Em crise e com um déficit estimado de R$ 334 milhões, a prefeitura de Goiânia tem para receber, apenas de 10 contribuintes – os maiores devedores da capital – pelo menos R$ 281 milhões para receber de apenas dez contribuintes com Imposto sobre Serviços (ISS) em atraso e mais R$ 5,1 milhões de outras dez empresas e entidades que estão com o talão de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) em aberto.

A prefeitura conseguiu a aprovação na Câmara, na semana passada, de uma Lei que inclui os devedores no cadastro de proteção ao crédito e o estabelecimento de um programa de parcelamento destas dívidas, com desconto de multa e juros.

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Amargando um déficit de R$ 334 milhões, a Prefeitura de Goiânia tem um crédito de R$ 281,8 milhões para receber de apenas dez contribuintes pessoa jurídica que estão com o recolhimento de Imposto sobre Serviços (ISS) em atraso desde 2006 e mais R$ 5,1 milhões de outras dez empresas e entidades que estão com o talão de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) em aberto na capital.

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O ISS e o IPTU são as maiores fontes de arrecadação do município. Se estas dez maiores dívidas de cada tributo fossem quitadas, a Prefeitura teria recursos de R$ 286,9 milhões, suficientes para a construção de 50 Cmeis padrão (cada um orçado em R$ 2,2 milhões), 50 Unidades de Pronto Atendimento (UPA), ao custo de R$ 2,5 milhões a unidade, e ainda sobrariam R$ 51 milhões.

O saldo a receber destas pessoas jurídicas faz parte de uma lista, à qual O POPULAR teve acesso. A relação completa inclui 832 empresas e entidades que estão inadimplentes em pelo menos R$ 50 mil. São empreiteiras, indústrias, times de futebol e até órgão do governo estadual, como a Saneago, com uma dívida que beira os R$ 243 milhões.

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Os débitos da maioria se arrastam desde 2006 e, por isso, grande parte destas entidades já está com seus CNPJs inscritos na dívida ativa. Entre as dez entidades consideradas devedoras pela administração pública, todas têm ação de execução fiscal já ajuizada. Mas sem previsão de fim para estes processos.

Estas entidades contestam a cobrança dos tributos e prometem recorrer em todas as instâncias. Algumas acreditam ter direito à isenção do IPTU por conta da atividade social que desenvolvem; outras esperam a regulamentação de lei que dê anistia da dívida; e há os que acreditam que a atividade desenvolvida não poderia ser onerada pelo ISS.

NEGOCIAÇÃO DIFÍCIL

Em comum, todos reclamam da falta de um canal eficiente para negociação com o município. Um em cada três inadimplentes diz ter tentado negociar a dívida, mas sem êxito. A falta de disposição por parte da Prefeitura em facilitar o pagamento, com medidas consideradas básicas em finanças públicas, como parcelamentos e desconto de multas e juros diferenciados, contribui para a permanência do endividamento, reclamam .

O secretário de Finanças, Jeovalter Correia, reconhece a situação e diz que a pasta já está priorizando a negociação junto a estes contribuintes. Na última quarta-feira, a equipe econômica do Paço lançou uma política de austeridade e de levantamento de recursos do município, para abater o cenário de déficit nas contas do município.

Uma das principais medidas está a inclusão de devedores no cadastro de proteção ao crédito e o estabelecimento de um programa de parcelamento destas dívidas, com desconto de multa e juros. Na terça-feira, a Câmara de Goiânia aprovou projeto que institui estas iniciativas no município.
“Queremos receber este dinheiro dos maiores devedores. Estamos fortalecendo a diretoria de cobrança. Vamos pensar em mais formas de facilitar o pagamento. Se precisar, podemos enviar projeto de lei para Câmara e analisar caso a caso. Mas queremos receber este dinheiro o quanto antes”, diz.

CENÁRIO

Hoje, o município tem um crédito a receber total de R$ 4,7 bilhões. O débito com ISS, incluindo os já inscritos na dívida ativa, além das pessoas físicas e jurídicas, é R$ 3,1 bilhão. Os dez maiores devedores pessoas jurídicas respondem por 8,92% desta dívida (R$ 281,8 milhões).

