Se no front nacional Mauricio Macri enfrenta as primeiras greves, piquetes e abalos à popularidade causados pela alta inflação, no exterior o presidente argentino se mostra um protagonista regional, aproveitando o vácuo deixado por Michel Temer, afundado na crise brasileira.
A Argentina assume agora a presidência do G20 e será a anfitriã da próxima edição do encontro das maiores economias do mundo, em 2018.
Na cúpula do grupo encerrada neste sábado (8), em Hamburgo, Macri foi festejado por seus pares estrangeiros e subiu no palco ao lado de Shakira, que puxou uma onda de aplausos ao líder.
Tudo isso não se trata apenas de marketing político, como explicou à Folha o economista Marcelo Elizondo: “A relevância da presidência argentina do G20 está no fato de 12 dos 25 principais mercados para as exportações argentinas participarem do bloco. Muitas importações também provêm desses países”.
Sediar o G20 é mais um sinal de status que integra uma ampla agenda do presidente argentino na estratégia que define como “colocar a Argentina de volta no mundo”.
Desde que assumiu a Presidência, no fim de 2015, não houve mês em que Macri não recebesse ou se encontrasse com um líder estrangeiro de destaque –de países ou de organismos internacionais.
Vieram à Argentina, entre outros, Barack Obama (EUA), François Hollande (França), Justin Trudeau (Canadá) e Angela Merkel (Alemanha).
Foi recebido na Espanha e na Holanda com jantar ao lado dos reis, e acolhido em visita de Estado nos EUA por Donald Trump na Casa Branca. Visitou ainda seus pares no Japão, na China e na Itália e foi duas vezes recebido pelo papa Francisco, com quem teve rusgas passadas.
Até agora, foram poucos os latino-americanos recebidos por Trump, que tomou posse no início do ano: o peruano Pedro Pablo Kuczynski, o Nobel colombiano Juan Manuel Santos e Macri –a quem o americano estendeu toda a simpatia por causa da lembrança de negócios que suas famílias fizeram no passado.
Assim, forma-se no exterior a imagem de um presidente que, com 53% de popularidade em casa, transita com facilidade entre os poderosos do mundo e que pode vir a ser também um líder regional.
Diferentemente de Temer, Macri não faltou a posses de novos mandatários locais, mesmo aqueles com quem tem diferenças políticas.
Foi à de Kuczynski (Peru) e à de Lenín Moreno (Equador) e esteve presentes em momentos-chave para a região, como a assinatura do acordo de paz entre o governo colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), em Cartagena, em setembro de 2016.
Com alguns líderes locais, tem se encontrado com frequência, com uma agenda específica. A principal é Michelle Bachelet (Chile), com quem tenta aumentar a aproximação entre Mercosul e Aliança do Pacífico e apagar as rusgas históricas que marcaram a relação dos países.
Estreitou os laços, também, com o México de Enrique Peña Nieto –por um lado, de olho nas exportações mexicanas que podem vir a ser barradas se os EUA deixarem o Nafta (Tratado de Livre Comércio da América do Norte), e por outro, oferecendo ajuda informal a Peña Nieto para mediar negociações com Trump em temas como o Nafta e o muro na fronteira.
Recebeu, ainda, Michel Temer em Buenos Aires e viajou a Brasília. Porém, assessores na Casa Rosada o aconselham a tratar a relação com o Brasil de forma educada, porém cuidadosa, enquanto a situação política no país não se estabiliza por completo.
Entre os líderes latino-americanos, Macri tem sido um dos mais agressivos ao criticar a Venezuela.
Isso já lhe rendeu duas saias-justas. Uma delas foi numa cúpula do Mercosul, em que ouviu da então chanceler venezuelana, Delcy Rodríguez, ataques à sua política com relação a direitos humanos, e uma segunda, quando a própria Rodríguez decidiu invadir uma cúpula de chanceleres à qual não estava convidada, em Buenos Aires.
A retirada da ministra do Palácio San Martín fez com que Maduro chamasse Macri de “covarde”, a quem o mesmo recordou que “covarde é aquele que expõe sua população ao sofrimento que Maduro está causando”.
Há poucos dias, foi anunciado que o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, virá à América Latina para visitar Argentina, Colômbia, Chile e Panamá. Assim como nas agendas de Trudeau e Merkel, o Brasil não está incluído na programação.
Macri também voltou a comparecer a eventos que o kirchnerismo antes desprezava, como o Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça. Mais que isso, o novo governo se prontificou a sediar o máximo de fóruns empresariais e políticos possíveis.
Além da cúpula do G20 no ano que vem, a Argentina receberá ainda neste ano a reunião bianual da Organização Mundial do Comércio. (Folhapress)