O percentual do valor do imóvel financiado pelos bancos atingiu o menor nível em dez anos, em uma combinação de mais cautela das instituições na concessão de crédito e incertezas em relação ao preço das propriedades.
O indicador LTV (Loan-to-value, em inglês), que mede a fatia do valor do imóvel que, em média, foi financiada por bancos, recuou para 58,2% em março -menor nível desde 2007, quando a parcela era de 56,4%. Em seu ápice, em 2014, o índice atingiu 65,4%.
Isso significa que, em março, um imóvel avaliado em R$ 100 mil teria R$ 58,2 mil financiados por bancos.
Os dados, da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança), consideram os empréstimos concedidos com recursos da poupança.
Essa fatia média financiada está bem abaixo do limite anunciado pelas instituições financeiras, que chega a 90% nos bancos públicos. E também é inferior à faixa considerada saudável pelo mercado, que é de 70% a 80%, afirma Alberto Ajzental, professor da escola de economia de São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas).
A desvalorização recente dos preços de imóveis ajuda a explicar a redução, diz. Um banco que financie 80% do valor de um imóvel de R$ 100 mil está emprestando ao comprador R$ 80 mil. Se o preço do imóvel recuar para R$ 80 mil, na prática a instituição financeira estaria financiando 100% do valor do imóvel.
“Uma situação em que uma das partes [o comprador] não tem nada a perder não é saudável”, ressalta.
Isso mesmo em um contexto em que o crédito concedido tem como garantia a alienação fiduciária, na qual a propriedade é do banco durante o financiamento, tornando a retomada mais ágil em caso de inadimplência.
Ajzental lembra que manter um imóvel não é interessante para o banco. “Há pouca margem para liquidar o imóvel sem ter prejuízo. Ele vai ter que vender muito barato para conseguir um comprador”, ressalta o professor.
Combinado com a queda de preços, a própria crise econômica fez com que os bancos restringissem o crédito.
“Deveria haver na carteira percentuais de financiamento mais agressivos, que não são mais concedidos. Os bancos estão mais cautelosos.”
Os valores total financiados recuaram 7,8% no primeiro trimestre, para R$ 10,06 bilhões, segundo a Abecip.
Do lado do comprador, as condições econômicas minam a confiança para assumir uma dívida de longo prazo, como é o caso do financiamento imobiliário.
“O consumidor não está procurando se endividar demais. Ele se preocupa em ter uma entrada maior e uma dívida menor”, afirma Gilberto Abreu, presidente da Abecip.
A leitura é parecida com a de Michael Viriato, professor do laboratório de finanças do Insper: “Se o comprador não tem emprego ou se tem receio de perder o emprego, ele tem menos confiança de assumir uma dívida de longo prazo”.
“Mas, em tese, ele vai tentar financiar o máximo que conseguir”, diz Viriato.
O cenário só vai melhorar quando os dois principais pilares do mercado imobiliário, crédito e emprego, voltarem a dar sinais de recuperação.
“Essa parcela financiada só deve aumentar no ano que vem. A taxa de juros caindo, a inflação controlada e a melhora no emprego devem levar a um crescimento nessa taxa”, afirma Viriato.
Para Abreu, da Abecip, a tendência é que os bancos emprestem mais a partir de 2018, com um cenário de juros menores, inflação controlada e criação de emprego. (Folhapress)