A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) aprovada na última semana, estendendo aos guardas municipais regras de aposentadoria iguais às aplicadas a agentes penitenciários, agentes socioeducativos e policiais civis, tem graves vícios jurídicos que tornam sua aplicação inviável. O principal deles é esbarrar na Constituição Federal e, consequentemente, no Supremo Tribunal Federal (STF).
Quem aponta é o advogado Eurípedes Souza, especialista em Direito dos Servidores Públicos. “A PEC é inconstitucional, pode ser questionada em instância superior [STF] pela própria Procuradoria-Geral da República, por algum juiz em julgamento de ação relativa ao assunto ou o pelo próprio prefeito, como no caso de Goiânia”, citou ele em entrevista ao Diário de Goiás.
O especialista afirma que considera justa a proposta de uma aposentadoria diferenciada para os guardas municipais, mas que a PEC foi apresentada de forma populista.
O motivo, alega, é que, embora haja mais liberdade para estados e municípios estabelecerem regras para a previdência após a Reforma da Previdência de 2019, “o Supremo sempre disse, infelizmente, que a atividade dos guardas municipais não é uma atividade realmente perigosa a ponto de justificar a equiparação das regras de aposentadoria dos policiais”.
Ele acredita que o assunto foi reavivado recentemente, de forma nacional, porque houve julgamento do Supremo colocando os guardas municipais como parte do chamado de Sistema Único de Segurança Pública.
Mesmo assim, sustenta o advogado, a alteração feita na Constituição Estadual contraria o artigo 40, parágrafo 4-B da Constituição Federal, que é soberana. De acordo com ele, o STF tem entendimento consolidado sobre a questão e o Ministério da Previdência divulgou Nota Técnica recente dizendo ser inviável a extensão da aposentadoria especial por atividades perigosas aos guardas civis enquanto não for alterado o artigo da Constituição Federal.
“Esse dispositivo da Constituição Federal apenas admite a aposentadoria diferenciada para quem exerce atividade perigosa, para os cargos de agente penitenciário, agente socioeducativo, policial legislativo da Câmara ou do Senado e das carreiras que estão estabelecidas ali nos incisos 1 a 4 do artigo 144. E esses incisos falam do policial federal, do policial rodoviário federal, do policial ferroviário federal, do policial civil, policial militar e dos policiais penais. Então, o artigo da Constituição Federal, não admite o estabelecimento de regras especiais para aposentadoria dos guardas municipais”, resume.
O especialista acompanha o tema e confirma que existem algumas propostas de emenda à Constituição Federal (PECs) tramitando no Congresso que poderiam sanar o impasse, mas são PECs que por sua própria natureza não tramitam rapidamente. “Enquanto isso, a PEC aprovada na Alego existe, mas do ponto de vista jurídico, ela é inviável e pode ser questionada judicialmente a qualquer momento através de uma ação direta de inconstitucionalidade [ADIN]”, completa.
A PEC nº 7/24 (processo nº 10495/24) foi aprovada em última votação no dia 15, com a concordância de 27 deputados. O autor da proposta foi o presidente da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), Bruno Peixoto (UB). Ele atendeu a pedido do presidente da Câmara de Vereadores de Goiânia, Romário Policarpo (PRD), que representa os guardas municipais, faz parte do grupo político de Peixoto e é candidato à reeleição este ano.
A PEC altera os artigos 97 e 121 da Constituição Estadual ao estender as regras de aposentadoria aplicáveis a agentes penitenciários, agentes socioeducativos e policiais civis às guardas municipais que exercem a segurança pública no Estado de Goiás.
Na primeira votação, ocorrida no dia 13, a proposta havia sido aprovada em primeiro turno com 26 votos favoráveis. A aprovação das PECs deve ser qualificada, com ao menos três quintos dos votos do Plenário (25 dos 41 deputados goianos).