Intitulada “Eleições 2018: compromisso e esperança“, a mensagem da 56ª assembleia geral da CNBB ao povo brasileiro tem 11 breves parágrafos.
No primeiro, os bispos citam os dois últimos Papas: um trecho da primeira encíclica de Bento XVI, Deus caritas est: “não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça” e outro da primeira exortação apostólica de Francisco: “todos os cristãos, incluindo os Pastores, são chamados a preocupar-se com a construção de um mundo melhor“. A partir destas recomendações, os bispos afirmam: “olhamos para a realidade brasileira com o coração de pastores, preocupados com a defesa integral da vida e da dignidade da pessoa humana, especialmente dos pobres e excluídos“.
“Neste ano eleitoral, o Brasil vive um momento complexo, alimentado por uma aguda crise que abala fortemente suas estruturas democráticas e compromete a construção do bem comum, razão da verdadeira política. A atual situação do País exige discernimento e compromisso de todos os cidadãos e das instituições e organizações responsáveis pela justiça e pela construção do bem comum“, ponderam os bispos no segundo parágrafo da mensagem.
Corrupção
No terceiro parágrafo, os bispos lembram que muitos agentes deixaram a ética de lado e, por isso, a corrupção ganhou destaque. Seguem os bispos: “Nem mesmo os avanços em seu combate (da corrupção) conseguem convencer a todos de que a corrupção será definitivamente erradicada. Cresce, por isso, na população, um perigoso descrédito com a política“. E voltam a lembrar o Papa Francisco, citando a encíclica Laudato Sì, sobre o cuidado com a Casa Comum: “muitas vezes, a própria política é responsável pelo seu descrédito, devido à corrupção e à falta de boas políticas públicas”. Os bispos, mostram, desse modo, a origem de problemas dessa natureza: “De fato, a carência de políticas públicas consistentes, no país, está na raiz de graves questões sociais, como o aumento do desemprego e da violência que, no campo e na cidade, vitima milhares de pessoas, sobretudo, mulheres, pobres, jovens, negros e indígenas“.
Aumenta o número de pobres
“Além disso, a perda de direitos e de conquistas sociais, resultado de uma economia que submete a política aos interesses do mercado, tem aumentado o número dos pobres e dos que vivem em situação de vulnerabilidade. Inúmeras situações exigem soluções urgentes, como a dos presidiários, que clama aos céus e é causa, em grande parte, das rebeliões que ceifam muitas vidas“, afirmam os bispos. E apontam para uma dura realidade de nossos dias: “Os discursos e atos de intolerância, de ódio e de violência, tanto nas redes sociais como em manifestações públicas, revelam uma polarização e uma radicalização que produzem posturas antidemocráticas, fechadas a toda possibilidade de diálogo e conciliação“.
Eleições: sentido promissor
O quinto parágrafo da mensagem traz a seguinte reflexão: “Nesse contexto, as eleições de 2018 têm sentido particularmente importante e promissor. Elas devem garantir o fortalecimento da democracia e o exercício da cidadania da população brasileira. Constituem-se, na atual conjuntura, num passo importante para que o Brasil reafirme a normalidade democrática, supere a crise institucional vigente, garanta a independência e a autonomia dos três poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – e evite o risco de judicialização da política e de politização da Justiça. É imperativo assegurar que as eleições sejam realizadas dentro dos princípios democráticos e éticos para que se restabeleçam a confiança e a esperança tão abaladas do povo brasileiro. O bem maior do País, para além de ideologias e interesses particulares, deve conduzir a consciência e o coração tanto de candidatos, quanto de eleitores“.
Compromissos do eleitor
“Nas eleições, não se deve abrir mão de princípios éticos e de dispositivos legais, como o valor e a importância do voto, embora este não esgote o exercício da cidadania; o compromisso de acompanhar os eleitos e participar efetivamente da construção de um país justo, ético e igualitário; a lisura do processo eleitoral, fazendo valer as leis que o regem, particularmente, a Lei 9840/1999 de combate à corrupção eleitoral mediante a compra de votos e o uso da máquina administrativa, e a Lei 135/2010, conhecida como ‘Lei da Ficha Limpa’, que torna inelegível quem tenha sido condenado em decisão proferida por órgão judicial colegiado“, enumeram os bispos.
Alerta aos políticos
No sétimo parágrafo da mensagem, lembrando que o Brasil vive o Ano do Laicato, os bispos reafirmam as palavras enviadas pelo Papa Francisco aos participantes do encontro de políticos católicos, em Bogotá, em dezembro do ano passado: “há necessidade de dirigentes políticos que vivam com paixão o seu serviço aos povos, (…) solidários com os seus sofrimentos e esperanças; políticos que anteponham o bem comum aos seus interesses privados; que não se deixem intimidar pelos grandes poderes financeiros e midiáticos; que sejam competentes e pacientes face a problemas complexos; que sejam abertos a ouvir e a aprender no diálogo democrático; que conjuguem a busca da justiça com a misericórdia e a reconciliação“.
