O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) será intimado pela Corregedoria-Geral do Ministério Público do Estado de São Paulo a prestar depoimento sobre sua declaração de que o promotor de Justiça Marcelo Milani teria supostamente pedido propina de R$ 1 milhão para não ingressar com ação judicial contra a lei que permitia à Prefeitura emitir R$ 420 milhões em títulos chamados CIDs (Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento), que ajudaram o Corinthians a viabilizar a construção da Arena em Itaquera. A afirmação foi feita em texto publicado no site da revista Piauí.
No texto, Haddad diz que no último ano de seu mandato ficou sabendo “de um suposto incidente gravíssimo envolvendo o promotor de Justiça Marcelo Milani”.
“Fui informado de que, para não ingressar com a ação judicial, o promotor teria pedido propina de R$ 1 milhão”. “Não me restava alternativa como agente público senão levar o fato relatado ao conhecimento da Corregedoria-Geral do Ministério Público, para que fosse devidamente apurado”.
Em 2012, Milani entrou com ação judicial por improbidade administrativa contra o então prefeito Gilberto Kassab, o Corinthians e a construtora Odebrecht. Os três foram acusados de uso irregular de incentivos fiscais para financiar o empreendimento. A ação, arquivada em 2015, pedia que o ex-prefeito, o clube e a empreiteira pagassem indenização de R$ 1,7 bilhão aos cofres públicos.
Procurado pela reportagem, o ex-prefeito Haddad disse via assessoria de imprensa que “está à disposição da Corregedoria-Geral do Ministério Público para reiterar o que já via dito”. Em seu texto na revista Piauí, Haddad explica que na ocasião chamou em seu gabinete um assessor do corregedor e repassou a informação sobre o “suposto pedido de propina”. A informação teria chegado aos ouvidos de Milani, que, segundo o ex-prefeito, a partir daí teria adotado “atitude persecutória” contra ele.
A construção do Itaquerão custou R$ 1,08 bilhões, sem contar juros. Para financiar a obra, o Corinthians foi autorizado pela prefeitura de São Paulo a captar mais R$ 420 milhões por meio de emissão dos CIDs.
O processo judicial causou insegurança nos compradores potenciais dos CIDs, e até agora foram vendidos apenas cerca de R$ 48 milhões de R$ 470 milhões (em valores reajustados pela inflação). Ao todo, R$ 110 milhões estão comprometidos para empresas que manifestaram intenção de compra mas só vão realizá-la quando chegarem as cobranças de impostos. A Odebrecht, construtora do estádio, adquiriu mais de R$ 28 milhões em CIDs ao longo dos últimos anos.
Procurado pela reportagem, Milani não se pronunciou sobre as acusações.
Confira o trecho do texto em que Haddad cita o caso:
“Se o primeiro ano de governo foi marcado pelo dissabor dessa decisão, no quarto ano vivi um episódio lastimável envolvendo um membro do Ministério Público Estadual. O caso gira em torno da Arena Corinthians, construída pela Odebrecht. Como se sabe, quando prefeito, Kassab aprovou uma lei que permitia ao Executivo emitir 420 milhões de reais em títulos, em nome do clube, que poderiam ser usados para pagamentos de tributos municipais. Com isso, viabilizava-se a construção do estádio para a abertura da Copa do Mundo. Um promotor de Justiça entrou com uma ação contra essa lei. E os títulos viraram um mico nas mãos do clube e da empreiteira. Alegando que haviam sido prejudicados pela ação, Corinthians e Odebrecht reivindicaram que a prefeitura, diante do imbróglio, recomprasse os papéis, invendáveis dada a insegurança jurídica provocada pela atuação do Ministério Público.
Obviamente recusei a proposta, que seria lesiva ao município. Foi quando fiquei sabendo de um suposto incidente gravíssimo envolvendo o promotor de Justiça Marcelo Milani. Fui informado de que, para não ingressar com a ação judicial, o promotor teria pedido propina de 1 milhão de reais. Eu respondi que essa informação não mudava o teor da minha decisão, contra a recompra, e que não me restava alternativa como agente público senão levar o fato relatado ao conhecimento da Corregedoria-Geral do Ministério Público, para que fosse devidamente apurado.
Por recomendação do meu secretário de Segurança Urbana, Roberto Porto, ele mesmo membro do Ministério Público, chamei em meu gabinete um assessor do corregedor do órgão, Nelson Gonzaga de Oliveira, e repassamos a informação do suposto pedido de propina. Fizemos isso com a maior discrição. Sem uma ampla investigação, não haveria como atestar a veracidade da informação contra o promotor, que eu sequer conhecia. Minha denúncia, contudo, chegou aos ouvidos do próprio Marcelo Milani. E desde então ele adotou uma atitude persecutória contra mim.” (Folhapress)