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Categorias: Brasil
| Em 7 anos atrás

E-mails revelam lobby dos portos para influenciar decreto de Temer

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RUBENS VALENTE – BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – E-mails e atas de reuniões anexados aos autos da Operação Patmos, que investiga o presidente Michel Temer, revelam que o lobby de empresários do setor portuário influiu e inseriu trechos inteiros em um decreto presidencial em maio passado.

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Os documentos foram anexados pela defesa do empresário Ricardo Conrado Mesquita ao inquérito que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre Temer e seu ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR).

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Mesquita é executivo da Rodrimar e membro do conselho deliberativo da ABTP (Associação Brasileira dos Terminais Portuários). Formada por 71 empresas com 170 terminais portuários, a entidade representa interesses de grandes grupos como Santos Brasil, Libra Terminais, Cargill, CSN, Usiminas e Braskem, braço petroquímico da Odebrecht.

Ao entregar os documentos, Mesquita quis explicar aos investigadores o motivo dos frequentes contatos que mantinha com Loures, que foi preso após receber uma mala com R$ 500 mil em espécie do frigorífico JBS.

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Segundo o empresário, Loures era o interlocutor das empresas portuárias com o Planalto.

O decreto que alterou a legislação do setor, de número 9.048, mudou resolução anterior sobre o tema: a de número 8.033, de 2013.

A ata de uma reunião da ABTP diz que as mudanças foram elaboradas pelos próprios empresários.

“O decreto 8.033 está sendo revisto a partir de pedidos e sugestões encaminhadas pelas entidades e suas associadas”, afirma o documento, reproduzindo a fala de advogado do escritório contratado pelos empresários, o Piquet Carneiro Advogados.

Os empresários argumentavam que as medidas eram necessárias para diminuir “a intervenção estatal”, aumentar a segurança jurídica e destravar investimentos de mais de R$ 23 bilhões.

Em 2 de setembro de 2016, o governo instalou um grupo de trabalho, formado por diversos órgãos públicos, para revisar a legislação. No mês seguinte, os empresários formataram suas propostas e as enviaram ao ministro Maurício Quintella (Transportes).

Em ata, os empresários definiram uma série de medidas para a ação do lobby, incluindo “atuar em todos os fóruns onde temas portuários forem discutidos. Em especial, no Congresso, na Frenlog [Frente Parlamentar de Logística de Transporte] e na frente parlamentar da Agricultura”. Os empresários recorreram ao senador Wellington Fagundes (PR-MT), da Frenlog.

Eles diziam atuar em busca de “um nome com notável saber jurídico ou econômico que escreva um artigo bem fundamentado sobre a importância, para o setor e para a economia nacional, dos objetivos contidos na proposta de revisão normativa do decreto número 8.033, como encaminhada pela MTPAC [Ministério dos Transportes]”.

Os executivos afirmaram que iniciariam a segunda fase de sua atuação “apenas após a publicação do novo decreto”, e que queriam “alinhar as ações acima com as demais entidades da coalizão empresarial”.

O artigo foi publicado em órgãos da imprensa por Wilen Manteli, advogado e diretor-presidente da ABTP.

A “fase dois” é uma menção ao que seria um esforço seguinte do grupo empresarial. Em mensagem à Folha, a associação afirmou que se trata de “um novo ciclo de conversas abertas, transparentes —fruto de uma democracia que lutamos muito para construir— com o Congresso Nacional. Isso porque ainda há alterações legais a serem feitas”.

Em dezembro de 2016, um dos e-mails entregues por Mesquita ao STF mostra que os empresários tiveram sucesso nas reuniões com servidores da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) nas discussões sobre o decreto.

“As notícias, de maneira geral, são bastante positivas. Todos os nossos pleitos remanescentes estão tendo uma boa acolhida junto à Antaq, exceto apenas a minuta-padrão de contrato de adesão”, diz a mensagem.

Em março deste ano, o presidente da ABTP, Antonio Carlos Sepúlveda, da Santos Brasil, informou aos membros do conselho da entidade que esteve em Brasília conversando com os diretores da Antaq e com o ministro Quintella.

“Ficou claro que não houve alteração de posição quanto ao decreto. Tanto Antaq quanto o ministério mantêm o apoio às entidades e à minuta acordada. Entretanto, tanto Antaq a quanto o ministro acham que não existe existe clima no momento para avançar na Casa Civil e que teremos que aguardar o retorno do ministro [Eliseu] Padilha para continuar a negociação da minuta com os técnicos da Casa Civil”, afirmou Sepúlveda.

