Os programas de conformidade com leis e regulamentos, chamados no mundo corporativo de “compliance”, de pouco servem se as empresas não tiverem uma boa governança -prática essa que passa, principalmente, pela alta direção das corporações.
Essa foi uma das conclusões às quais chegaram os membros da primeira mesa do Fórum Conformidade nos Negócios, promovido pela Folha de S.Paulo, que acontece nesta segunda (10) e terça (11), no MIS (Museu da Imagem e do Som).
“Esses programas não devem ser vistos como uma panaceia”, afirma Alexandre di Miceli, sócio-fundador da Direzione Consultoria e Educação Executiva. Para o especialista, uma das limitações para as iniciativas de “compliance” é a de que o processo tem como foco coibir corrupção realizada à custa da empresa, e não aquela feita em favor da corporação.
Di Miceli não vê os escândalos que vieram à tona nos últimos tempos como resultado de “maçãs podres” dentro das empresas. Acredita que, por causa de uma mentalidade corporativa criada pelas lideranças, com pressão extrema para resultados e na qual se fecha negócios a qualquer custo, pessoas comuns e com bons valores acabam sofrendo de uma cegueira ética nos negócios.
“Isso é resultado de pressões, de um sistema de incentivos baseado em indicadores financeiros, de um ambiente darwinista de luta pela sobrevivência na empresa. “Não há empresas éticas com dirigentes cujo único valor é o dinheiro”, afirma.
Bruno Maeda, advogado especialista em compliance e investigações, concorda. “O discurso é fácil. Construir um programa de ‘compliance’ não é difícil. Difícil é com uma decisão ética perder um contrato, deixar de gerar faturamento para a empresa, de gerar o seu bônus pessoal”, diz.
Diretor da área de “compliance” da Siemens, Reynaldo Goto concorda com seus colegas sobre a prevalência das boas práticas de governança sobre os programas de conformidade, mas chama a atenção para os estereótipos.
“É possível fazer negócios limpos no Brasil. Infelizmente, presume-se que se você cresceu e fez lucro, fez algo equivocado”, afirma, chamando atenção para o princípio da presunção da inocência.
O profissional afirma que sua empresa, a Siemens -que teve de pagar uma multa R$ 1,6 bilhão após um caso de pagamento de propinas em diversos países vir à tona em 2006- “mudou muito e conseguiu se transformar bastante”, após o escândalo.
“A empresa errou. Nossa alta direção errou. Não tínhamos sistema de governança robusto o suficiente para prevenir o que deveria ter sido feito”, conta. “O melhor sistema de conformidade vai falhar se a alta direção não estiver comprometida com ele”, completa.
Respondendo a uma pergunta da plateia, Maeda afirmou que programas de conformidade também seriam válidos em empresas do Estado e economia mista, mas apontou um obstáculo. “Há uma dificuldade específica, os altos números de nomeação política”, avaliou.
Di Miceli afirmou que vê com reticência a reação das estatais aos recentes escândalos. “A maneira como têm reagido é um pouco preocupante, porque têm se tornado mais enrijecidas, mais hierárquicas e mais centralizadas. Isso é um prato cheio para problemas”, afirma. (Folhapress)