Pesquisadores do Hospital Israelita Albert Einstein, Sírio Libanês e um grupo de pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo apresentaram uma pesquisa feita com 104 portadores da covid-19 mostrando que a terapia com plasma sanguíneo de convalescente da doença é uma alternativa segura e pode trazer benefícios se aplicadas nos dez primeiros dias do sintoma.
“Do ponto de vista da segurança, mostramos se tratar de um procedimento de baixo risco, equivalente ao de qualquer transfusão sanguínea. No que diz respeito aos benefícios, observamos que evoluíram melhor os pacientes tratados mais precocemente. Mas, como foi um estudo de braço único [sem grupo controle tratado com placebo], nossa capacidade para avaliar a eficácia é limitada”, explica o hematologista José Mauro Kutner, docente do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein e um dos autores do artigo. A pesquisa ainda não teve revisão de outros cientistas, como é de praxe.
O método consiste, explica a pesquisa, em transfundir nos doentes um componente do sangue rico em anticorpos contra o patógeno a ser combatido, obtido de doadores que já se recuperaram da infecção. A ideia é que os anticorpos doados ajudem a reduzir a carga viral no organismo.
“Como esperado, os pacientes com mais idade, os obesos e os portadores de comorbidades evoluíram pior, mas isso não tem relação com o tratamento. O que nos chamou a atenção foi que os voluntários que já apresentavam anticorpos próprios contra o SARS-CoV-2 antes de receberem a transfusão de plasma foram mais beneficiados pela terapia do que aqueles que não tinham anticorpos próprios. Esse achado parece ser inédito na literatura científica”, conta Kutner.
Contrariando as expectativas dos cientistas, os participantes que receberam plasma com concentrações mais altas de anticorpos neutralizantes – um tipo específico capaz de bloquear a infecção das células – não necessariamente evoluíram melhor que os demais.
“O principal achado é que os voluntários tratados precocemente, nos dez primeiros dias após o início dos sintomas, evoluíram melhor do que aqueles que receberam o plasma depois desse período”, comenta Kutne.
A notícia é que os dados brasileiros vão se aproximam de estudos internacionais já divulgados, por exemplo, como o mais recente publicado no New England Journal of Medicine dos pesquisadores da Fundación Infant, na Argentina. Segundo o artigo, para ser eficaz, a terapia deve ser administrada dentro de 72 horas após o início dos sintomas e o plasma deve ter uma alta concentração de anticorpos neutralizantes.
De acordo com um dos pesquisadores, o anticorpo neutralizante é aquele que se une à parte mais superficial da proteína spike, usada pelo SARS-CoV-2 para se conectar com o receptor da célula humana e viabilizar a infecção. Essa região da proteína é conhecida como RBD (sigla em inglês para domínio de ligação ao receptor).
“A VNT não é uma técnica trivial e ainda está restrita a grandes centros de pesquisa. Porém, têm surgido métodos mais simples para analisar o plasma, o que pode facilitar o uso da terapia”, comenta Durigon, um dos pesquisadores.Durigondiz ainda que o tratamento envolve custos significativos. Além dos testes-padrão para qualquer doação de sangue, como os que visam detectar a presença de patógenos causadores de doenças transmissíveis, é preciso avaliar a quantidade de anticorpos neutralizantes e ter uma estrutura de banco de sangue para armazenar o material.
“A administração da terapia é estritamente hospitalar e requer acompanhamento médico. Não é, portanto, uma panaceia, mas pode ajudar alguns pacientes de grupos de risco a combater a infecção ainda no início”, conclui.
Hoje estes pesquisadores do ICB-USP investigam se o plasma de convalescentes da primeira onda da COVID-19 é capaz de neutralizar in vitro a nova linhagem do coronavírus identificada no Reino Unido, a B.1.1.7, que é considerada mais transmissível que a cepa original chinesa. Os resultados devem ser divulgados em breve.
(Com apoio da Agência FAPESP)