O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado novamente nesta quarta-feira (6), desta vez a 12 anos e 11 meses de reclusão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do sítio de Atibaia, no interior de São Paulo.
O pagamento de obras na propriedade pela Odebrecht foi revelado pela Folha de S.Paulo em reportagem de janeiro de 2016.
A sentença foi dada pela juíza Gabriela Hardt, que substitui o ex-juiz Sergio Moro na Vara Federal do Paraná. “É fato que a família do ex-presidente Lula era frequentadora assídua no imóvel, bem como que usufruiu dele como se dona fosse”, escreveu a magistrada na sentença.
As obras no sítio, que era frequentado pelo petista, foram pagas por Odebrecht e OAS e pelo empresário José Carlos Bumlai, com recursos desviados de contratos da Petrobras, segundo a denúncia.
No total, foram gastos R$ 1,26 milhão nas reformas, segundo laudo da Polícia Federal, que incluíram uma cozinha planejada, a reforma de um lago artificial e a ampliação da sede do sítio.
A juíza ainda confiscou o sítio de Atibaia e determinou que, após a alienação, o valor das benfeitorias pagas pelas empreiteiras seja descontado dos proprietários em favor da União.
Para a juíza Hardt, é possível concluir “acima de dúvida razoável” que os valores para custeio da reforma da propriedade foram “oriundos de ilícitos anteriores cometidos em proveito da companhia [Odebrecht e OAS]” e que Lula “teve participação ativa neste esquema, tanto ao garantir o recebimento de valores para o caixa do partido ao qual vinculado, quanto recebendo parte deles em benefício próprio.”
Ela ainda escreveu: “Tais verbas foram solicitadas e recebidas indevidamente em razão da função pública por ele [Lula] exercida, pouco importando pelo tipo penal se estas se deram parcialmente após o final do exercício de seu mandato.”
Também foram condenados os empresários Marcelo Odebrecht e Emílio Odebrecht, Leo Pinheiro, da OAS e José Carlos Bumlai (responsáveis pelas obras no sítio); o proprietário do sítio Fernando Bittar, o advogado Roberto Teixeira, além de Paulo Gordilho, Emyr Diniz Costa Junior, Alexandrino Alencar e Carlos Armando Guedes Paschoal.
A defesa do ex-presidente ainda não havia se manifestado sobre a sentença até o início da noite desta quarta-feira.
Antes da sentença, em janeiro, os advogados de Lula entregaram a defesa final dele no processo. Em um documento de 1.634 páginas e ainda 23 anexos, questionam a tese da acusação que liga as reformas em Atibaia a crimes da Petrobras e a permanência do caso na Vara Federal em Curitiba.
A defesa buscou afastar o vínculo entre Lula e as reformas na propriedade rural. Afirma que o ex-presidente nunca foi informado sobre as benfeitorias feitas e não há provas de que ele tenha pedido obras em troca de negócios no governo.
Lula está preso em Curitiba desde abril do ano passado em decorrência de condenação em outra ação penal da Lava Jato, sobre o tríplex em Guarujá (SP) reformado pela OAS. Nesse outro caso, Lula ainda está recorrendo em terceira instância.
Em julho de 2017, o então juiz Sergio Moro havia determinado nove anos e seis meses de prisão, mas Lula teve sua pena elevada no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), em 2018.
Além das pena de prisão, a juíza também impôs a Lula o pagamento de 212 dias-multa. Os condenados ainda terão que ressarcir danos de R$ 85,4 milhões aos cofres públicos.
OBRAS SOLICITADAS
Em sua sentença, a juíza também afirmou que o ex-presidente não apenas sabia que as reformas do sítio foram custeadas pelas empreiteiras “como tais reformas foram inclusive solicitadas diretamente por ele a Leo Pinheiro [então executivo da OAS]”.
“[Lula] tinha ciência de que havia o pagamento sistemático de propinas destinadas ao partido do qual faz parte; [e] tinha plena ciência de que parte desses valores foram usados em seu benefício pessoal”, escreveu.
A juíza destacou que a denúncia “não passa pela discussão sobre a propriedade formal do sítio”.
A propriedade não está em nome de Lula nem foi adquirida com recursos do ex-presidente ou pagos em seu benefício. “[Mas] é fato incontroverso que foram efetuadas reformas e comprados objetos para atender interesses de Luiz Inácio Lula da Silva e de sua família.”
