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Com Tejota, Roberto Freire admite novas ideias, mas não abre mão de valores do Cidadania

Roberto Freire fez críticas a Bolsonaro e falou de momento do Cidadania. (Foto: Diário de Goiás)

O presidente nacional do Cidadania, deputado federal Roberto Freire, admite que a filiação de Lincoln Tejota à sigla traz novas ideias e areja o partido. O parlamentar, no entanto, garante que jamais abrirá mão de valores democráticos em seus quadros.

Em entrevista exclusiva ao Diário de Goiás, Freire afirmou que o vice-governador é o tipo de perfil que o Cidadania procura, com compreensão de mudanças sociais e de um fenômeno que ele classifica como sociedade da inteligência artificial.

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” É um jovem, com alguns setores ligados a ele, que tem boa compreensão disso. Claro que tem ligações com passado. Todos temos. É um processo, não é ruptura. Você não deixa de ser o que era e passa a ser um novo. É uma transição”, pondera. “Nós estamos num processo de renovação, mas trazemos valores muito claros, na questão democrática e com coragem”, reforça ao dizer que não abre mão dessas bandeiras.

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Críticas ao governo federal

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Freire também fez duros apontamentos contra o governo de Jair Bolsonaro. O parlamentar disse que o presidente desrespeita e atenta contra a democracia, a Constituição e as instituições do país, flertando com um regime autocrático. Segundo ele, é importante lutar por estes valores.

“Bolsonaro nunca foi comprometido com a democracia. Ele tem toda sua história vinculada à ditadura militar. Sempre adepto, sempre enaltecendo. Inclusive, tem como um de seus ídolos um torturador. Veja que grande figura. Desrespeita direitos humanos, liberdade e democracia. Ele nunca escondeu”, pontuou.

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Confira a entrevista com Altair Tavares na íntegra

No seu discurso, o senhor disse que a luta é pelo reforço da democracia. Por quê?

É fundamental sempre. É a luta pela liberdade. Eu aprendi muito isso. Algumas pessoas não conseguem entender muito o velho comunista. É como se fôssemos adeptos da ditadura do proletariado. Lá atrás foi. Mas o PCB, quando entrei, já tinha feito toda uma reforma sobre o valor universal da democracia. Foi a única força política que não entrou em processo de luta armada. A luta foi democrática contra a ditadura. Enquanto outros setores, imaginando derrotar a ditadura pela via armada. Era um sinal do valor da liberdade e da democracia. Essa compreensão de que a democracia é fundamental já vem de algum tempo.

O senhor citou que a democracia está sob ameaça…

Sem dúvida alguma. Bolsonaro nunca foi comprometido com a democracia. Ele tem toda sua história vinculada à ditadura militar. Sempre adepto, sempre enaltecendo. Inclusive, tem como um de seus ídolos um torturador. Veja que grande figura. Desrespeita direitos humanos, liberdade e democracia. Ele nunca escondeu. Assume a presidência elogiando Pinochet e ditadores do mesmo porte. Se posiciona contra a ditadura da Venezuela para querer dizer que é diferente do PT, mas é igual. Pode não gostar da Venezuela, mas gostava da de Pinochet e daqui. Ele se leva por ideologia. Nós nos levamos por valores de liberdade e democracia. Ele não tem isso. No governo, estamos vendo cotidianamente atentados à Constituição. É como se uma instituição para ele não valesse. Ele começou governando imaginando que poderia fazê-lo por meio de decretos. Ainda bem que o Congresso revogou alguns deles, evidentemente inconstitucionais e atentatórios às liberdades. Recentemente tivemos essa crise institucional, que ainda não está resolvida, mas ele recuou porque a sociedade brasileira reagiu de forma contundente e unida: imprensa, instituições como o Congresso, Supremo, com uma nota duríssima, e quase todos os partidos políticos. Ele se isolou. Apenas os bolsonaristas apoiavam. Vão tentar fazer uma manifestação a favor de Bolsonaro, mas todo aquele caráter sedicioso contra o Congresso teve que recuar.

Qual sua visão sobre esse futuro do país no contexto dessa crise?

Essa crise não foi a primeira nem será a última. Só espero que não tenha a dimensão e os riscos que essa envolve. Até porque houve uma grande reação da sociedade e nós do Cidadania estamos dizendo a todas as forças que querem a manutenção da democracia no país que se mantenham unidas nessa posição com uma grande frente ampla e democrática. Não temos que discutir nossas divergências. Vamos deixar isso para eleições, quando tivermos nossos projetos. Agora temos que ser forças políticas que respeitem as liberdades, a Constituição e a democracia. Tem que se respeitar, da mesma forma que se respeita Bolsonaro, o Congresso e o Supremo.

