Aos 13 anos, João Pedro Calembo era bom aluno, atuante na igreja, carinhoso com os irmãos mais novos e queria ser engenheiro civil.
Era aluno do Colégio Goyases há cerca de cinco anos e se preparava para concluir os estudos no Colégio Militar.
Quando não estava na igreja ou na escola, estava jogando futebol ou videogame.
Ele foi a primeira vítima do atirador de 14 anos que, no final da manhã de sexta-feira (20) matou dois colegas e feriu outros quatro.
“João Pedro é mesmo cristão. Um dia chegou até mim e disse ‘pai, tenho um colega que sofre muito preconceito. Eu disse ‘meu filho, você tem que orar por ele’. Sempre ensinei a respeitar o próximo”, diz o publicitário Leonardo Calembo, 41, pai de João Pedro e dos dois irmãos dele, meninos de 6 e 8 anos.
João Pedro sentava na carteira imediatamente atrás da do atirador, no fundo da classe. Foi o primeiro a ser morto.
O pai da vítima nega a versão que o atirador e colegas de turma contaram à polícia, de que João Pedro seria desafeto do menino que efetuou ao menos 11 disparos contra os colegas de classe.
Para os investigadores, o menino premeditou o crime por causa do bullying que sofria na escola.
Colegas de escola disseram que o atirador era chamado de “fedorento” e relataram que o atirador chegou a receber um desodorante como provocação.
A polícia informou que o atirador disse em depoimento que se inspirou em duas outras tragédias envolvendo atiradores em escolas -o massacre de Columbine, em 1999, nos EUA, e o de Realengo, em 2011, no Rio.
“Não acredito nessa história de desodorante. Não existe essa história de desafeto. Bullying hoje é o nome novo a uma brincadeira que se faz há tantos anos”, diz o pai, presbítero da Igreja Batista Renascer, frequentada por João Pedro.
Para Leonardo, existe hoje uma “sociedade de filhos órfãos de pais vivos”.
A arma utilizada no crime, uma pistola .40 da Polícia Militar, era usada pela mãe do menino, sargento da PM. O pai dele é major da instituição.
“Os pais hoje não conhecem seus filhos. Acredito que foi o caso. Os pais não tinham real ideia de que o filho precisava de ajuda”, afirma o pai do menino morto, que diz ter perdoado o atirador.
“Eu já perdoei desde o início. Foi uma fatalidade.”
João Pedro morava com a família perto da escola. O pai estava em casa no momento da tragédia e estranhou a movimentação de helicóptero no local.
“Minha esposa recebeu uma ligação da mãe de outro aluno. Até então, não sabíamos o que tinha ocorrido. Entrei na escola, mas não deixaram ir até a sala de aula. Quando pisei dentro da escola, me falaram que ele tinha falecido”, relembra o pai de João Pedro.
O avô paterno do menino, Ronaldo Calembo, 70, se assustou quando uma vizinha falou que havia ocorrido um tiroteio na escola do neto dele e ele não conseguiu falar com seu filho.
“Minha nora disse ‘meu sogro, venha para cá urgente’. Pensei: aconteceu com meu neto”, relembra Ronaldo.
O avô descreve João Pedro como bom neto. “Educado, nasceu dentro da igreja.”
Para ele, a escola poderia ter identificado antes alterações no comportamento do atirador.
“Meu neto do meio dizia que o menino [o atirador] empurrava ele. Talvez tenha faltado um acompanhamento melhor da escola”, diz o avô.
João Pedro está sendo velado no cemitério Parque Memorial de Goiânia desde a madrugada deste sábado (21). O enterro deve acontecer no final da manhã.
A mãe do menino, Bárbara, é consolada por parentes e amigos ao lado do caixão onde está João Pedro, com uma miniatura de fusca preto, paixão dele e do pai.
DANIEL CARVALHO, ENVIADO ESPECIAL GOIÂNIA, GO (FOLHAPRESS)
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