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Categorias: Brasil
| Em 7 anos atrás

PF reconhece erros em análise de troca de telefonemas na Lava Jato

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A Polícia Federal reconheceu ao STF (Supremo Tribunal Federal) ter cometido erros na tabulação e análise de ligações telefônicas derivadas da quebra de sigilo em inquérito aberto como desdobramento da Operação Lava Jato.

A apuração, iniciada em 2015 a partir da delação do empreiteiro da UTC Engenharia Ricardo Pessoa, investiga, entre outros pontos, se o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Raimundo Carreiro recebeu R$ 1 milhão, por intermédio do advogado Tiago Cedraz, filho do então presidente do tribunal, Aroldo Cedraz, para uma decisão favorável à UTC em processo no TCU. O caso no tribunal poderia comprometer obras da usina nuclear Angra 3. São investigados no mesmo inquérito os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL), Romero Jucá (PMDB-RR) e Edison Lobão (PMDB-MA).

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A delegada da PF responsável pelo caso, Graziela Machado da Costa e Silva, é a mesma que desqualificou, em relatório, a delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Em junho, ela entregou um relatório conclusivo de 238 páginas ao STF para apoiar a abertura de uma ação penal -o pedido ainda está sob análise na PGR (Procuradoria-Geral da República). Um dos pontos realçados pela delegada foi o aparentemente enorme fluxo de telefonemas entre diversos dos investigados.

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Após ter acesso ao relatório, a defesa do advogado Tiago Cedraz advertiu a PF sobre falhas na identificação da posse e uso dos terminais telefônicos e afirmou que “a análise da delegada, com todo o respeito, encontra-se comprometida por graves equívocos, consubstanciados sobremaneira pela completa confusão na identificação dos usuários de diversas linhas cujos sigilos foram afastados”.

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Segundo a defesa, um telefone fixo atribuído a Tiago na verdade pertence ao pai, Aroldo, “há mais de 15 anos”, sendo o número de sua casa; um celular atribuído ao ministro era “uma linha adquirida através de plano familiar”, tendo “sido sempre utilizada pela esposa do ministro”; e outro celular atribuído ao ministro “sempre foi de utilização exclusiva da filha caçula do ministro”, irmã de Tiago.

‘Erros grosseiros’

Com a falha na identificação dos usuários das linhas, a PF passou a considerar como conversas entre Aroldo e Tiago, segundo argumentou a defesa de Tiago, “todas as chamadas efetuadas do celular do ministro para sua própria residência, do gabinete do ministro para sua própria residência, do celular da esposa do ministro para a residência do casal, do celular da filha do ministro para a casa dos pais Aroldo e Eliana, do escritório/celular de Tiago para o celular de sua mãe e, por fim, do escritório/celular de Tiago para o celular de sua irmã”.

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A defesa também apontou “erros grosseiros” na identificação de números enviados pelo TCU e no usuário de um número pertencente ao escritório de Tiago.

“As ligações que a Polícia Federal afirma terem sido realizadas a partir do gabinete do ministro Raimundo Carreiro, foram, na verdade, originadas do gabinete do ministro Aroldo Cedraz. Esse avassaladora confusão fez com que as ligações efetuadas do gabinete do ministro Cedraz para a sua própria residência, linha que a Exma. delegada erroneamente atribuiu ao requerente [Tiago], fossem computadas como chamadas telefônicas entre Raimundo Carreiro e Tiago Cedraz”, diz a defesa.

A partir daí, a PF passou a reavaliar o material e emitiu dois ofícios ao STF no último dia 10. Em ofício intitulado “comunicação importante acerca de erro material no relatório de análise” da PF, a delegada Graziela levou ao ministro relator do caso no STF, Edson Fachin, observações sobre seis pontos do relatório que ela havia entregue em junho.

Houve uma série de deficiências na análise. O telefone fixo que aparecia cadastrado como sendo da casa de Aroldo Cedraz foi considerado como sendo de Tiago, mas na verdade continuava sendo o da residência do ministro. A PF havia apontado 14.321 registros entre os dois interlocutores, o que insinuava uma estranha troca de informações entre ministro e advogado. Porém ocorre que, conforme esclareceu a defesa, eram ligações do ministro para sua própria casa, e não para o filho advogado.

Análise

A delegada concedeu: “Essa intensidade de ligações entre pai e filho pode ser alterada com a revisão do relatório, dimensionando em maior ou menor escala”. Para explicar a origem do problema, a delegada argumentou que Tiago havia fornecido à PF anos atrás, para a retirada de seu passaporte em 2012, o número telefônico que foi considerado como seu para a análise do inquérito.

Também notas fiscais oriundas da Receita Federal mostraram o mesmo número associado a Tiago. Porém, o advogado se casou em 2014 e trocou de endereço, segundo a defesa. “Portanto, as análises foram realizadas com as informações até então disponíveis e, durante a instrução da ação penal, caso seja iniciada com o recebimento da denúncia, poderá se sujeitar ao contraditório e ampla defesa.”

Em outro ponto que merece correção, a delegada afirmou que houve “erro material na alimentação dos extratos telefônicos encaminhados pelo Tribunal de Contas da União” e também poderá “ser dimensionada em maior ou menor escala” a intensidade dos contatos telefônicos entre Tiago Cedraz e o ministro Raimundo Carreiro.

O relatório da PF falava em “centenas de contatos ao longo dos anos de 2012 e 2014”. Um relatório anterior, de 2016, havia falado em 55 ligações. Agora todo o levantamento deverá ser refeito para se chegar ao número mais próximo da realidade, o que a PF ainda não apontou.

Da mesma forma, outro dos pontos importantes do relatório da delegada está comprometido. Ela havia apontado um fluxo de telefonemas em datas próximas da votação, no TCU, do processo de interesse da UTC Engenharia. “Os contatos identificados entre Tiago Cedraz, Aroldo Cedraz, Felipe Carreiro e a UTC Engenharia em determinadas datas do julgamento do processo (irregularidades na pré-qualificação) podem ser alterados”, escreveu a delegada.

Planilhas

Embora tenha reconhecido os equívocos, a delegada Graziela voltou a defender as conclusões gerais do seu relatório anterior. “A dinâmica de pagamento de propina a agentes públicos e agentes políticos não segue um ‘cronograma’ definido que traga uma relação lógica de causa e consequência, como um contrato com cláusula de sucesso, em que o agente público praticou um ato e na sequência é remunerado.”

Em outro ofício ao STF, a PF deu mais detalhes sobre a origem de um dos erros. O GINQ (Grupo de Inquéritos do STF), unidade da PF especializada em investigações sobre autoridades com foro privilegiado, apontou que o TCU não encaminhou à PF em formato de planilha o material resultante da quebra do sigilo das ligações entre os ministros Aroldo e Carreiro. Isso levou a PF a ter que elaborar uma planilha “de forma braçal”, concluída em outubro de 2016.

Na checagem da planilha feita pela PF a partir da manifestação da defesa de Tiago, entretanto, os policiais constataram “uma discrepância no que se refere ao terminal” que originou as chamadas telefônicas, pois “nos arquivos do TCU o ramal correspondente a cada ministro não precisava [não batia] com a informação lançada na planilha elaborada”.

“A falha se deu no decorrer da elaboração da planilha antes de deixá-la em condições do tratamento necessário para a importação de seu conteúdo para a base de dados da investigação, por erro humano, de tal forma que, em que pese a data, hora, duração e o terminal do destino estarem corretos, foi lançado no campo destinado ao terminal de origem a troca dos terminais dos ministros”, diz a PF no ofício. (Folhapress)

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