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Categorias: Especial
| Em 6 anos atrás

Presidente da Ubes não quer “velório da educação” no Brasil

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“Se queremos construir um país democrático, um país gigante é necessário investir na base, em educação e na universidade pública. Não deixaremos que ataquem a universidade e a escola pública”. A fala contundente foi direcionada a uma multidão de estudantes em Brasília, na última quarta-feira (15/05) pela manhã em Brasília. Um dia “histórico” aonde estudantes e servidores da educação gritaram que não aceitariam nenhum tipo de corte ou contingenciamento na educação. Apesar da pouca idade e seus 17 anos, Pedro Gorki tem uma fala firme e articulação de dar inveja a muitos políticos experientes na Câmara e Senado Federal. Desde 2017 preside a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES), um dos maiores movimentos estudantis organizados no Brasil. Em seu discurso, lembrou as palavras de Anísio Teixeira, considerado mentor da escola pública em solo brasileiro: “Só existirá democracia no Brasil, no dia em que se montar no país a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a escola pública.” Ovacionado por quem presenciava o momento, Pedro voltou os olhos e a fala ao governo Bolsonaro. “Eles justificam o corte de 30% que é balbúrdia, mas eu quero dizer que balbúrdia é tirar dinheiro da escola pública, é tirar dinheiro da universidade”.

Em conjunto com a União Nacional dos Estantes (UNE) e a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) além do apoio das reitorias das universidades, a Ubes afirma que aproximadamente 3 milhões de manifestantes participaram dos atos no dia 15 de maio e foram as ruas. “Foi um dia histórico. Além da giganteza dos atos, grande participação estudantil. Mais de 30% dos manifestantes eram estudantes secundaristas universitários. Várias redes estudantis: municipal, estadual e federal. Além de ter sido bem bonito, mostra a amplitude que é a pauta educacional”, ressaltou Pedro em entrevista ao Diário de Goiás. “Eu acho que esses atos conseguiram mostrar essa luta. Foram atos gigantes. A amplitude da pauta da educação não envolve só quem pensa pela esquerda, mas envolve toda a sociedade brasileira”, reforçou já adiantando um próximo ato tão grandioso quanto foi a introdução no dia 15 de maio. “Será no dia 30 de maio (quinta-feira)”, diz Pedro fazendo a promessa: “Não vamos sair das ruas até conseguirmos reverter esse corte. Vamos nos mobilizar até que o governo volte atrás. Até porque, não será a primeira vez que o governo voltaria atrás em algo”.

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“São atos maiores que partidos políticos”

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Se é uma pauta que envolve toda a sociedade brasileira, como Pedro enxerga a presença de bandeiras de partidos alinhados à esquerda nos atos? Pedro insinua que a má informação é um problema. Em uma parte da conversa, reclama que as fake news foram institucionalizadas no Brasil e faz uma recomendação para aqueles que pensam que a presença de partidos de esquerda deslegitimam as manifestações: “Recomendo que as pessoas que fazem essas críticas revejam vídeos do dia 15 de maio, ou possam ir a manifestação do dia 30 de maio. Fazia tempo que as ruas do Brasil não estavam tão coloridas, tão diversas. A amplitude dessa pauta educacional não adere apenas à esquerda. A gente tinha amplos movimentos, de diversos setores. Dentro do ato, tinham pessoas a favor da reforma da previdência, que podem ter votado no governo atual – que está colocando esses cortes, mas na verdade é um ato plural”. Pluralidade que leva diversas bandeiras ao manifesto: tais quais a “Lula Livre”. Tira a legitimidade das manifestações pautas assim, Pedro? “Eu diria que não tira a legitimidade, afinal, a pauta do Lula Livre faz parte de uma parcela da sociedade brasileira que aderiram ao movimento. Mas a manifestação foi essencialmente pela educação pública e contra os cortes”, enfatiza.

