SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O primeiro DVD que a goiana Marília Mendonça gravou, em agosto de 2015, foi quase intimista. Ela tinha 19 anos e cantou para pouco mais de 30 pessoas (incluindo sua equipe de produção) em Itaituba, cidade do Pará.
Pouco mais de um ano depois, em outubro de 2016, a cantora subiu ao palco para gravar seu segundo DVD, “Realidade”. Desta vez, para um público de 40 mil pessoas que se apinharam para assistir a já consagrada “rainha da sofrência” no sambódromo de Manaus. É o show deste novo DVD que ela apresenta, nesta quinta (16), na Villa Country, em São Paulo -e depois segue para uma agenda apertada, com 200 shows já vendidos ao longo de 2017.
Marília encabeça o boom de mulheres que tomaram um espaço predominantemente masculino na música sertaneja, criando o que se chamou de “feminejo”. “Não ia adiantar passar por um sofrimento, ser traída ou trair, e cantar sobre o príncipe encantado”, diz a artista, que compõe desde os 12 anos e teve hits emplacados nas vozes de Jorge e Mateus, Henrique e Juliano e de Cristiano Araújo, que morreu em 2015.
É sobre essa mulher que não pensa duas vezes antes de colocar o homem para fora de casa que ela canta. Parece que a fórmula tem dado certo -em 2016, “Infiel”, do primeiro DVD, foi a segunda música mais tocada nas rádios de todo o país, de acordo com a empresa Crowley. No YouTube, a canção contabiliza mais de 300 milhões de visualizações.
A inspiração para compor essa letra, aliás, veio de uma história verídica: a tia de Marília, que foi traída pelo marido. “Fiquei com muita raiva disso e a música saiu. Mas não deu certo, porque ela continua com ele”, brinca.
Pergunta – Por que tem tanta mulher fazendo sucesso no sertanejo?
Marília Medonça – Porque estamos tendo coragem de falar de assuntos que a gente realmente se identifica. Não ia adiantar eu passar por um sofrimento aqui, ser traída ou trair, e cantar sobre o príncipe encantado que chegou na minha vida. Nunca ia dar certo. A mulherada tomou coragem de falar sobre os assuntos que realmente vive.
Isso é o feminejo?
É isso, é a mulherada se ouvir nas músicas que são cantadas por mulheres de verdade. Não é nenhuma boneca, nenhuma coisa montada. Cada uma tem um perfil diferente, cada uma tem um biotipo diferente. E quando a mulher olha para o palco, ela se vê lá.
Você é feminista?
Eu gostaria de falar com a boca cheia que eu sou, mas existem alguns conceitos do feminismo que ainda estão deturpados e eu não concordo. É como uma brincadeira que vi na internet e que dizia: sou mulher, me depilo, tenho filhos, tenho marido, cuido da minha casa, então vão tirar minha carteira de feminista. São coisas que não têm nada a ver com o feminismo. Mas a base do movimento, de que a mulher pode ser o que ela quiser, é essa bandeira que eu levanto, não essas coisas de modinha.
De onde vem a inspiração para compor tanta sofrência?
Já levei muito chifre! Foram muitas histórias cabulosas, mas acho que agora acertei [risos]. E eu queria falar sobre esses assuntos. A música “Infiel” é a história da minha tia, que foi traída -o marido dela teve um filho fora do casameto. E aí eu fiquei p…, com muita raiva disso, e a música saiu. Mas não deu certo porque ela continua com ele. Eu não perdoaria um traição justamente por isto: vou falar que perdoei, mas na primeira briga eu vou jogar na cara e nunca mais vou confiar.
O que dá mais dinheiro: cantar ou compor?
Admiro muito mais compor do que cantar. Transmitir seus sentimentos e o de outras pessoas numa música, numa melodia, é lindo. Amo cantar principalmente quando é uma composição minha, porque eu vi ou vivi aquela história. A questão do dinheiro é relativa -para uma composição dar dinheiro, ela tem que ser um sucesso e o artista tem que tocar a sua música. Compositor é uma pessoa muito sofrida. Cantar também demora um tempo até você ir chegando nas cidades e o cachê aumentar. Mas se você trabalhar firme os dois lados, dá para ganhar dinheiro.
Tem saudades de não ser tão famosa?
Com certeza. Mas quando a gente se vê realizando o sonho, conhecendo pessoas que nunca imaginou conhecer, trabalhando com pessoas que nunca imaginou trabalhar, aí dá uma revigorada. A gente continua, lava o rosto e vai.