Para ela, o petista “contribuiu para a ocultação e dissimulação” da origem dos recursos usados na reforma do sítio. Notas fiscais das obras foram encontradas em seu apartamento em São Bernardo do Campo, mas seu nome nunca esteve relacionado formalmente a essas compras.
Na fundamentação da sentença, a juíza citou as irregularidades apuradas nos contratos da OAS e da Odebrecht com a Petrobras em auditorias internas da estatal, além das confissões dos próprios executivos delatores, como prova de que havia um esquema de arrecadação de propina na estatal.
A juíza rebateu as críticas de que os depoimentos dos delatores não tivessem credibilidade, como argumentou a defesa, destacando que os crimes de corrupção “não são cometidos publicamente, busca-se não deixar rastros e dificilmente é possível a comprovação por testemunhos que não os de pessoas diretamente a eles vinculados”.
“Portanto à palavra dos envolvidos tem que se dar alguma credibilidade, em especial quando se constatam vários depoimentos no mesmo sentido, corroborados, mesmo que parcialmente, por outros elementos probatórios”, escreveu.
A juíza Hardt admitiu que “não há, de fato, prova de que foi exatamente o valor pago a título de propina ao Partido dos Trabalhadores nos quatro contratos citados na denúncia que foi empregado diretamente no pagamento de campanhas ou de despesas pessoais de dirigentes do partido, entre eles Luiz Inácio Lula da Silva”.
Mas, para ela, “esse rastreamento específico não seria possível”, já que o dinheiro é “um bem fungível” e que a complexidade dos pagamentos, por exemplo, não permite que se percorra esse trajeto de forma linear.
A juíza, porém, absolveu o ex-presidente de uma das imputações da denúncia: lavagem de dinheiro no caso das reformas bancadas pelo empresário e amigo José Carlos Bumlai (que a juíza entendeu que foram solicitadas pela ex-primeira-dama Marisa Letícia, morta em 2017, aos 66 anos).
Também foi absolvido Rogério Aurélio Pimentel, ex-assessor de Lula, considerado na sentença “um mero ‘faz tudo’ do ex-presidente” e que, para a juíza, não tinha ciência de que os valores usados na reforma tivessem origem ilícita.
OUTRO LADO
Em nota, a defesa de Fernando Bittar destacou que ele “foi absolvido da maciça maioria das acusações, sendo condenado por uma única lavagem de dinheiro que será objeto de recurso”. “Importante frisar que o próprio MPF [Ministério Público Federal] reconheceu que ele era -e é- o verdadeiro proprietário do sítio de Atibaia”, escreveu o advogado Alberto Toron.
Já a defesa de José Carlos Bumlai afirmou ter tido “imensa surpresa” com a condenação do empresário. Para a advogada Daniella Meggiolaro, a sentença é “atécnica e não aponta a origem nem a ilicitude dos valores que seriam objeto da suposta lavagem”. “[Ele] jamais contribuiu financeiramente com as reformas do sítio de Atibaia”, afirmou a defensora.
A Odebrecht informou, em nota, que está colaborando “de forma eficaz com as autoridades em busca do pleno esclarecimento dos fatos narrados pela empresa e seus ex-executivos”. As penas dos funcionários e sócios da empreiteira serão cumpridas de acordo com o previsto nos acordos de delação.
A reportagem tenta contato com a defesa dos demais acusados.
Ainda cabe recurso da decisão no TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região.
Antes da sentença, em janeiro, os advogados de Lula entregaram a defesa final dele no processo. Em um documento de 1.634 páginas e ainda 23 anexos, questionam a tese da acusação que liga as reformas em Atibaia a crimes da Petrobras e a permanência do caso na Vara Federal em Curitiba.
A defesa buscou afastar o vínculo entre Lula e as reformas na propriedade rural. Afirma que o ex-presidente nunca foi informado sobre as benfeitorias feitas e não há provas de que ele tenha pedido obras em troca de negócios no governo.
PENAS DOS CONDENADOS
Luiz Inácio Lula da Silva: 12 anos e 11 meses
Marcelo Odebrecht: 5 anos e 4 meses, mas a pena foi suspensa por causa do acordo de delação
Léo Pinheiro: 1 ano, 7 meses e 15 dias
José Carlos Bumlai: 3 anos e 9 meses
Emílio Odebrecht*: 3 anos e 3 meses
Alexandrino Alencar*: 4 anos
Carlos Armando Pachoal*: 2 anos
Emyr Diniz Costa Junior*: 3 anos
Roberto Teixeira: 2 anos
Fernando Bittar: 3 anos
Paulo Gordilho: 1 ano
*Delatores da Odebrecht