O ISS é a principal fonte de arrecadação do município. Entre os inadimplentes estão dois órgãos públicos estaduais: Saneago e Ipasgo. Juntos, eles têm uma dívida de R$ 252,9 milhões – que daria para cobrir todo o déficit financeiro mensal do município (de R$ 33,5 milhões) até o fim deste ano, pelo menos.

A dívida da Saneago pelo não recolhimento do ISS na cobrança da tarifa de água é, de longe, a maior dentre todas. São R$ 242,6 milhões que estão sendo contestados na Justiça. A origem da dívida está na autuação da empresa pública, pelo Fisco, pelo não recolhimento do tributo em sua atividade. Houve negociação em âmbito administrativo deste débito, mas a opção foi por recorrer ao Judiciário.

A empresa, porém, diz que o processo de execução não deveria ter sido iniciado pela Prefeitura. “A Saneago propôs uma ação rescisória para rever sentença favorável ao município. Foi julgada procedente pelo Tribunal de Justiça. Atualmente, o processo está no STJ, aguardando julgamento dos recursos”.

O procurador-geral do município, Carlos de Freitas, diz que recente jurisprudência do STF prevê imunidade tributária para o serviço público de água. “Vou procurar a Saneago para negociar o encerramento desta demanda”, afirma.

O Ipasgo, também por meio de sua assessoria, diz que a referida dívida, pela execução de serviços médicos, está sendo discutida administrativamente, já que seu departamento jurídico entende que a exigência contém nulidades. Além disso, em outro processo análogo, o Ipasgo tem uma decisão favorável, transitada em julgado.

A BrasilTelecom (Oi) afirma que seu processo está em curso. Pelas regras, informa por meio de sua assessoria, a empresa não responde a nenhum processo em curso. Procuradas pela reportagem, a Centro-Oeste Comunicações e Editora e Sociedade Educacional de Goiânia não responderam aos contatos feitos desde terça-feira.

Nenhum representante da Labuto de Recursos Humanos para Serviços Temporários, Sia Parking Estacionamentos e Etam – Escritório Técnico de Assistência Municipal foi encontrado para comentar. Segundo informações do mercado, estas empresas estariam desativadas.

Em recuperação judicial, Emegê lidera lista

Com o IPTU, o município tem um crédito total a receber de R$ 451,1 milhões. Da mesma forma, neste valor estão incluídos pessoas físicas e jurídica. O saldo de atrasados apenas dos dez maiores dívidas de pessoa jurídica (R$ 5,1 milhões) corresponde a quase 2% deste total. A Emegê, um dos maiores fabricantes de massa do Centro-Oeste, tem a maior pendência: de R$ 1,7 milhão.

Desde 2011, a empresa está em recuperação judicial por conta do descontrole nas contas. A gerente do departamento Jurídico, Adriana Ananias, explica que a empresa, por estar em recuperação judicial, depende da liberação pela Justiça de seus ativos para cumprir o Plano de Recuperação já aprovado e homologado em assembleia geral de credores.

“Estas liberações, que estão previstas no plano, darão a empresa condição de vender parte de seus ativos para a liquidação desses débitos junto ao IPTU”, esclarece. Ela ressalta que esses são procedimentos judiciais.

Procurados pela reportagem, o Goiás Esporte Clube, Construtora Canadá e a Associação Salgado de Oliveira disseram que não vão se pronunciar. A reportagem não encontrou nenhum representante da Diagonal Construtora e da massa falida da Caixego para comentar o assunto.

Clubes e associaçõesse sentem injustiçados

Clubes recreativos e associações desportivas afirmam que estão injustamente na lista de devedores de IPTU. Entre as maiores pendências, cinco são deste segmento. A Associação dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar aparece com duas dívidas, que somam mais de R$ 1 milhão, e a Associação dos Economiários (Clube dos Servidores da Caixa Econômica Federal), com três, que somam, R$ 766,4 mil.

Os representantes de ambas afirmam que a lei municipal 160/2007, aprovada durante a gestão do ex-prefeito Iris Rezende (PMDB), dá isenção para clubes que abrirem vagas para estudantes da rede municipal e/ou estadual de educação para a prática desportiva, como natação, futebol e vôlei.

