Com novo fôlego após a reviravolta que colocou na berlinda executivos da JBS, aliados de Michel Temer pretendem usar a CPI mista recém-instalada no Congresso para criar um ambiente político que possibilite a absolvição de investigados e o desencorajamento de futuras delações premiadas.
O objetivo, segundo a reportagem ouviu de parlamentares, é direcionar o foco para eventuais falhas no trabalho de Rodrigo Janot, que deixa a chefia do Ministério Público neste domingo (17).
Sob o discurso de que a CPI irá trabalhar para “separar o joio do trigo”, a base de Temer -que controla 76% das cadeiras da comissão- pretende usar depoimentos, documentos e quebras de sigilo para dar caráter oficial a um antigo discurso de que são alvos da Procuradoria-Geral da República.
Por esse discurso, Janot e sua equipe tentaram criminalizar atividades políticas lícitas, induzindo delatores a tratar sob o único guarda-chuva da “propina” corrupção pura e simples e atividades lícitas, como doações eleitorais declaradas e recebidas sem contrapartida.
Além de minar a credibilidade da delação da JBS e, por tabela, de todas as outras conduzidas por Janot, busca-se aprovar no final a redação de um projeto de lei que altere as atuais regras de delação.
Ainda não há definição clara sobre esse texto, mas uma medida que conta com amplo apoio é o estabelecimento de penas pesadas a delatores que não apresentarem provas de suas acusações.
“A legislação da delação tem falhas. O cara delata até a mãe, inventa coisas para ser solto”, diz o deputado Beto Mansur (PRB-SP), um dos principais aliados de Temer.
A CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) da JBS passou quatro meses parada até ter sido instalada no início do mês, pouco após vir à tona áudio em que Joesley Batista e Ricardo Saud, da J&F, dão a entender que receberam orientação de investigadores para fazer o acordo.
Até as 19h de sexta (15), 151 requerimentos haviam sido apresentados pelos integrantes da comissão, cuja sessão da semana passada foi marcada por confusão.
BAIXAS
Quatro de seus integrantes, os senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES), Otto Alencar (PSD-BA), Cristovam Buarque (PPS-DF) e Dário Berger (PMDB-SC), deixaram a comissão sob o argumento, entre outros, de que a CPI é “chapa-branca” e será destinada a um “acerto de contas” da base de Temer com os investigadores.
O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), uma das principais vozes da tropa de Temer, foi escolhido relator.
Seus dois únicos requerimentos apresentados até agora pedem a convocação do advogado de Joesley, Pierpaolo Bottini, que se encontrou com Janot em um bar de Brasília um dia depois de a Procuradoria Geral pedir a prisão do executivo.
O outro pretende levar à CPI a delegada da Polícia Federal Rúbia Pinheiro, que participou de encontro em fevereiro com Francisco de Assis e Silva, diretor jurídico da JBS, para explicar como funcionaria a colaboração.
Os objetivos de Marun são provar que toda a operação que resultou nas denúncias contra Temer foi armada previamente, numa relação nebulosa entre investigadores e a JBS, com destaque para o papel do ex-procurador Marcello Miller, suspeito de atuar a favor da empresa quando ainda estava no cargo.
Miller é alvo de vários requerimentos de convocação.
“Essa é a CPI da vingança e de tentar limpar a barra dos investigados, que vão passar à condição de investigadores. É como o assaltante que bate a carteira e grita ‘pega ladrão'”, diz o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ).
Um dos sub-relatores, o deputado Fernando Francischini (SD-PR), que é delegado da PF, promete denunciar tentativas de transformar a comissão em um acerto de contas.
Mas também critica a atuação de Janot e fala em propor a mudança da lei para regulamentar a participação da PF nas delações.
(FOLHA PRESS)