Os países devem começar a mudar seus sistemas de transportes, adotando novos parâmetros que privilegiem mais o planejamento e o investimento em tecnologia e menos em grandes construções.
É o que recomendou a ONU num primeiro relatório escrito por uma comissão de 16 notáveis do setor convocada em 2014 para auxiliar o secretário-geral da entidade, Ban Ki Moon. O texto delineia 10 diretrizes que os países devem perseguir até 2030 para assegurar uma melhoria no setor.
Elaborado após quase dois anos de trabalho, o trabalho aponta que deve haver integração entre as políticas de sistema de transporte e de infraestrutura. Também defende que os financiamentos para investimentos devem se basear numa visão “holística da natureza complexa dos investimentos em transportes e suas consequências”, considerando que a utilização de tecnologias inovadoras e de combustíveis limpos são um “imperativo”.
De acordo com o português José Viegas, presidente do ITF (Internacional Transport Forum), órgão que auxilia a OCDE no setor e que participou do grupo de conselheiros, a atual política de transporte é baseada na tentativa de se fazer investimentos em grandes obras para aumentar a velocidade de deslocamento das pessoas, focando principalmente na motorização e no transporte individual.
Segundo ele, as diretrizes da nova política recomendada pela ONU passam a dar ênfase ao trinômio ASI (Avoid-Shift-Improve, que numa tradução livre seria Evitar, Aumentar e Melhorar) -evitar os deslocamentos não necessários, o aumentar é para o uso mais eficiente de energia e melhorar seria para os atuais meios se tornarem mais eficientes.
Esse trinômio, segundo Viegas, seria para evitar o que se chama de uso desnecessário do transporte com a adoção de novas tecnologias que tornem a utilização dos meios mais racional e menos poluente.
“Transporte é mais que uma ferramenta para ir do ponto A ao B. É uma força para criar sociedades funcionais”, disse Viegas por e-mail à reportagem.
Uma mudança em relação aos parâmetros atuais poderia reduzir a necessidade de investimentos no setor, estimada pela ITF em US$ 2,1 trilhões/ano no mundo se mantidos os atuais parâmetros, para US$ 1,4 trilhão, gerando uma economia estimada em US$ 700 bilhões ao ano.
O uso mais racional do setor colaboraria também, de acordo com o relatório, com a redução das emissões de gases do efeito estufa e está alinhado com as diretrizes da ONU que levaram ao Acordo de Paris. Segundo dados do ITF, cerca de 1/4 das emissões do mundo são de responsabilidade do sistema de transporte.
“O transporte verdadeiramente sustentável auxilia não apenas na prevenção das alterações climáticas, mas também se integra nas estratégias e políticas de desenvolvimento para apoiar o crescimento inclusivo e equitativo e o desenvolvimento social”, relata Viegas.
Recentemente, os países acordaram um pacto para reduzir as emissões do setor de transporte aéreo. Conduzido no Brasil pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o acordo prevê que as emissões do setor vão ficar estáveis a partir do número de 2020, independentemente do crescimento do setor.
Das dez medidas recomendadas pela ONU para o setor, três são especialmente importantes para países em desenvolvimento, na avaliação de Viegas.
Para ele, a tomada de decisão de investimentos considerando as novas tecnologias, a maior capacitação de técnicos dos governos e a criação de instrumentos para analisar dados gerados pelo transporte, devem ser alvos perseguidos por governos como o do Brasil.
O rápido crescimento da motorização nessas regiões, associado ao alto número de mortes no trânsito, podem ser combatidas com essas políticas de maneira mais eficaz que a aplicação exaustiva de recursos em mais infraestrutura.
“Há uma real oportunidade para os países emergentes de se integrarem à visão do século 21 em termos de mobilidade, descritas no relatório, e saltar de seus atuais problemas no setor para o nível dos países desenvolvidos”, acredita Viegas.
Folhapress