Após o Brasil apresentar queda de 60,4% na média móvel de mortes provocadas pelo coronavírus, a doença passou a ocupar a terceira posição em letalidade, ficando atrás do infarto e do Acidente Vascular Cerebral (AVC), segundo o Portal de Transparência dos Cartórios de Registro Civil do Brasil.
Os dados apresentados mostram ainda que o recuo de mortes por Covid-19 foi de 895,36 óbitos no dia 18 de fevereiro deste ano para uma média de 354,3 até a última segunda-feira (21).
Enquanto isso, entre os dias 16 a 22 de março, foram registrados 843 óbitos por AVC em todo país, nesta mesma semana, houve 421 mortes em decorrência da Covid-19.
Os casos de óbitos provocados pelo infarto também estão em alta em todo país, no mesmo período foram registradas 782 mortes. Portanto, até o último dia 22, o acumulado do mês de março, aponta 4.453 óbitos por AVC, 4.157 por infartos e 3.549 por Covid, conforme os dados do Portal da Transparência.
O Diário de Goiás conversou com o médico Cardiologista e Presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia Regional Goiás (SBC-GO) Drº Humberto Graner. O médico destaca que as mortes provocadas por doenças cardiovasculares sempre estiveram em alta no país, mesmo antes da Covid-19.
‘’Doenças cardiovasculares são as que mais matam. Tivemos um fenômeno não esperado, que foi a questão desse novo vírus pandêmico e obviamente as coisas mudaram um pouco o foco nos últimos dois anos. As coisas estão voltando às normalidades, vimos aí números de contaminação em queda, mesmo aos últimos casos mais leves relacionados a ômicron com a maioria da população vacinada e máscaras sendo liberadas. Então você vê as coisas voltando à normalidade. E quando fala em normalidade, implica também na parte epidemiológica, ou seja, a gente já voltou a preocupar com problemas maiores com as doenças que mais matam no país’’, destaca Humberto Graner.
Nas redes, internautas estão asssociando o aumento de casos de doenças cardiovasculares com as vacinas anticovid. Portanto, Humberto Graner garante que não há nenhuma evidência de que vacinas contra a Covid-19 ou qualquer outra provoque infarto, seja em qualquer faixa etária.
O aumento de doenças cardiovasculares tem alguma relação com a vacina anticovid?
Não, de maneira alguma. O que nos leva a fazer um trocadilho de uma epidemia em torno de AVC. Muita gente está tendo um AVC, derrame ou infarto? Sim. Afinal, é a maior causa isolada de morte. Os números estão muito semelhantes ao que a gente via em 2019. Só que agora as coisas estão voltando as normalidades, a gente olha aqueles gráficos das principais causas de mortes, de hospitalização, você vê que o Covid está deixando de ser um ‘ator’ importante no sistema de Saúde.
Existe alguma vacina anticovid que pode provocar algum tipo de doença cardiovascular?
Sim. Isso foi mostrado principalmente com as vacinas que utilizam a Tecnologia Adenovírus. No caso aqui para nós, é a representante da Astrazeneca. Então houve realmente uma associação de que a Astrazeneca poderia causar algum evento trombótico, mas qual é a magnitude? Cerca de 3 casos de trombose para cada 1 milhão de vacinas recebidas. É um efeito adverso da vacina? Sim, mas muito raro.
O médico Humberto Graner explica que este é um fenômeno extremamente raro entre adolescentes. O caso da adolescente Ingrid Távora, de 17 anos que morreu no último dia 16 após sofrer um infarto, na cidade de Cezarina, a 60km de Goiânia desperta atenção e cuidados.
Apesar da causa da morte de Ingrid ter sido registrada como acidental, a família da adolescente afirma que ela faleceu por decorrência de um infarto. Humberto Graner explica que, por mais que a causa do óbito está sob investigação, de fato Ingrid teve uma morte súbita.
O médico explica que uma esse tipo de morte pode ocorrer por vários fenômenos, principalmente nesta faixa etária, onde a maioria delas são problemas congênitos ou hereditários, ou seja, é preciso uma análise médica para ver se a adolescente tinha uma anomalia coronariana ou uma miocardiopatia congênita.
Este não é o primeiro caso de infarto em adolescente registrado em Goiás. No dia 11 de janeiro de 2022, o jogador Pedro Henrique Oliveira da Silva Souza, de 15 anos, morreu por conta de um infarto durante um torneio da copa Nacional de Futebol, em Goianésia, região Central de Goiás. O adolescente teve um ataque fulminante e morreu no local, mesmo após ter sido encaminhado para um hospital da cidade.
