Uma pesquisa Datafolha divulgada no domingo (22) aponta que um total de 51% dos brasileiros acima de 16 anos disseram ter mais medo do que confiança na polícia. O dado supera o número de pessoas que afirmaram confiar mais na polícia do que temê-la: são 46%, cita reportagem do jornal Folha S. Paulo dessa segunda-feira (23).
O levantamento acontece no momento em que o governo federal propõe uma política unificada para a segurança e o uso de câmeras corporais para os agentes. O governador paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos) mudou de posição e passou a defender o item após vários casos de truculência policial serem flagrados por cidadãos. Já o governador goiano, Ronaldo Caiado (UB), que mantém boa avaliação sobre o setor, se mantém contra a proposta federal e totalmente contra o uso de câmeras.
A pesquisa mostra que o temor sobre as polícias é parecido entre gêneros (56% entre mulheres 52% entre homens). Já entre raças a diferença é maior (entre pretos 59%, e 45% entre brancos), assim como entre eleitores de Lula (PT) e de Bolsonaro (PL) no segundo turno de 2022 (58% no caso do primeiro e 40% no do segundo). As margens de erro nesses segmentos variam de 3 a 5 cinco pontos percentuais.
O instituto entrevistou 2.002 pessoas, de 16 anos ou mais, em 113 municípios de todo o país em 12 e 13 de dezembro deste ano. A margem de erro geral é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, com nível de confiança de 95%.
Conforme o jornal, o resultado é semelhante ao aferido na pesquisa anterior em que a mesma pergunta foi feita, em abril de 2019, em meio a gestão de Jair Bolsonaro. Na época, 51% afirmaram ter mais medo, enquanto 47% tinham mais confiança.
Os dados refletem a violência praticada pelas polícias no Brasil. Levantamento publicado pelo portal Uol em 18 de dezembro mostra que “policiais militares e civis do Brasil matam quase o triplo do que os agentes de segurança de 15 países do G20 somados”.
O levantamento se baseou no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho, mostrando que foram 6.393 mortos por policiais em 2023, enquanto os 15 países do G20 somam 2.267 vítimas fatais de policiais no mesmo período.
Para o pesquisador Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o resultado da pesquisa Datafolha deve servir de alerta para os agentes de segurança mudarem sua forma de atuação.
“A população não se sente segura em relação à forma de trabalho da polícia, mas não é de hoje”, disse ele. “Há aqui um reconhecimento de que a forma com que elas têm atuado historicamente tem incomodado, porque não é uma forma que vê a segurança e o direito social para todos.”
Já a coordenadora de enfrentamento à violência institucional da Conectas Direitos Humanos, Carolina Diniz cita que o temor da polícia é um fenômeno cíclico. “Não se trata de uma situação que acontece agora. Em São Paulo, a situação está longe do controle, mas temos visto dados alarmantes ao longo da história do Brasil.”
Segundo Diniz, os homens, geralmente, são os principais alvos da violência policial, mas são as mulheres que cuidam dessas vítimas. “São as mulheres que sofrem essa violência, que não sabem se os filhos vão voltar para casa.”
No caso de quem tem mais confiança nos agentes de segurança do que medo, as taxas mais altas estão entre homens (52%, ante 40% entre as mulheres), moradores da região Sul (57%), brancos (53%, ante 38% entre os pretos), e os eleitores de Bolsonaro no 2º turno da eleição presidencial de 2022 (58%, ante 38% entre os eleitores de Lula). As margens de erro nesses segmentos variam de três a seis pontos.
O Datafolha mostrou também que a maioria da população (63%) disse ter tomado conhecimento sobre os casos de violência policial em São Paulo, sendo que 34% responderam estar bem informados sobre o tema, 25%, mais ou menos informados, e 4%, mal-informados. Uma parcela de 37% declarou não ter conhecimento acerca dos casos –entre os que têm 16 a 24 anos, o índice sobe para 56%.
Entre aqueles que tiveram conhecimento dos recentes casos, 55% afirmaram ter mais medo que confiança na polícia, e 42%, mais confiança que medo.
A reportagem mostra como discursos de violência enfraquecem a legitimidade da instituição e agravam a sensação de temor quanto à polícia, citando como exemplo o atual secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite. “Capitão reformado, Derrite foi questionado em um podcast, em maio de 2021, sobre os motivos que o levaram a deixar a Rota. ‘A real? Porque eu matei muito ladrão’, disse na ocasião.”