Seria uma ironia que Bolsonaro consiga que o país tenha uma frente democrática sendo antagônico a isso?

Não é ironia. É necessária. Se fosse um governo que não tivesse ações autoritárias e autocráticas, ninguém precisava estar preocupado com a democracia. Você teria na presidência alguém que respeitava a liturgia democrática, a Constituição, independente das suas posições políticas e ideológicas. Mas infelizmente não temos.

Ronaldo Caiado, maior apoiador de Bolsonaro em Goiás, não ouviu. Foi um discurso, de certa forma, crítico ao presidente…

Mas não era crítico a Ronaldo Caiado. Até porque eu o conheço bem. Tenho divergências com ele, sempre tive, não é de agora. Nos conhecemos ainda na primeira eleição presidencial. Nós dois fomos candidatos em 89. Tínhamos posições divergentes durante a Constituinte, vários embates. Depois tive uma convivência com ele e o respeito. É um cidadão decente. Tem suas posições de que eu discordo, temos muitas divergências, mas ele nunca se mostrou alguém contra as instituições democráticas. Ele nunca participou de nenhuma campanha para fechamento de Congresso, contra o Supremo Tribunal Federal. Temos que reconhecer isso. E tive muito cuidado, mesmo ele não estando presente, em não fazer um discurso mais crítico do que o que fiz, pois eu faço. Não o fiz em respeito a ele, mas não podia deixar de colocar aquilo que é fundamental no país. As forças democráticas precisam estar alertas, pois o governo Bolsonaro não respeita a democracia e a Constituição.

Qual a expectativa com a constituição de uma nova liderança no partido em Goiás?

O mundo está mudando muito e de forma acelerada. Costumo dizer que estamos vivendo na sociedade do pós-capitalismo. Não sei se vamos chamá-la de sociedade da inteligência artificial. Isso muda tudo, as relações sociais, de família, de trabalho, políticas e institucionais. Eu diria que estamos num ciclo revolucionário, na acepção da palavra. É mudança das estruturas, da forma de produzir, nos reproduzirmos, na vida. Isso, evidentemente, está se refletindo na política e nos partidos. Essa compreensão que fez com que esse partido mais velho da história brasileira, que somos nós, tivesse a capacidade de entender que o mundo tinha mudado, tínhamos sido derrotados no nosso projeto histórico e que tínhamos de mudar. A mudança se deu e continua se dando. O Cidadania está na busca efetiva de uma nova formação política, não só um novo partido. Você hoje vê até falar em mandatos coletivos. Na Câmara dos Deputados, você percebe vários plenários, pois todos estão com celular fazendo transmissões aos vivos para seus plenários, seus seguidores. O mundo exige nova compreensão política, novos paradigmas. Nesse sentido, não tenho que buscar quem pensava como eu antigamente. Aquilo que pensávamos, já não tem mais aplicação atualmente. Fomos derrotados e quem falar as mesmas palavras de ordem se transforma em força reacionária, mesmo achando que é de vanguarda. Não é.

Quais são as palavras de ordem que ficarão para trás?

Todas elas. Por exemplo, ficar imaginando que a classe operária iria fazer a mudança substancial em todas as classes sociais. Ainda há aqueles que ficam imaginando que a classe operária e suas instituições está valendo nesse novo mundo da inteligência artificial. Não está mais. Eu costumo dizer, quando encontro alguns setores de esquerda, até muito radicais, que falam em estatizar os bancos, digo: “qual? das nuvens?” Se você vive hoje num mundo em que tem moedas e não têm bancos nacionais lhe dando lastro. Como ficar imaginando senão num mundo global analisando novas realidades? Quem é que consegue, em estados nacionais, tratar de questões financeiras? Não se trata nem mais dos seus nacionais por conta de um processo de migração de forma avassaladora num mundo sem fronteiras. Esse mundo que está aí exige novas concepções, novo tipo de organização e representação. O Cidadania busca isso. Jovens que admitem discutir esta nova sociedade são muito bem-vindos.

O senhor encontrou isso em Lincoln Tejota?

É um jovem, com alguns setores ligados a ele, que tem boa compreensão disso. Claro que tem ligações com passado. Todos temos. É um processo, não é ruptura. Você não deixa de ser o que era e passa a ser um novo. É uma transição. O Cidadania quer afirmar. Nós somos um processo de renovação, mas trazemos valores muito claros, na questão democrática e com coragem.

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Rafael Tomazeti: Jornalista