Gorky reforça que as manifestações são suprapartidárias. Não há o que se falar em manifestação partidária ou não-partidária e rechaça a ideia de que a presença de legendas diminua os atos. Para Pedro, as manifestações são muito maiores que legendas políticas. “Não existe nenhuma dicotomia, nenhum problema os partidos políticos aderirem a nossa luta. Nossa luta não é nem partidária nem apartidária. Nossa luta é suprapartidária. É superior a qualquer questão partidária porque a nossa frente ampla, a nossa unidade será a educação pública, então, na verdade o que a gente tem a partir de comentários como esse é que querem confundir os estudantes, as pessoas que foram as ruas. Mentir, descaracterizando o papel que foram as manifestações, o caráter que ela teve”, salienta reforçando a preocupação com mentiras difundidas por notícias falsas e descontextualização dos fatos. Esse é um problema, Pedro? “Eu acho que um dos problemas do Brasil é que a mentira, a inverdade, a fakenews tá institucionalizada”.

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“Governo que se qualifica como desqualificado”

Estudante do Instituto Federal do Rio Grande do Norte e familiarizado com reuniões e conversas com parlamentares de diversos espectros e lados da política, Pedro analisa o cenário que o presidente da República se colocou junto com o ministro da Educação, Abraham Weintraub até o momento. Para ele, o cenário está sendo armado com intuito de precarizar e sucatear o ensino vislumbrando o interesse de valorizar instituições privadas. “Tudo é muito curioso. Primeiro foi noticiado cortes por causa da balburdia. Depois, passou para contingenciamento pra investir na educação básica e depois contingenciar para colocar regra de ouro. Não existe justificativa para o injustificável. Não existe resposta que não seja uma decisão política deste governo para priorizar o setor privado, abandonar o setor público e atacar a característica da educação publica e universal”, explica. Por fim, Pedro chama o governo de “insuficiente”. “Toda essa trapalhada, essas confusões de motivos pelos quais os cortes aconteceram, mostra a insuficiência do Governo”, provoca. Então, quão qualificado o governo está, Pedro? “Por causa das suas trapalhadas e um projeto ainda muito confuso o governo se qualifica como um governo desqualificado”.

E como responder aqueles que criticam o movimento, adotando a narrativa do Governo de que são “idiotas úteis” e mais manifestantes políticos do que propriamente estudantes? Ele classifica como um grupo minoritário que pensa dessa forma. “Essas pessoas são extrema minoria. Inclusive no próprio campo da direita, da base do governo Bolsonaro, várias pessoas que são até a favor da reforma da Previdência são contra os cortes na educação, porque mexer na educação é a gota d’água”, esclarece, sugerindo que as pessoas façam mais pesquisa com relação ao assunto. “Essas pessoas devem pesquisar. Mais de 99% das pesquisas desenvolvidas no Brasil são em Universidades Públicas. Basta ver e procurar para conseguir enxergar que investir na educação não é gasto, mas é investimento. Não é despesa mas algo que se retorna para o país. E nesse momento de crise econômica devemos apostar naquilo que gera inovação, ciência e tecnologia que são as Universidades e as Escolas brasileiras”, pontua.

Mas o país tá em crise, Pedro. Tem que dar uma segurada. O que eu tô fazendo é preocupar com o teu futuro e de vários outros estudantes para que se tenha faculdade amanhã“, poderia dizer Jair Bolsonaro num diálogo fictício com Pedro. O jovem presidente mais uma vez posiciona-se de maneira contundente em resposta a quem pensa desta forma e fazendo a analogia das armas, o chavão de que o presidente “deu um tiro no pé” é aplicável: “A resposta a esse pensamento muito que é muito pífio e raso ‘que tem que cortar mesmo porque tá numa crise‘ é que existem coisas que não podem ser cortadas. Vou fazer um paralelo sobre o que o Bolsonaro tem falando com relação as casas. Em uma casa tem coisas que não podemos mexer: não podemos ficar sem energia, alimentação, nem escola. Tem coisas que não se mexem e educação é uma delas e principalmente porque tem um retorno muito importante para o futuro do país porque é papel da universidade e da escola pública apontar saídas para as crises que nosso país passa. Então atacar a escola, a produção de ciência e tecnologia na verdade é um tiro no pé do futuro do nosso Brasil”, responderia Gorky.

