A equipe do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e a J&F, controladora do frigorífico JBS, começaram a discutir a possibilidade de rever o acordo de delação premiada da empresa homologado em maio.
A retificação, que pode culminar no cancelamento do acordo, é consequência da polêmica envolvendo o áudio de Joesley Batista, sócio do grupo, e Ricardo Saud, ex-executivo da empresa.
A gravação levanta a suspeita de que o ex-procurador Marcello Miller, que trabalhou por três anos com Janot, atuou na negociação da delação da JBS antes de se desligar oficialmente do órgão, em 5 de abril.
Janot já decidiu pedir ao ministro Edson Fachin, relator do caso no Supremo Tribunal Federal, a revogação da imunidade aos delatores, entre eles Joesley Batista.
Para ele, houve patente descumprimento de dois pontos de uma cláusula do acordo de delação que tratam de omissão de má-fé, o que justificaria rever os benefícios.
É alta a possibilidade de o procurador-geral pedir a prisão dos delatores a Fachin, incluindo a da próprio Miller, que depôs na sexta (8) no Rio.
Segundo interlocutores da PGR (Procuradoria-Geral da República), a JBS já foi informada das intenções de Janot. Diante disso, a empresa atua para “reduzir danos”, passando a admitir nos bastidores a possibilidade de repactuar as cláusulas do acordo homologado por Fachin em troca de evitar sua anulação.
A JBS considera que, com o episódio do áudio, terá, por exemplo, que aumentar o valor da multa acertada no acordo de delação.
No acerto, os delatores da empresa se comprometeram a pagar um total de R$ 225 milhões. O montante foi considerado baixo considerando os ilícitos cometidos pelo grupo.
No caso da Odebrecht, a multa dos delatores, por exemplo, se soma em meio bilhão de reais.
Em relação a medidas cautelares, como prisão, a JBS vai esperar a posição que será enviada por Janot a Fachin antes de sugerir algo -como detenção domiciliar, por exemplo.
Representantes do frigorífico foram informados que o procurador-geral decidirá como proceder até segunda-feira (11), após os investigadores ouvirem todos os envolvidos no caso.
Segundo apurou a reportagem, os delatores aceitam negociar, mas já traçaram a estratégia para evitar a rescisão.
O caminho da defesa tem sido argumentar à Procuradoria que a empresa apresentou um volume de provas considerável, entre eles as obtidas em ação controlada, como a mala de R$ 500 mil entregue ao ex-assessor do presidente Michel Temer Rodrigo Rocha Loures.
Por meio da ação controlada, os policiais também filmaram o primo do senador Aécio Neves (PSDB-MG) recebendo dinheiro em espécie.
Na avaliação de um interlocutor da empresa, essa é a “rainha de todas as provas” por mostrar um crime que está em curso.
Representantes da JBS alegam que tirar o benefício dado aos delatores, mas usar as provas colhidas, será a destruição do instituto da delação.
A JBS destaca também que apresentou recentemente mais 50 anexos, além do áudio que gerou a polêmica.
Advogados e delatores têm insistido junto à PGR que a gravação não traz crimes e que não houve omissões, por isso o acordo deveria mantido, mesmo que com revisões.
Na quinta (7), Joesley, Saud e o advogado e também delator Francisco Assis e Silva depuseram por cerca de dez horas à PGR, em Brasília.
Joesley afirmou que não recebeu orientações de Miller para negociar um acordo de delação, nem para gravar Temer no encontro no Palácio do Jaburu, em 7 de março.
Todos relataram que consultaram Miller em linhas gerais sobre o processo de delação e que acreditavam que ele já havia saído da PGR na época. Afirmaram ainda que nenhum das gravações foi feita por orientação dele.
Joesley disse no depoimento que foi apresentado a Miller por Francisco Assis e Silva porque estava à procura de alguém para a área de anticorrupção da empresa
No áudio, além de citar a ajuda de Miller, os delatores falam sobre o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, e os ministros do Supremo Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. (Folhapress)