Outro caso aconteceu na cidade de Morrinhos, região Sul de Goiás. No dia 22 de fevereiro, um adolesccente de também 15 anos desmaiou durante o intervalo da aula e foi socorrido pelo Corpo de Bombeiros até ao hospital da cidade, de lá ele foi transferido para Goiânia, e no dia 3 de março não resistiu e morreu com suspeita de um infarto fulminante.
No ano passado, o jogador de base do Atlético Goianiense, Fellipe, de 18 anos. O zagueiro passou mal em campo, sofreu duas paradas cardíacas e foi encaminhado ao hospital. Na ocasião, o atendimento foi feito por médico Lucas Ricci, que afirmou que Fellipe sofreu uma parada cardíaca ainda no Centro de Treinamentos do Dragão. Depois de um primeiro atendimento, o jogador foi encaminhado para uma unidade de pronto socorro no Setor Urias Magalhães, próximo ao CT, e ainda sofreu outra parada cardíaca. Foi necessário o uso de desfibrilador para reanimar o zagueiro Fellipe.
Há aumento nos índices de casos de infartos entre jovens e adolescentes ?
Entre jovens e adolescentes, não. Percebe-se que estamos vendo uma maior incidência de infarto em pacientes adultos entre 30 e 40 anos, coisa que nós não víamos antes. Víamos muito infarto em pacientes entre 50 e 60 anos, depois idades entre 40 e 50 anos também aumentou e agora estamos vendo um pouco mais de casos em pacientes entre 30 e 40 anos. Abaixo de 30 continua um fenômeno raro. Portanto, é preciso entender se realmente, no caso específico da adolescente Ingrid Távora, ela morreu de infarto ou de um mal súbito de uma outra doença subjacente em que a família não conhecia o diagnóstico.
O que pode provocar um infarto em uma pessoa jovem?
Há uma situação que se soma aos hábitos atuais. Jovens que são colocados sob uma pressão cada vez maior. A gente entende que um dos aceleradores desse fenômeno de infarto mais precoce tem a ver com uma má alimentação, fatores de ciclos emocionais ou psicossociais entrando em evidência. Ou seja, jovens que estão sendo colocados sob pressão como por exemplo mercado de trabalho, estudos etc.
Mas hoje a gente reconhece fatores psicoemocionais como ansiedade, estresse, Burnout, depressão como gatilhos evidentes para estes pacientes mais jovens que não são muitas vezes portadores de outras doenças, outros fatores de risco cardiovasculares mais graves. Ou seja, não só o obeso, o fumante, o sedentário. E isso preocupa, a gente vê uma pessoa que entenderíamos que deveria estar buscando sua carreira, mas a gente percebe que ele é marcado com uma doença cardiovascular aos 30 anos.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) se posicionou sobre a segurança cardiovascular das vacinas contra a Covid-19. Leia na íntegra:
O Comitê Científico da SBC, por determinação do seu Conselho Administrativo, organizou um grupo de trabalho para monitorar e organizar, de forma continuada e sistemática, evidências científicas da segurança cardiovascular das vacinas contra COVID-19, com o objetivo de reproduzir dados cientificamente sólidos e oferecer recomendações para o cardiologista brasileiro na forma de posicionamento da SBC.
O resultado desse trabalho resultou em um Posicionamento sobre Segurança Cardiovascular das Vacinas contra COVID-19 – 2022 que conclui que as vacinas contra COVID-19 são seguras e seus benefícios superam em larga escala os riscos de efeitos adversos relacionados.
Os principais efeitos adversos cardiovasculares associados a essas vacinas são a VITT e a miocardite. Ao passo em que o primeiro está associado às vacinas que utilizam vetor de adenovírus, o segundo é observado entre as vacinas com tecnologia de RNAm.
Miocardite associada à vacina permanece um evento adverso raro, embora a incidência entre adolescentes do sexo masculino possa chegar até 107 casos por milhão de doses, e excede a incidência de miocardite associada à COVID-19 na mesma parcela da população. No entanto, como o curso clínico da miocardite associada à vacina é geralmente leve e autolimitada, mesmo entre os adolescentes do sexo masculino, a totalidade do efeito protetor da vacinação contra COVID-19, particularmente na prevenção de COVID-19 grave, hospitalização, MIS-C e morte, continua a exceder claramente o risco de miocardite induzida.
Ainda segundo a posição, na faixa etária pediátrica, os benefícios vão além daqueles diretamente relacionados à saúde do próprio paciente, também diminuindo a transmissão da COVID-19 nessa faixa etária e, indiretamente, para indivíduos mais velhos.
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