“Não queremos um velório da educação brasileira”

Para Gorky era previsível que o governo chegaria a este ponto. Atacar a ciência, tecnologia e educação estava nas entrelinhas do seu plano de governo. O líder estudantil também sugere alinhamento de alguns membros da cúpula do governo com entidades de educação privadas. A irmã de Paulo Guedes, por exemplo, é vice-presidente da Associação Nacional de Universidades Privadas (Anup) entidade que representa monopólios educacionais, como Anhanguera, Estácio, Kroton, Uninove e Pitágoras. O sucateamento na educação, com a precarização, voucherização e a consequente privatização, está presente na cabeça de Pedro. Mas a ideia não é adotar o discurso utilizado pela “esquerda dos memes” e das redes sociais do “Eu Avisei”, para ele, esse discurso é aceitar um possível velório da educação brasileira. “A gente não quer fazer o discurso do ‘eu avisei’, a gente não quer fazer um velório da educação brasileira para dizer que estávamos certos. O que a gente quer é lutar pela escola pública brasileira e evitar retrocessos que não voltam atrás. A privatização da Vale não volta atrás, por exemplo. Se privatizar a educação, sucatear a educação ao ponto de ficar inviável a gente não vai conseguir atrás. Por isso que hoje, a gente não quer fazer um velório da educação pública”, prevê.

A educação brasileira, para Pedro, é um terreno fértil para a iniciativa privada. Dá lucro, rende receita. “A proposta do governo é muito clara: é a precarização da escola e universidade pública para passar pra voucherização, privatização. Passar para qualquer coisa que não seja o dever do Estado de garantir a educação pública, gratuita, universal e de qualidade. Então é a ação do governo, é o interesse deles. Esse corte é um aceno das corporações internacionais e privadas da educação e dizer que o Brasil é um terreno fértil pra ela”, analisa.

“O povo brasileiro lembra do que quer”

Há uma campanha forte para deslegitimar os atos e protestos contra os cortes ou contingenciamento de custos com a educação. O presidente Jair Bolsonaro chegou a apelar e compartilhou no twitter um vídeo em que Lula lá em 2010 realizou contingenciamentos e explicou a medida. Há diversos movimentos que apoiam o governo que ressucitam notícias dos governos anteriores anunciando cortes na educação. “É só porque é com Bolsonaro que estão fazendo esses protestos aí. Na época do PT ficavam caladinhos“, poderia justificar um hipotético apoiador do presidente da República. Pedro discorda que o movimento estudantil tenha ficado calado em todo esse tempo. Primeiro ele explica que não houve cortes nas verbas de custeio e se relembra de diversas vezes em que o Movimento Estudantil se mobilizou em governos passados. “Governos anteriores não cortaram verbas de custeio mas sim verbas de investimento. A primeira coisa é pontuar isso. E embora não fossem verbas de custeio, como foi tão grave como o governo Bolsonaro adotou agora se forem procurar, inclusive, eles vão ver que a UNE, a UBES e ANPG ocuparam Brasília em 2014 e 2015 quando houve cortes na educação.”, explicou.

Pedro lembra das jornadas pela educação iniciadas em 2013 e diversos protestos foram realizados em todo o Brasil. A presidente na época ainda era a petista Dilma Rousself. “Fizemos diversas jornadas desde 2013 até 2016 com agendas contra cortes na educação pública. A gente teve um impacto muito forte naquela época que foi a defesa dos 10% do PIB pra educação. Então, enfim, as pessoas estavam dormindo no ponto naquele momento e não sabem a história de luta dos estudantes brasileiros contra os cortes em qualquer governo.”

Para Pedro, a sociedade brasileira está lembrando apenas do que quer lembrar e esquecem-se de momentos históricos do país, mas ressalta que essa é uma das missões do movimento estudantil: relembrar o Brasil sua própria história. “O povo lembra do que quer. O nosso papel é lembrar as pessoas que o povo brasileiro tem memória, o povo brasileiro sabe realmente na luta de frente na luta com o brasileiro e os estudantes nunca evitaram em nenhum momento, em nenhum governo de lutar pelo nosso país”, explica.

 

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Domingos Ketelbey

Jornalista e editor do Diário de Goiás. Escreve sobre tudo e também sobre mobilidade urbana, cultura e política. Apaixonado por jornalismo literário, cafés e conversas de botequim.