Conhecer os candidatos
“É fundamental, portanto, conhecer e avaliar as propostas e a vida dos candidatos, procurando identificar com clareza os interesses subjacentes a cada candidatura. A campanha eleitoral torna-se, assim, oportunidade para os candidatos revelarem seu pensamento sobre o Brasil que queremos construir. Não merecem ser eleitos ou reeleitos candidatos que se rendem a uma economia que coloca o lucro acima de tudo e não assumem o bem comum como sua meta, nem os que propõem e defendem reformas que atentam contra a vida dos pobres e sua dignidade. São igualmente reprováveis candidaturas motivadas pela busca do foro privilegiado e outras vantagens”, pedem os bispos, na mensagem.
Os bispos reunidos em Aparecida, resgatam trecho do Documento 91, da CNBB: “dos agentes políticos, em cargos executivos, se exige a conduta ética, nas ações públicas, nos contratos assinados, nas relações com os demais agentes políticos e com os poderes econômicos”. E mais: “Dos que forem eleitos para o Parlamento espera-se uma ação de fiscalização e legislação que não se limite à simples presença na bancada de sustentação ou de oposição ao Executivo”. A mensagem emenda: “As eleições são ocasião para os eleitores avaliarem os candidatos, sobretudo, os que já exercem mandatos, aprovando os que honraram o exercício da política e reprovando os que se deixaram corromper pelo poder político e econômico“.
Oportunidade crescimento
O penúltimo parágrafo: “Exortamos a população brasileira a fazer desse momento difícil uma oportunidade de crescimento, abandonando os caminhos da intolerância, do desânimo e do desencanto. Incentivamos as comunidades eclesiais a assumirem, à luz do Evangelho, a dimensão política da fé, a serviço do Reino de Deus. Sem tirar os pés do duro chão da realidade, somos movidos pela esperança, que nos compromete com a superação de tudo o que aflige o povo“
Cuidado com fake news
“Alertamos para o cuidado com fake news, já presentes nesse período pré-eleitoral, com tendência a se proliferarem, em ocasião das eleições, causando graves prejuízos à democracia“, concluem os bispos. E a mensagem termina também com o Papa Francisco: “O Senhor ‘nos conceda mais políticos, que tenham verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres’“.
ELEIÇÕES 2018: COMPROMISSO E ESPERANÇA
MENSAGEM DA 56ª ASSEMBLEIA GERAL DA CNBB AO POVO BRASILEIRO
“Continuemos a afirmar a nossa esperança, sem esmorecer” (Hb 10,23)
Nós, bispos católicos do Brasil, conscientes de que a Igreja “não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça” (Papa Bento XVI – Deus Caritas Est, 28), olhamos para a realidade brasileira com o coração de pastores, preocupados com a defesa integral da vida e da dignidade da pessoa humana, especialmente dos pobres e excluídos. Do Evangelho nos vem a consciência de que “todos os cristãos, incluindo os Pastores, são chamados a preocupar-se com a construção de um mundo melhor” (Papa Francisco – Evangelii Gaudium, 183), sinal do Reino de Deus.
Neste ano eleitoral, o Brasil vive um momento complexo, alimentado por uma aguda crise que abala fortemente suas estruturas democráticas e compromete a construção do bem comum, razão da verdadeira política. A atual situação do País exige discernimento e compromisso de todos os cidadãos e das instituições e organizações responsáveis pela justiça e pela construção do bem comum.
Ao abdicarem da ética e da busca do bem comum, muitos agentes públicos e privados tornaram-se protagonistas de um cenário desolador, no qual a corrupção ganha destaque, ao revelar raízes cada vez mais alastradas e profundas. Nem mesmo os avanços em seu combate conseguem convencer a todos de que a corrupção será definitivamente erradicada. Cresce, por isso, na população, um perigoso descrédito com a política. A esse respeito, adverte-nos o Papa Francisco que, “muitas vezes, a própria política é responsável pelo seu descrédito, devido à corrupção e à falta de boas políticas públicas” (Laudato Sì, 197). De fato, a carência de políticas públicas consistentes, no país, está na raiz de graves questões sociais, como o aumento do desemprego e da violência que, no campo e na cidade, vitima milhares de pessoas, sobretudo, mulheres, pobres, jovens, negros e indígenas.
