Em carta publicada na última quarta-feira (26/06), o presidente nacional do PSB deu a entender que quer Jorge Kajuru (PSB) longe do partido que preside. Ele criticou a postura independente do senador e também a forma como Kajuru toma algumas decisões por meio de enquetes em redes sociais. Isso se deu porque o senador manifestou seu apoio ao decreto presidencial que flexibiliza o porte e a posse de armas de fogo no país. “Seria mais adequado dar prosseguimento ao mandato sem manter vínculo de filiação com o PSB”, escreveu.

Contrário à proposta do governo, no dia 11 de abril, o PSB ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6.119) para suspender os efeitos do decreto presidencial.

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Na carta, Siqueira rememora um vídeo que circula nas redes sociais e mostra Kajuru dizendo que tem “amor e carinho pelo Carlos Siqueira, porque ele me deu independência”. O presidente do PSB reage de modo surpreso e dá a entender que não deu essa independência para decisões sem consulta prévia ao partido: “V.Exa. é sabedor de que jamais mantivemos conversa dessa natureza, razão pela qual fiquei extremamente surpreso com a afirmação em questão”, explicou emendado: “independência aludida não poderia ser outorgada a quem e por quem quer que fosse, visto que, nas instituições partidárias devemos ser todos, indistintamente, servidores de um ideário comum, de convicções político-ideológicas definidas programaticamente, de bandeiras e causas que devem estar no fundamento dos mandatos que recebemos por parte da população, ao exercer o direito do voto”.

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Siqueira também manifesta seu incomodo com a forma que Kajuru toma decisões, levando em conta enquetes em redes sociais. Apesar de ressaltar que em qualquer mandato deve-se levar em conta a “democracia representativa”, o presidente pediu pra que o senador tivesse cuidado em ir adiante com votações pela internet. “Deve-se considerar, contudo, que tais consultas devem ser feitas observando todos os cuidados, para que elas não se processem sem que as pessoas tenham informações adequadas para formar seu juízo sobre os temas consultados; sem uma metodologia apropriada, que evite vieses e ofereça a possibilidade do contraditório.”, explicou.

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O senador rememorou também que nas redes sociais existem muitas bolhas idológicas que podem contaminar o resultado. “É preciso tomar cuidado com a representatividade do universo consultado, com as bolhas próprias a este recurso de comunicação e, em função delas, com as maiorias eventuais, que se formam muitas vezes mais pelos afetos do momento, do que por força de um pensar que deve ser proporcional a às consequências do que se está decidindo”, ressaltou.

Siqueira concluiu lembrando que existem partidos que aceitam candidaturas avulsas, mas não era o caso do PSB. Após considerar os tópicos que incomodavam Siqueira, ele questiona se não é mais adequado Kajuru continuar seu mandato em algum outro partido: “Seria mais adequado dar prosseguimento ao mandato sem manter vínculo de filiação com o PSB ou, eventualmente, se filiando a instituição partidária que possa lhe propiciar total liberdade, para se comprometer com as agendas políticas que lhe pareçam as mais adequadas a suas perspectivas”, questionou.

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Confira a carta na íntegra:

Senhor Senador,

Tomei conhecimento pelas redes sociais e por alguns veículos de imprensa de manifestações de V.Exa. em apoio ao decreto presidencial de porte e posse de armas, documentadas em vídeo no qual interage com o Exmo. senhor presidente da República.

Entre outros assuntos tratados no vídeo em questão, V. Exa. afirma que “o partido me respeita. Eu tenho o maior amor e carinho pelo Carlos Siqueira, porque ele me deu independência”. V.Exa. é sabedor de que jamais mantivemos conversa dessa natureza, razão pela qual fiquei extremamente surpreso com a afirmação em questão.

Note, além disso, que a independência aludida não poderia ser outorgada a quem e por quem quer que fosse, visto que, nas instituições partidárias devemos ser todos, indistintamente, servidores de um ideário comum, de convicções político-ideológicas definidas programaticamente, de bandeiras e causas que devem estar no fundamento dos mandatos que recebemos por parte da população, ao exercer o direito do voto.

Ainda que haja instituições que não agem desse modo, no Partido Socialista Brasileiro – PSB, a prática da fidelidade a seus princípios programáticos é uma tradição, faz parte de nossa cultura, razão pela qual tem havido zelo extremo com a observância de nosso ideário ao longo de nossa história.

Na matéria específica, gostaria de recordar que o PSB carrega entre seus símbolos a pomba da paz, de Pablo Picasso, porque é uma instituição pacifista desde seu nascedouro, e que, consequentemente, descrê por completo que armar a população civil possa produzir qualquer tipo de solução, mesmo para os fins de segurança.

A máxima weberiana do monopólio da violência por parte do Estado é evidentemente conexa do conceito de democracia, razão pela qual não se pode falar de posse e porte de armas sem considerar que ela põe em risco um patrimônio político que vem sendo construído desde 1985, e que é muito caro à maioria dos os brasileiros.

Não bastassem essas questões políticas de ordem mais geral, V.Exa., com toda certeza, tem conhecimento de que o PSB ingressou com arguição de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao Decreto Presidencial 9.685/2019, que flexibiliza a posse de armas de fogo no país — pleito consubstanciado na ADI 6.119.

Atentos ao desenvolvimento do mandato de V.Exa, sabemos também da prática das consultas à população por meio das redes sociais. Acreditamos, também nós, que a participação ativa da população é fundamental à qualidade da democracia representativa. Deve-se considerar, contudo, que tais consultas devem ser feitas observando todos os cuidados, para que elas não se processem sem que as pessoas tenham informações adequadas para formar seu juízo sobre os temas consultados; sem uma metodologia apropriada, que evite vieses e ofereça a possibilidade do contraditório.

Como sabem todos que têm conhecimento da dinâmica de formação de opinião nas redes sociais, é preciso tomar cuidado com a representatividade do universo consultado, com as bolhas próprias a este recurso de comunicação e, em função delas, com as maiorias eventuais, que se formam muitas vezes mais pelos afetos do momento, do que por força de um pensar que deve ser proporcional a às consequências do que se está decidindo.

Feitas essas considerações, deve merecer atenção de V.Exa. se não seria mais adequado dar prosseguimento ao mandato sem manter vínculo de filiação com o PSB ou, eventualmente, se filiando a instituição partidária que possa lhe propiciar total liberdade, para se comprometer com as agendas políticas que lhe pareçam as mais adequadas a suas perspectivas.

Observo que essas sugestões se fazem considerando que, particularmente, não tenho óbice algum às candidaturas avulsas, que consideramos um desenvolvimento importante nas democracias representativa.

Com a mesma tranquilidade e firmeza, afirmamos, por outro lado, que nossos parlamentares sempre tiveram ampla liberdade para exercer seus mandatos, mas a autonomia com que o fazem sempre observou nosso ideário, que indica a fronteira do razoável, para um partido que nunca aceitou e não aceita ser uma associação de indivíduos, que não compartilham uma visão de mundo em comum.

Na expectativa de termos deixado claro que a relação entre mandato e partido político almejada por V.Exa. não pode ser acolhida no PSB, fato que requer o devido equacionamento, despeço-me.

Cordiais Saudações Socialistas,

CARLOS SIQUEIRA
Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro-PSB

 

 

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