Um desafio para a ampliação da área de imunização contra a febre amarela no país é a disponibilidade de vacinas.
Atualmente, há apenas quatro fabricantes credenciados no mundo. O maior deles é o laboratório brasileiro de Bio-Manguinhos, vinculado à Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
Segundo informação divulgada no início do ano, ele é capaz de produzir até 9 milhões de doses por mês -procurado desde a última quarta (25), não informou se houve ampliação da capacidade.
Apenas três cidades cuja inclusão está em estudo somam 22 milhões de habitantes -São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro. Considerando-se os demais municípios e as epidemias em outros países que importam o produto, é uma conta difícil de fechar.
“É preciso estudar se vale a pena [ampliar a vacinação a São Paulo e Rio], porque, nesse caso, vai pega uma área urbana muito ampla e povoada, que demandará uma quantidade de vacina que provavelmente nem existe”, afirma o epidemiologista Pedro Tauil, da UnB (Universidade de Brasília).
Um dos mais renomados especialistas em febre amarela do país, ele avalia o risco de surto em São Paulo não é elevado, uma vez que não há, ao menos, por ora, registro de casos humanos na região metropolitana. O epidemiologista
Massad lembra ainda que não se sabe qual é atualmente o potencial do mosquito Aedes aegypti de transmitir a febre.
A preocupação com o estoque de vacinas, de qualquer forma, também está na lista da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde).
Em comunicado na última sexta-feira (27), a entidade faz recomendações “considerando-se as limitações na disponibilidade de vacinas”. A primeira sugestão é que países que não estão enfrentando surto não conduzam campanhas de imunização e que seja adiada a a vacinação em crianças de áreas não endêmicas.
Uma das apostas para ampliar a produção é a construção de uma nova unidade de Bio-Manguinhos na zona oeste do Rio.
Outra possibilidade preconizada pela Organização Mundial de Saúde em caso de emergência é o fracionamento da vacina, de modo a atender mais gente -nesse caso, a imunização teria um prazo de validade menor, de um ano, por exemplo. Essa solução foi adotada recentemente com sucesso para conter um surto em Angola.
Diante da expansão dos casos de febre amarela neste ano, o Ministério da Saúde estuda ampliar a área de recomendação de vacina. Um dos cenários sob análise inclui todas as cidades de São Paulo, Rio e Bahia, incluindo as capitais, hoje fora do mapa.
Essa perspectiva consta de apresentação feita no início do mês pela Secretaria de Vigilância em Saúde para um seminário na Fiocruz. Sob título “plano 2017/2018”, a projeção inclui quase todo o país na área com recomendação de vacinação. Fora do perímetro, ficariam áreas com recomendação de vacinação apenas para menores de 5 anos.
Procurado, o ministério afirma que as possibilidades de ampliação do mapa da vacina estão ainda sob análise e que uma decisão será tomada ainda neste ano. Em setembro, a pasta já havia anunciado uma mudança, incluindo na vacinação crianças de nove meses de todo o país.
Por ora, permanece a área de recomendação em vigor. No caso da capital paulista, devem se vacinar só os que viajarão a locais afetados e os que vivem ou trabalham em um raio de 500 metros do Horto Florestal. Fora desse grupo, a imunização por ora é desaconselhada, até porque há risco de efeitos colaterais.
O mapa de recomendação da vacina contra o vírus vem sendo gradualmente ampliado nos últimos 15 anos, à medida que o vírus, antes concentrado na região amazônica, avança em direção à costa do país.
Os casos deste ano, principalmente no Sudeste, levantaram preocupação adicional, uma vez que se aproximaram das duas maiores cidades do país, que têm grande parte da população não imunizada. “Não temos mais argumento para não vacinar o país inteiro”, disse na semana passada o presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Maurício Nogueira.
A questão não é consenso. “A vacina da febre amarela não é inocente, pode ter reações adversas. Não se pode vacinar um número acima do necessário em cada momento”, diz o epidemiologista Eduardo Massad, professor da Faculdade de Medicina da USP.
Coordenador do Comitê de Arboviroses da Sociedade Brasileira de Infectologia, Antônio Bandeira avalia que, no atual momento, o importante é de fato concentrar a vacinação nas áreas próximas à morte do macaco para impedir que o vírus deixe as matas.
Resolvido o problema, ele é favorável à inclusão do Rio e de São Paulo na imunização de rotina aos poucos, até porque não há disponibilidade imediata de vacina para toda a população das grandes metrópoles.
“O ideal é que, quando não estivermos em uma situação crítica, possamos fazer a lição de casa para chegarmos mais preparados a uma nova situação mais delicada”, diz. (Folhapress)