O Departamento de Estado dos EUA anunciou nesta quarta-feira (20) que irá doar 32 milhões de dólares para fornecer alimentos, tratamento médico, água, saneamento básico e abrigo aos mais de 421 mil rohingyas que fugiram para Bangladesh desde o fim de agosto.
Com a medida, os Estados Unidos endossam as críticas da comunidade internacional sobre o tratamento da minoria muçulmana em Mianmar.
Trata-se da primeira resposta oficial do governo Trump à crise humanitária na fronteira entre Bangladesh e Mianmar.
O anúncio foi feito enquanto líderes mundiais se reúnem nesta semana na Assembleia Geral da ONU.
A líder de fato de Mianmar, Aung San Suu Kyi, recentemente cancelou sua participação na cúpula -uma decisão vista como uma tentativa de evitar as críticas internacionais que vem sofrendo desde o início da onda de violência contra os rohingyas.
Na terça-feira (19), Suu Kyi conversou ao telefone com o secretário de Estado, Rex Tillerson. Foi o primeiro contato desde que Tillerson assumiu o cargo, em fevereiro deste ano.
O governo americano afirmou que a quantia corresponde a aproximadamente um quarto do total necessário para contornar a crise, segundo estimativas de grupos de assistência humanitária.
A expectativa de Washington é que outros países do mundo contribuam com os três quartos restantes.
Segundo o presidente da organização Refugees Internacional, Eric Schwartz, o custo total da ajuda provavelmente chegará a centenas de milhões de dólares.
“Eu faço esse tipo de trabalho há 30 anos”, disse Schwartz. “A situação que o Exército de Mianmar criou é a pior que eu já vi em termos de miséria humana”, declarou.
Aproximadamente 421 mil rohingyas cruzaram a fronteira desde o final de agosto, segundo a ONU, fugindo de uma campanha de repressão do Exército birmanês em resposta a ataques de rebeldes da minoria muçulmana.
O fluxo de pessoas aumenta o temor de um desastre humanitário em Bangladesh, onde os acampamentos de refugiados já abrigavam cerca de 400 mil rohingyas. As condições de vida nos campos são precárias; a grande maioria se abriga em barracas e não tem acesso a saneamento básico nem à água potável.
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, e o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, condenaram na última semana as operações das forças armadas do Mianmar e as classificaram como um exemplo de limpeza étnica.
A crise ameaça prejudicar o apoio americano à transição democrática do Mianmar, que passou os últimos 50 anos sob ditadura militar.
A realização de eleições e a formação de um governo civil no país é considerada uma das principais conquistas em política externa do ex-presidente Barack Obama, que era próximo à Suu Kyi.
Ganhadora do prêmio Nobel da paz em 1991, Suu Kyi é uma peça chave na transição.
Líder da oposição ao regime militar, ela passou anos em prisão doméstica e se tornou um símbolo da luta pela democracia.
Sua chegada ao poder representou para muitos rohingyas a esperança de uma mudança no tratamento recebido pelo Estado.
Desde 1982 os rohingyas não são reconhecidos como cidadãos de Mianmar.
Como apátridas, eles não têm acesso a serviços básicos, como educação e saúde, e são proibidos de votar. Em Rakhine, Estado onde vive a maioria deles, a lei os proíbe de ter mais que dois filhos e os obriga a fazer trabalhos forçados.
Na terça-feira (20), ela rompeu o silêncio e minimizou os danos causados pelo Exército Birmanês.
Suu Kyi afirmou que o país receberia os rohingyas que desejassem retornar, desde que passassem um teste de “verificação” de suas identidades.
ONGs criticaram a medida, afirmando que a grande maioria dos rohingyas não possui documentos oficiais por não serem considerados cidadãos de Mianmar.
Simon Henshaw, um diplomata americano sênior responsável por assuntos de migração e refúgio, aplaudiu a iniciativa de Suu Kyi mas afirmou que a líder deveria garantir a segurança das regiões afetadas antes do retorno dos rohingyas.
A Constituição de Mianmar, que foi introduzida pela junta militar que governou o país, prevê que as forças armadas são um “quarto poder” e não se submetem ao Executivo, Legislativo ou Judiciário.
Esse dispositivo é uma das razões pela quais Suu Kyi tem tido uma atuação limitada na crise dos rohingyas. A viabilidade de um governo civil depende de uma coexistência com os líderes militares, que ainda detêm certo poder.
No início do mês, a Turquia prometeu enviar alimentos e roupas para os campos de refugiados rohingyas em Bangladesh. (Folhapress)