A sombra da Netflix e o a ameaça dos serviços de VoD (vídeo sob demanda) sobre a indústria do cinema dominou debate entre gestores de órgãos estatais do audiovisual de França, Alemanha e Brasil.
O encontro, realizado nesta quarta (19), no Rio, foi organizado pela Ancine (Agência Nacional do Cinema). Em comum, defenderam a regulação desses tipos de serviços como forma de preservar o cinema tradicional.
“A sala de cinema é o elo indispensável para a promoção e exploração de filmes”, disse Christophe Tardieu, diretor-geral delegado do CNC (Centre National du Cinéma et de L’Image Animée), entidade que regula a atividade na França. “O VoD é incrível, mas deve acontecer sempre depois do cinema.”
A França, um dos maiores mercados audiovisuais do mundo, trava uma queda de braço com a Netflix, que esquentou assim que foi anunciada a seleção oficial do Festival de Cannes deste ano, na última quinta (13).
Dois filmes que compõem a mostra de cinema, “Okja” e “The Meyerowitz Stories”, são produções da Netflix, que anunciou a estreia de ambos diretamente na plataforma sem passar pelas salas de cinema, o que desencadeou a ira da entidade audiovisual francesa.
“A ideia não é dizer que a Netflix é do mal por ser americana”, disse Tardieu. “Mas é indispensável que ela seja tributada. Consideramos que é lógico que serviços de vídeo sob demanda ajudem nisso porque vão viver da exposição dessas obras.”
Na França, a janela de exibição, isto é, o período entre a estreia de um filme nos cinemas e a sua chegada a plataformas sob demanda, vai de 22 a 34 meses. Nesse ínterim, boa parte dessas produções é exibida em TVs por assinatura.
“É natural favorecer aqueles que investem nos filmes. E quem mais investe são os canais pagos, que dedicam 12,5% de seu faturamento ao investimento em novas produções”, afirmou Tardieu.
Peter Dinges, que preside o FFA, entidade alemã do audiovisual, fez coro, mas ressalvou que o modelo convencional das salas de cinema corre risco de extinção.
“Não há futuro para o cinema tradicional, aquele que oferece todo tipo de filme e simplesmente espera pelo cliente”, disse.
“Especializar a sala com base na sua clientela é a solução”, completou Dinges, que citou como exemplo locais que oferecem propostas de cardápio “gourmet” ou realizam grandes eventos, como concurso de fantasias, para promover certos tipos de filmes.
Ao abrir o evento, o diretor-presidente da Ancine, Manoel Rangel, tratou do crescimento do mercado audiovisual brasileiro nos últimos 15 anos -aumento das bilheterias, dos assinantes de TV por assinatura e do número de salas de cinema-, e também defendeu regulação dos serviços de vídeo sob demanda.
“O vídeo sob demanda é a próxima fronteira do audiovisual”, disse. “Eles têm relevância econômica o suficiente para requerer uma regulação do Estado. Só a Netflix tem 7 milhões de assinantes e receitas superiores às do SBT, vice-líder em audiência na televisão.”
A Ancine deve publicar a notícia regulatória sobre esses serviços ainda neste ano.
Rangel também detalhou o aumento do número das salas de cinema no Brasil. “Em 2016 mais salas foram abertas no interior do que nas capitais. E isso tem sido também muito forte nas cidades das regiões Norte e Nordeste.” (Folhapress)