O líder do PSDB na Câmara, Ricardo Tripoli (SP), disse que vai esperar até a manhã desta quarta-feira (4) que o deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) deixe a relatoria da denúncia contra o presidente Michel Temer e seus ministros na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Somente depois disso é que o destino de Andrada será definido pelo partido.
“Pedi a interlocutores que fizessem mais uma tentativa. Vou insistir até o último minuto para que ele entenda o que está acontecendo. Se ele resolver voltar atrás, ótimo. Acho muito bom”, disse Tripoli nesta terça-feira (3).
Questionado sobre a possibilidade de destituição de Andrada, o líder desconversou.
Tripoli já conversou sobre o assunto com lideranças do PSDB como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.
Contrariando pedido do líder do PSDB, Ricardo Tripoli (SP), o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), nomeou Andrada, que é da ala governista, relator da denúncia contra Michel Temer e contra dois de seus ministros.
Deputados da ala oposicionista do PSDB vêm tentando convencer Andrada a deixar a relatoria desde o final da semana passada.
O relator adotou o discurso de que sua permanência estava nas mãos de Pacheco.
“Minha linha básica é o presidente da CCJ. Não estou aspirando, desejando [a relatoria]. Recebi [a função] como um trabalho”, disse Andrada à Folha de S.Paulo na segunda-feira (2), quando a pressão por sua saída já era forte.
Os oposicionistas do PSDB passaram então a tentar convencer Pacheco, estratégia que não deu certo.
“O governo tirou a possibilidade de parte da bancada fazer uma análise exclusivamente jurídica para fazer uma análise política. Só serviu para acirrar os ânimos. Não sei onde isso é favorável ao governo porque vamos deixar de fazer uma análise técnica para fazermos uma análise política”, disse o coordenador da bancada do PSDB na CCJ, Betinho Gomes (PE).
“Apelos foram feitos e não foram atendidos”, afirmou Gomes.
“Seja qual for o relatório, vai criar animosidade com um dos grupos que está lá. Vai me criar um problema”, afirmou Tripoli.
Na sessão desta terça-feira, tucanos da CCJ também relataram constrangimento com a escolha do correligionário para a relatoria.
“Como meu partido está dividido, qualquer lado que fosse escolhido para ser relator constrangeria o outro lado. Talvez tenha faltado um pouco de sensibilidade. Estamos, sim, constrangidos”, diz Fabio Sousa (PSDB-GO).
Deputados da oposição questionaram a imparcialidade de Bonifácio de Andrada.
“Ele deixa claro que o parecer dele será favorável a Temer. O homem já declarou voto nele. O deputado Bonifácio não merecia essa carga agora. O Bonifácio, extremamente fácil, vai fazer um relatório para salvar Temer”, disse o deputado Sílvio Costa (Avante-PE).
Governistas defenderam o tucano como relator.
“Ficaria muito ruim para a Comissão de Constituição e Justiça apresentar uma suspeição sobre alguém que não a motivou”, disse o deputado Danilo Forte (PSB-CE).
“A CCJ deveria ter uma posição jurídica. Mas já não aconteceu na primeira denúncia e não será agora. Quem tiver voto é que vai vencer essa disputa. Imparcial, aqui, a gente não vai ter nenhum”, afirmou o líder do PP, Arthur Lira (AL).
Pacheco disse ter escolhido Andrada porque ele preenche requisitos técnicos.
“Peço desculpas ao PSDB se causei constrangimento partidário”, disse Pacheco.
Aos 87 anos, Andrada é aliado do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). A escolha dele para a relatoria desta segunda denúncia contra Temer foi comemorada por governistas e ampliou o racha interno no PSDB, que se divide entre apoiar ou não o governo peemedebista.
Ele votou contra a primeira denúncia, por corrupção passiva.
A expectativa é que os advogados de Temer e dos ministros Moreira Franco (Secretaria-Geral) e Eliseu Padilha (Casa Civil) -também alvos da acusação- apresentem as defesas deles nesta quarta-feira (4).
Temer e os ministros são acusados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) de organização criminosa. Temer ainda é apontado por suposto crime de obstrução de Justiça.
Na primeira denúncia, em que era acusado de corrupção, o peemedebista conseguiu congelar o caso com o voto de 263 deputados (outros 227 foram favoráveis ao seu prosseguimento). Nessa ocasião Bonifácio Andrada deu o 82º voto a favor do relatório pró-Temer.
“Senhor presidente, voto ‘sim’, a favor das instituições e do progresso do Brasil”, afirmou.
Na CCJ, Andrada foi mais enfático. Disse, por exemplo, não ver problema no encontro, sem registro oficial, entre o presidente da República e Joesley Batista. E que Temer foi gravado pelo empresário de forma “imoral”.
Ele condenou também a delação “altamente premiada” do empresário. Disse que ela “desenvolveu-se de forma incorreta, não obedeceu às determinações legais da própria lei que regulamenta a matéria”.
“A delação não só é incorreta, mas também cheia de dúvidas. Não é uma delação que merece total compreensão e total justificação, ela é falha.”
Bonifácio de Andrada não integra a lista de titulares da CCJ, o que pode resultar na curiosa situação de ele não conseguir votar a favor do próprio relatório, no caso de todos os titulares votarem.
Em seu décimo mandato na Câmara, o tucano foi um dos que reforçou o discurso contra a Lava Jato durante a tramitação da primeira denúncia: “A Câmara é a representação do povo. Os deputados não são santos porque o povo também não é santo”, disse à Folha de S.Paulo em julho.
O deputado começou na vida pública na Arena, o partido de sustentação política ao regime militar (1964-1985). Em 1984, foi um dos parlamentares que se ausentaram na votação da emenda que estabeleceria eleições diretas, o que contribuiu para a derrota da proposta.
Advogado e professor universitário, integra uma tradicional família de políticos, a linhagem de descendentes de José Bonifácio de Andrada e Silva, um dos principais articuladores da independência do país.
Dentro do PSDB, ele faz parte da ala de Aécio e, ao lado do correligionário e de ministros como Antonio Imbassahy (Governo) e Aloysio Nunes (Relações Exteriores), defende a permanência do partido no governo. A ala favorável ao desembarque é liderada pelo grupo do governador Geraldo Alckmin e é composta por vários dos deputados chamados de “cabeças pretas”, como Daniel Coelho (PE). (Folhapress)