por religiões afro-brasileiras, por exemplo, vai ser produzido no Rio.
Segundo Beatriz, apesar do Estado Islâmico ter perdido força nos últimos anos, o grupo segue sendo motivo de preocupação: “Eles perderam território, mas continuam muito ativos na internet.”
Um dos problemas é com relação a crianças que foram criadas na região controlada pelo grupo. “Elas tiveram contato com a violência muito cedo, não sabem o que é empatia. Isso é um grande perigo, e há quem diga que a próxima onda de jihadistas vai ser ainda pior do que a atual”, diz ela.
Outro desafio atual é como lidar com os “returnees”, radicalizados que estão voltando aos seus países de origem – muitos deles, ocidentais.
No Brasil, além da intolerância com religiões afro, outras manifestações extremistas que preocupam atualmente são o racismo, a xenofobia contra refugiados venezuelanos e o surgimento de grupos neonazistas na região Sul, diz Beatriz.
A brasileira agora planeja transformar o projeto em uma organização social.
Ela também tem ampliado a atuação fora da internet, promovendo seminários em escolas e eventos como o Diálogos pela Paz, que reunirá líderes de diferentes religiões no Rio em setembro.