Em abril, a ABTP informou aos seus filiados que haviam sido formuladas três minutas para o novo decreto, o que demonstra que a entidade teve acesso antecipado aos termos da futura legislação.

“A terceira e atual minuta de decreto trouxe significativos avanços, contemplando um total de 19 temas, sendo 15 decorrentes da proposta original de 21 pontos das entidades, e 4 novos temas propositivos submetidos pelo grupo de trabalho”, diz um texto distribuído à entidade.

O decreto acabou assinado por Temer com a inclusão de várias reivindicações do setor portuário. Porém, ficou de fora —contra os interesses do lobby portuário— um grupo de empresários que obteve concessões antes de 1993.

A Folha comparou as propostas encaminhadas pelo setor com o texto final do decreto e encontrou inúmeros trechos idênticos. Sugestões dos empresários para revogar trechos inteiros também foram acolhidas.

Em mensagem encaminhada à reportagem, o senador Fagundes calculou que, “após intensos debates [no grupo de trabalho], 43% das propostas apresentadas pelas entidades”.

Outro lado

Em nota, a Secretaria de Comunicação do Palácio do Planalto afirmou que o novo decreto sobre legislação dos portos ocorreu após “um longo processo de negociação entre o governo e o setor empresarial, como é comum e legítimo em uma democracia”.

“Houve amplo debate com o setor antes da publicação do decreto de renovação das concessões de portos. Todos os dados são públicos. O assunto não comportava nenhum sigilo ou informação privilegiada”, informou a secretaria.

O órgão afirmou ainda que “só foram atendidos os pleitos das empresas licitadas depois de 1993. Tudo antes disso, que era uma reivindicação de várias empresas, foi rejeitado”.

A ABTP afirmou, em nota, que “não houve lobby empresarial, mas sim disposição do governo em ouvir, de forma democrática e republicana, as entidades empresariais representativas do setor”. Segundo a entidade, as mudanças trazidas pelo novo decreto “vão destravar investimentos na ordem de R$ 23 bilhões nos próximos anos”.

“Em todo o processo desse diálogo franco, paciente e transparente com o Governo Federal, sobretudo com o MTPAC [Transportes] e a Antaq, enfatizamos que o setor portuário tem enorme capacidade de investimento, mas se ressente de dois problemas que se agravaram nos últimos anos: a falta de segurança jurídica para investimentos, o excesso de burocracia e de intervencionismo estatal na atividade portuária”, diz a ABTP.

“A ABTP participou das reuniões que fora convidada com o GT [grupo de trabalho] e com os órgãos públicos envolvidos com os portos nacionais. E o fez através de conselheiros e da sua diretoria executiva. Em 5 de outubro do ano passado, numa reunião pública, amplamente divulgada pela mídia tradicional e pelos canais próprios de entidades do governo e da sociedade civil, entregamos a esse GT uma proposta com seis pontos que deveriam merecer a atenção do governo e ser objeto de alterações infralegais.”

Outra entidade do setor, a Abtra (Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados), expressou por meio de seu presidente, Bayard Umbuzeiro Filho, “oficialmente total concordância com o teor das respostas enviadas” pela ABTP à Folha.

O Ministério dos Transportes afirmou, em nota, que “foram 90 dias de trabalho e 30 reuniões com o acompanhamento permanente da AGU (Advocacia Geral da União) e da Controladoria Interna deste Ministério”.

“Ao final, o GT [grupo de trabalho] apresentou ao ministro Maurício Quintella Lessa um relatório técnico-jurídico com vistas à desburocratização, maior segurança jurídica, previsibilidade, redução de riscos, atração de investimentos, simplificação de processos e a retomada dos investimentos”, comenta a pasta.

A Antaq disse que “não chamaria de lobby” a atividade dos empresários em torno do decreto. “A ABTP, como associação, tem a legitimidade de participar das discussões. É até importante ouvi-la, pois seus associados estão no dia a dia do setor portuário e fazem investimentos.”

O senador Wellington Fagundes (PR-MT) afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “o decreto em questão foi uma construção coletiva”.

“As entidades participantes do grupo de trabalho trouxeram ao debate, objetivamente, importantes observações e contribuições dentro de sua visão associativa e participativa na defesa direta dos interesses dos titulares de instalações portuárias, e que foram amplamente debatidas, discutidas e aperfeiçoadas.”

Segundo o senador, “foram acolhidas pelo grupo de trabalho, após intensos debates, 43% das propostas apresentadas pelas entidades”. (Folhapress)

 

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