Além disso, a perda de direitos e de conquistas sociais, resultado de uma economia que submete a política aos interesses do mercado, tem aumentado o número dos pobres e dos que vivem em situação de vulnerabilidade. Inúmeras situações exigem soluções urgentes, como a dos presidiários, que clama aos céus e é causa, em grande parte, das rebeliões que ceifam muitas vidas. Os discursos e atos de intolerância, de ódio e de violência, tanto nas redes sociais como em manifestações públicas, revelam uma polarização e uma radicalização que produzem posturas antidemocráticas, fechadas a toda possibilidade de diálogo e conciliação.
Nesse contexto, as eleições de 2018 têm sentido particularmente importante e promissor. Elas devem garantir o fortalecimento da democracia e o exercício da cidadania da população brasileira. Constituem-se, na atual conjuntura, num passo importante para que o Brasil reafirme a normalidade democrática, supere a crise institucional vigente, garanta a independência e a autonomia dos três poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – e evite o risco de judicialização da política e de politização da Justiça. É imperativo assegurar que as eleições sejam realizadas dentro dos princípios democráticos e éticos para que se restabeleçam a confiança e a esperança tão abaladas do povo brasileiro. O bem maior do País, para além de ideologias e interesses particulares, deve conduzir a consciência e o coração tanto de candidatos, quanto de eleitores.
Nas eleições, não se deve abrir mão de princípios éticos e de dispositivos legais, como o valor e a importância do voto, embora este não esgote o exercício da cidadania; o compromisso de acompanhar os eleitos e participar efetivamente da construção de um país justo, ético e igualitário; a lisura do processo eleitoral, fazendo valer as leis que o regem, particularmente, a Lei 9840/1999 de combate à corrupção eleitoral mediante a compra de votos e o uso da máquina administrativa, e a Lei 135/2010, conhecida como “Lei da Ficha Limpa”, que torna inelegível quem tenha sido condenado em decisão proferida por órgão judicial colegiado.
Neste Ano Nacional do Laicato, com o Papa Francisco, afirmamos que “há necessidade de dirigentes políticos que vivam com paixão o seu serviço aos povos, (…) solidários com os seus sofrimentos e esperanças; políticos que anteponham o bem comum aos seus interesses privados; que não se deixem intimidar pelos grandes poderes financeiros e midiáticos; que sejam competentes e pacientes face a problemas complexos; que sejam abertos a ouvir e a aprender no diálogo democrático; que conjuguem a busca da justiça com a misericórdia e a reconciliação” (Mensagem aos participantes no encontro de políticos católicos – Bogotá, Dezembro-2017).
É fundamental, portanto, conhecer e avaliar as propostas e a vida dos candidatos, procurando identificar com clareza os interesses subjacentes a cada candidatura. A campanha eleitoral torna-se, assim, oportunidade para os candidatos revelarem seu pensamento sobre o Brasil que queremos construir. Não merecem ser eleitos ou reeleitos candidatos que se rendem a uma economia que coloca o lucro acima de tudo e não assumem o bem comum como sua meta, nem os que propõem e defendem reformas que atentam contra a vida dos pobres e sua dignidade. São igualmente reprováveis candidaturas motivadas pela busca do foro privilegiado e outras vantagens.
Reafirmamos que “dos agentes políticos, em cargos executivos, se exige a conduta ética, nas ações públicas, nos contratos assinados, nas relações com os demais agentes políticos e com os poderes econômicos” (CNBB – Doc. 91, n. 40 – 2010). Dos que forem eleitos para o Parlamento espera-se uma ação de fiscalização e legislação que não se limite à simples presença na bancada de sustentação ou de oposição ao Executivo (cf. CNBB – Doc. 91, n. 40– 2010). As eleições são ocasião para os eleitores avaliarem os candidatos, sobretudo, os que já exercem mandatos, aprovando os que honraram o exercício da política e reprovando os que se deixaram corromper pelo poder político e econômico.
Exortamos a população brasileira a fazer desse momento difícil uma oportunidade de crescimento, abandonando os caminhos da intolerância, do desânimo e do desencanto. Incentivamos as comunidades eclesiais a assumirem, à luz do Evangelho, a dimensão política da fé, a serviço do Reino de Deus. Sem tirar os pés do duro chão da realidade, somos movidos pela esperança, que nos compromete com a superação de tudo o que aflige o povo. Alertamos para o cuidado com fake news, já presentes nesse período pré-eleitoral, com tendência a se proliferarem, em ocasião das eleições, causando graves prejuízos à democracia.
O Senhor “nos conceda mais políticos, que tenham verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres” (Papa Francisco – Evangelii Gaudium, 205). Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, seja nossa fiel intercessora.
Aparecida – SP, 17 de abril de 2018.
Cardeal Sergio da Rocha
Arcebispo de Brasília – DF
Presidente da CNBB
Dom Murilo Sebastião Ramos Krieger, SCJ
Arcebispo São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB