Quase dois meses após ser nomeada reitora da Universidade Federal do Estado de Goiás (UFG), a professora Angelita Pereira de Lima viveu antes mesmo de assumir o cargo um episódio ‘desgastante’ na política acadêmica, afinal de contas, sua nomeação partiu de uma interferência do Governo Federal que ignorou o primeiro nome da lista tríplice eleita pela comunidade. “[Isso] nos custou internamente, [tivemos de fazer] um rearranjo, [foi] um gasto de energia muito grande para fazer um rearranjo interno para que pudéssemos nessa condição da nomeação que a gente não perdesse a confiança da comunidade universitária”, destaca em conversa ao DG Entrevista publicada nesta terça-feira (08/03). (O vídeo na íntegra da entrevista você pode assistir ao final da matéria).
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Superados as desconfianças iniciais, após muitas “conversas, ações e reuniões”, Angelita mirou a organização administrativa da entidade. “Temos pró-reitorias todas nomeadas. Temos pelo menos quatro pró-reitores e pró-reitoras. A gente tem uma equipe nova em vários aspectos, na gestão. A UFG teve nesse período de expansão e consolidação como instituição de ensino, pesquisa e produção científica de alta qualidade, a UFG atraiu para si quadros muito competentes e importantes do Brasil inteiro, mas aqui de Goiás também e formou quadros muito competentes na área da pesquisa”.
Mas os principais desafios que Angelita vivenciará será na condução futura da Universidade, afinal de contas, a entidade não só em Goiás anda vivenciando ano após anos, perdas significativas no orçamento para o financiamento científico, educacional e também de gestão. “Aqui há um processo de sucateamento da Universidade. Os laboratórios vão perdendo, equipamentos vão se desatualizando, nós tivemos um período sem recursos para custeio. Temos prédios danificados. Isso tudo foi se acumulando porque você não consegue resolver tudo de uma vez. Nós temos um passivo que é das dívidas que a gente não conseguiu e temos um outro passivo que é do sucateamento dos prédios e das condições de trabalho. Isso envolve tudo, prédio, alvenaria, telhado, móvel, equipamento, você tem outro passivo que tem impacto direto no funcionamento da universidade. Os desafios são imensos”, alerta.
Confira os principais trechos da entrevista com a professora e reitora da UFG, Angelita Pereira de Lima:
Primeiro ato da gestão
Nesses quase dois meses, pouquíssimo tempo, vivemos algumas etapas, digamos. Uma delas, foi desde o momento do anúncio da nomeação, do terceiro nome da lista que era o meu, nos custou internamente, um rearranjo, um gasto de energia muito grande para fazer um rearranjo interno para que pudéssemos nessa condição da nomeação que a gente não perdesse a confiança da comunidade universitária. Para que pudéssemos além de adquirir a confiança, manter a estabilidade interna da UFG. Essa foi uma primeira etapa, foi importante. Fizemos várias conversas, ações e reuniões. Isso, na primeira fase em janeiro, foi absolutamente necessário e também, junto com isso, a confiança da comunidade externa, de vocês da área de comunicação que abriram espaço para cobertura daquilo que estava se passando na universidade e as pessoas que pouco tem familiaridade deste processo e também haviam dúvidas. Essa etapa foi superada, eu diria que com certo êxito. Com que indicador? Um indicador de que a Universidade passou por esse período e não parou nem caiu na instabilidade política. Ao contrário, houve muitas manifestações na reitoria favoráveis de apoio e solidariedade. A mim e a professora Sandramara. Apoio a Universidade, em defesa à Universidade, a autonomia da Universidade.
Nomeação da equipe de apoio à gestão
Outra etapa que estamos terminando agora foi a de nomeação da equipe. Temos pró-reitorias todas nomeadas. Temos pelo menos quatro pró-reitores e pró-reitoras. A gente tem uma equipe nova em vários aspectos, na gestão. A UFG teve nesse período de expansão e consolidação como instituição de ensino, pesquisa e produção científica de alta qualidade, a UFG atraiu para si quadros muito competentes e importantes do Brasil inteiro, mas aqui de Goiás também e formou quadros muito competentes na área da pesquisa. Essa equipe mais jovem reflete bastante esse momento pujante da UFG. Essa etapa estamos terminando agora, praticamente todas as nomeações estão sendo feitas. Tem uma ou outra diretoria, outra coordenação ainda para serem nomeadas.
Execução do plano de gestão
Nós formamos à época da campanha, 20 GT’s com perspectivas de atuação muito importantes para avanços da UFG em vários aspectos e esse plano de gestão e ai chamo de terceira etapa é essa agora que fizemos uma reunião de planejamento na segunda-feira e vamos encerrar essa parte do planeamento na terça-feira (hoje) e depois esse plano será encaminhado ao Conselho Universitário no dia 25 de março para apreciação. Essa terceira etapa do plano de gestão será concluída a partir da apreciação do Conselho Universitária. Eu penso que para esse momento inicial, nós temos essas três etapas importantes, obviamente atendendo as demandas do dia-a-dia que não são poucas que ocorreram desde o dia 11 de janeiro até hoje.
Papel de Sandramara e de Madureira na administração
A nomeação da professora Sandramara como assessora especial do gabinete da reitoria que cumpre um papel extremamente importante como gestora e nesse momento da transição das gestões e nomeações e por fim a nomeação do professor Edward Madureira Brasil para uma assessoria que criamos de articulação institucional. O papel que o professor Edward passa a cumprir na gestão neste momento é justamente o de estabelecer e manter as boas relações que a UFG tem com as instituições e os espaços de poder no estado de Goiás. Isso tudo fez com que essa primeira etapa que chamei de estabilidade, construção da confiança e estabilidade política fosse vencida com êxito.
Sucateamento da Universidade
Do ponto de vista do orçamento nós temos grandes desafios que são prioridade. A UFG ela vai receber, mas ela não recebe de forma líquida e certa não, pode vir de forma contingenciada, escalonada, isso dificulta muito a gestão, mas para 2022, o orçamento para custeio que é o discricionário, energia, do serviço terceirizado, manutenção dos prédios, água, a Universidade vai receber 71 milhões e 408 mil e 22 centavos. Para você ter uma ideia, em 2015, a Universidade recebeu 138 milhões 193 mil mais alguma coisa somente para o custeio. Ora, é uma quebra constante, foi uma redução em 2016 que caiu de 138 para 108, depois para 91 milhões e assim vem caindo… Ano passado, 76 milhões. Comparado a 2015 temos menos da metade do orçamento e se você considerar o processo inflacionário, se considerar que tudo hoje custa mais caro, a Universidade está com déficit de orçamento extremamente alto. Isso falando em custeio, porque se falar em capital, ou investimento, que é aquisição de equipamentos permanentes, duradouros. Vou pegar 2014 que foi o pico, recebemos 141 milhões para investimento em capital. Em 2022, vamos receber 3 milhões. Aqui há um processo de sucateamento da Universidade.
Condições de trabalho sucateadas
E temos um outro passivo que é do sucateamento dos prédios e das condições de trabalho. Isso envolve tudo, prédio, alvenaria, telhado, móvel, equipamento, você tem outro passivo que tem impacto direto no funcionamento da universidade. Os desafios são imensos. Eu participei da primeira reunião da Andifes como reitora, foi a primeira realizada este ano e a primeira que participei como reitora e esse é um problema não só da UFG porque o corte não foi só na UFG foi no sistema federal de ensino superior. Isso significa que temos uma luta nacional pela recomposição e suplementação do orçamento. No início de fevereiro, estive no MEC a convite do ministro e nós levamos uma solicitação de suplementação de recursos na ordem de 12 milhões para pelo menos repor aquilo que temos previsto de passivo imediato.
A Educação como plataforma de eleição
Primeiro, a nossa expectativa é que haja uma mudança de fato na gestão do país em relação as universidades, educação pública, em todos os níveis do ponto de vista do orçamento e da concepção de educação. ‘Qual é o papel da educação do país?’, nesses últimos quatro anos, três anos e meio tivemos debates inócuos, lutas desfocadas do objetivo da educação. Hoje, precisamos realmente fazer com que a pauta da educação esteja na pauta eleitoral numa perspectiva muito mais sólida e isso tem nome: garantia de orçamento, recomposição do orçamento, autonomia das universidades, dinheiro para o Fundeb para garantir que o ensino básico não perca em qualidade e avance. E outra meta extremamente importante que é a implantação do PNE, do Plano Nacional de Educação que em 2024 completa os dez anos e tem metas extremamente ousadas para o país e uma delas é a ampliação do acesso e dos jovens brasileiros a educação e ensino superior de 15 para 30% e talvez estejamos tendo uma regressão pela falta de recursos e impossibilidade de ampliação e por conta da pandemia.
Defesa da bancada da educação
Se não tivermos uma bancada que seja afinada e comprometida com as metas da educação no Brasil, elas são de longo prazo, o que tem de curto prazo é a recomposição do orçamento para que você não sucateie e não perca mais. E de longe e médio prazo temos metas extremamente importantes porque no Brasil nem 15% da juventude brasileira tem acesso ao ensino superior. Precisamos passar por um processo eleitoral que a educação esteja no centro do comprometimento de quem se candidata e de quem vai ser eleito. Isso é um compromisso das pessoas que votam.
Criação da Secretaria de Inclusão
A necessidade de aprimorar os processos de inclusão e permanência na UFG, pensando não apenas nos estudantes mas com foco neles, pensando nas populações que têm maior vulnerabilidade ou menos espaços. Foi criada a SIN, Secretaria de Inclusão e criamos a Diretoria de Mulheres que é uma das poucas universidades a ter uma diretoria de mulheres porque precisamos avançar em vários aspectos para permanência das mulheres na comunidade científica, aos estudantes, as mães estudantes, as professoras que são mães, as mulheres com deficiência, as mulheres negras, quilombolas, população lgbtia+ e são demandas que se de um lado requer investimentos, requer muito mais política e adoção de ações que façam por exemplo, nós temos um conjunto de mulheres cientistas na UFG e a visibilidade dada a elas não faz jus a competência e qualidade de produção.