A isenção do tributo seria parcial ou total. Mas a lei ainda não foi regulamentada e existem várias questões dúbias. Enquanto esperam a regulamentação, as entidades não pagam IPTU.

O presidente do Clube dos Sargentos, subtenente Luís Cláudio Coelho de Jesus, diz que a lei criou dispositivo que vincula a isenção às entidades que não tiverem débitos anteriores a 2007. “Tentamos negociar essa dívida de R$ 737 milhões. Mas a Prefeitura estipula um prazo de 24 meses, o que daria R$ 30 mil por mês. Não temos como pagar esse valor. Precisamos de um parcelamento de 120 meses”, diz o PM, que assumiu a entidade em janeiro deste ano.

O gerente de Esporte da Associação dos Economiários, Leirimar de Sousa Silva, afirma já foram realizadas reuniões com representantes da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer (Semel), que garantiram que iriam elaborar uma lei, que seria enviada pelo prefeito Paulo Garcia (PT) para Câmara. Mas até o momento esta ação não foi realizada. “Estamos tentando negociar”, afirma.

Em nota, empresário diz que não é devedor

O empresário Lourival Lousa Júnior, que aparece na lista dos maiores devedores de ISS, na quinta colocação, com uma pendência de R$ 2,3 milhões, por não ter pago multa de outorga onerosa, não é o dono do Flamboyant Shopping Center, alega sua assessoria.

A dívida é referente ao empreendimento Residencial Bosque Flamboyant – um conjunto habitacional construído no Jardim Goiás -, que, por sua vez, também aparece na lista dos dez maiores devedores, pela ocorrência do mesmo motivo, mas com valor de R$ 2,1 milhões.

O proprietário do Flamboyant Shopping Center, Lourival Louza Junior, tem a grafia de seu sobrenome com “z” e não com “s”, como aparece na lista, frisa sua assessoria. Por meio de nota, empresário goiano diz não possuir nenhum débito de ISS com a Prefeitura Municipal de Goiânia.

“Informamos que o CNPJ descrito refere-se a uma empresa com sede em São Paulo, chamada Sociedade Residencial Bosque Flamboyant”, afirma. A nota ainda diz que “Lourival Louza Junior não é e nunca foi proprietários e/ou sócio dessa empresa ou teve com essa qualquer parceria”, diz.

O empresário Lourival Lousa Júnior e representantes do empreendimento Residencial Bosque Flamboyant não foram encontrados pela reportagem para comentar o assunto. O POPULAR levantou que a empresa funcionaria num escritório no Centro de São Paulo. A reportagem entrou em contato com a Junta Comercial paulista, que também não conseguiu localizar a empresa.

Prefeitura tem até 5 anos para inscrever atrasados

O diretor de Receita Imobiliária da Prefeitura de Goiânia, José Marcos, explica que o município tem até cinco anos para inscrever o contribuinte com tributo em atraso na ativa. Após este período a dívida prescreve. Ou seja, a administração perde a chance de cobrá-la.

Na maioria dos casos, depois de 2 anos com o débito em aberto, a Prefeitura convoca o contribuinte para negociação. “É como se fosse um alerta para que o contribuinte resolva sua situação perante a Prefeitura. Se no prazo de até um ano, ele não parcelar ou pagar o débito, ele é inscrito na dívida ativa”, diz.

EXECUÇÃO

Após a inscrição na dívida ativa, o processo vai para a Procuradoria da Fazenda Pública Municipal, que dá início à ação de execução, no Judiciário. Apenas com a inscrição na dívida ativa, o contribuinte fica impedido de tomar empréstimos e de participar de licitações públicas em Goiânia.

“O encaminhado para a Procuradoria é feito direto pelo sistema”, diz. Em alguns casos, o contribuinte parcela o débito, mas deixa de pagar. “Nestes casos, a Prefeitura detecta o não pagamento e encaminha para a dívida ativa da mesma forma”, afirma.

Com o ISS, imposto cobrado pela execução de serviços no âmbito do município, o não recolhimento, geralmente, é detectado por auditores fiscais. O Fisco detecta, na prática, o não recolhe do tributo durante a execução de alguma atividade ou serviço.

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