A delação dos executivos da JBS saiu do roteiro normal das colaborações premiadas após o dono da empresa Joesley Batista ter gravado conversas com o presidente Michel Temer, com o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e com o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR).
Mesmo sem ter os acordos dos delatores assinados e homologados pelo STF (Supremo Tribunal Federal), a Procuradoria-Geral da República pediu autorização à corte superior para a realização de escutas telefônicas e o uso da técnica investigativa chamada de “ação controlada”.
A principal justificativa dada pela Procuradoria ao STF foi a de que as gravações indicavam, à época, a possibilidade da ocorrência de novos crimes, como mais pagamentos de propinas a políticos.
Normalmente, o caminho das delações mostra que os primeiros contatos entre possíveis colaboradores e procuradores têm como resultado a assinatura de um termo de confidencialidade entre as partes.
Em seguida, são realizadas muitas reuniões de negociação, nas quais são apresentados os assuntos a serem descritos nas delações, além das discussões sobre os benefícios aos colaboradores.
Se as tratativas são bem sucedidas, passa-se então à fase de coletas dos depoimentos dos delatores.
Somente após essa etapa, o acordo é assinado e levado à Justiça. O juiz competente analisa apenas os aspectos formais da colaboração, e se ela estiver regular, ocorre a aprovação. Esse ato é denominado homologação na linguagem técnica jurídica.
Em regra, com base nas informações fornecidas nas delações homologadas, o Ministério Público e a Polícia Federal pedem à Justiça a adoção de medidas investigativas, como prisões, escutas e buscas.
Porém no caso dos delatores da JBS não foi essa a trajetória das colaborações.
No dia 7 de abril, o procurador-geral da República Rodrigo Janot comunicou o STF sobre negociações ainda em curso com os executivos da JBS, que àquela altura haviam levado apenas à assinatura de uma espécie de acordo preliminar, e informou sobre as gravações.
Na petição à corte, Janot explicou que se tratava de uma situação incomum.
“Diferentemente de episódios anteriores, nos quais a colaboração cingia-se a fatos criminosos pretéritos, a presente negociação de acordo trouxe à baila crimes cuja prática ou o seu exaurimento estão ocorrendo ou por ocorrer, em datas previstas ou previsíveis”, escreveu.
Segundo Janot, tal fato tornava obrigatória uma intervenção urgente para investigar e interromper condutas como eventuais novos pagamentos de propina em favor de Aécio, do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e do suposto operador de Cunha, Lúcio Bolonha Funaro.
Na petição, Janot ainda pediu ao STF que o delegado da Polícia Federal Josélio Azevedo de Sousa, responsável pelas apurações, fosse impedido de compartilhar informações das investigações com outras pessoas, inclusive seus superiores hierárquicos, o que também não é usual.
O ministro do STF Edson Fachin deferiu esse e os outros pedidos de Janot em despacho datado de 10 de abril.
Somente depois que as ações de investigação baseadas nas informações dos executivos da JBS já estavam em curso é que os acordos de delação premiada deles foram assinados, no dia 3 de maio.
O pacote de documentos com as cláusulas dos acordos e os testemunhos dos colaboradores foi enviado por Janot ao STF em 8 de maio.
O prêmio previsto pela Procuradoria aos delatores foi o não oferecimento de denúncia criminal, o que na prática evita processos e condenações na Justiça.
Esse tipo de benefício também não é o mais comum nas delações. A fixação de redução do tempo de penas é muito mais frequente nos acordos de colaboração.
A Procuradoria afirmou que a premiação aos delatores da JBS justifica-se “em razão do ineditismo de muitos dos temas trazidos pelos colaboradores, da atualidade das ilicitudes reportadas e da grande utilidade tanto para investigações em curso como para novas frentes de apuração”.
Fachin analisou os aspectos formais do acordo e homologou as colaborações em 11 de maio, quando grande volume de provas já havia sido obtido pela Procuradoria e PF. (Folhapress)