O ministro Marco Aurélio, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou nesta quarta-feira (13) a favor que a polícia possa fechar acordo de delação premiada com réus investigados.
O ministro Alexandre de Moraes concordou com a possibilidade de a polícia fazer delação, mas divergiu no ponto que trata sobre pedir o perdão judicial.
Um dos artigos da lei que baliza a delação premiada determina: “Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial”.
Este ponto foi questionado pelo Ministério Público junto ao STF. Os procuradores entendem que, se a polícia pedir o perdão, estará usurpando o trabalho deles.
A outra questão levantada pelo Ministério Público trata sobre o direito de a polícia negociar acordo sem a participação de procuradores. Neste quesito, os dois ministros concordam que é prerrogativa da polícia fazer a negociação.
A ação está sendo discutida no plenário da corte, por 9 dos 11 ministros que integram o tribunal -Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski não participam da sessão.
O julgamento foi suspenso para os magistrados almoçarem e deve ser retomado no início da tarde.
A questão envolve uma disputa de poder entre Ministério Público Federal e polícia -mais especificamente entre a PGR (Procuradoria-Geral da República) e a Polícia Federal.
O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot pediu ao Supremo que sejam declarados inconstitucionais os artigos da lei sobre colaboração que permitem à polícia fechar um acordo de forma independente do Ministério Público.
A posição foi sustentada por sua sucessora, Raquel Dodge. O argumento central dos procuradores é que o Ministério Público é o único órgão que pode oferecer denúncia e, portanto, que pode acordar punição.
Ou seja, cabe ao Ministério Público -e não ao delegado- a titularidade da ação penal, seja para oferecer denúncia ou pedir arquivamento de uma investigação. Assim, afirma a Procuradoria, se a polícia negocia perdão de pena com um delator, está usurpando o poder dos procuradores.
O ministro Marco Aurélio, no entanto, destacou que a lei determina que os procuradores do caso devem se manifestar sobre os acordos fechados pela polícia.
“Há previsão específica da manifestação do Ministério Público em todos os acordos entabulados no âmbito da polícia judiciária, garantindo-se, com isso, o devido controle externo da atividade policial já ocorrida e, se for o caso, adoção de providência e objeções”, afirmou.
A polícia, por sua vez, sustenta que a delação é uma maneira de obter provas e, sendo assim, cabe aos investigadores fazer acordo com investigados que queiram colaborar com a Justiça. Portanto, afirmam, fechar uma colaboração é mais uma maneira de buscar elementos probatórios, assim como a interceptação telefônica e a quebra de sigilos.
A questão não se restringe à Polícia Federal, pois a lei fala em “delegado de polícia”, o que incluiria a civil. Assim, os delegados poderiam fazer acordos para investigar crimes como tráfico de drogas, por exemplo.
Na Lava Jato, a Polícia Federal tem questionado alguns acordos devido à falta de provas apresentadas pelos delatores.
A PF fechou ao menos três delações, decorrentes das operações Lava Jato e Acrônimo, mas que ainda não foram homologados pelo STF.
“A supremacia do interesse público conduz a que o debate constitucional não seja pautado por interesses corporativos, mas por argumentos normativos acerca do desempenho das instituições no combate à criminalidade. A atuação conjunta, a cooperação entre órgãos de investigação e de persecução penal, é de relevância maior. É nefasta qualquer ‘queda de braço’, como a examinada”, disse Marco Aurélio.
Um dos pontos levantados por Marco Aurélio é a concentração de poder nas mãos do Ministério Público, caso o órgão seja o único com a prerrogativa de negociar delação. Assim, impedir a polícia de fazer delação deixaria os procuradores com super poderes.
Ele também ressaltou que os benefícios de uma delação podem ser revistos ou anulados, caso o juiz não concorde com o que foi acordado e se as provas apresentadas não forem suficientes.
“Os benefícios que tenham sido ajustados não obrigam o órgão julgador, devendo ser reconhecida, na cláusula que os retrata, inspiração, presente a eficácia da delação no esclarecimento da prática delituosa, para o juiz atuar, mantendo a higidez desse instituto que, na quadra atual, tem-se mostrado importantíssimo”, afirmou.
“Longe fica o julgador de estar atrelado à dicção do Ministério Público, como se concentrasse -e toda concentração é perniciosa- a arte de proceder na persecução criminal, na titularidade da ação penal e, também, o julgamento, embora parte nessa mesma ação penal.”
Alexandre de Moraes concordou que a polícia pode negociar delação, mas divergiu do relator no ponto que a lei fala sobre a possibilidade de pedir perdão judicial.
Segundo ele, se a polícia pedir o perdão judicial pode acabar por colocar obstáculos no trabalho do Ministério Público.
“Entendo que a autoridade policial pode realizar acordo de delação premiada. Não há inconstitucionalidade de regra. Obviamente se não tiver trabalho conjunto, de nada vai adiantar, porque depois o Ministério Público arquiva a investigação”, disse Moraes. (Folhapress)
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