Publicidade
Categorias: Política
| Em 6 anos atrás

Bolsonaro deve gastar bala política para aprovar Previdência, diz executivo do J.P. Morgan

Compartilhar

Publicidade

A aprovação da reforma da Previdência pode separar o Brasil dos demais emergentes em um ano que promete ser mais desafiador para as economias em desenvolvimento, afirma Luis Oganes, chefe de pesquisa para commodities, câmbio e mercados emergentes do banco J.P. Morgan.

À reportagem, ele recomenda que o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), gaste sua “bala política” para conseguir aprovar as mudanças na aposentadoria, consideradas pelo mercado peça-chave para devolver o equilíbrio fiscal ao país.

Publicidade

“O Brasil tem a oportunidade de se distinguir do resto dos emergentes ao aprovar a reforma. Porque faria algo bom por ele mesmo em um tempo em que a classe inteira de ativos, de emergentes, estará sob pressão por causa do Fed [banco central americano] e das discussões sobre a recessão americana”, diz.

Publicidade

Caso contrário, complementa, o Banco Central pode ser obrigado a subir mais os juros para evitar uma saída excessiva de capitais que possa pressionar a inflação. “Se Jair Bolsonaro quiser usar uma bala política para conseguir fazer algo, mesmo que o restante seja adiado, ele tem que fazer a reforma da Previdência”, ressalta.

PERGUNTA – O que espera os mercados emergentes em 2019?
LUIS OGANES – Este ano foi muito desafiador para emergentes. No segundo trimestre, o mundo começou a ficar com um crescimento dessincronizado. Os EUA continuaram a crescer e nós vimos crescimentos decepcionantes em Europa, Japão e mercados emergentes -parte na China, mas também em outros lugares, como no Brasil, onde tivemos de reduzir as perspectivas de crescimento.
Quando olhamos para o próximo ano, achamos que muita dessa desaceleração de crescimento já ficou para trás, com exceção da China, onde esperamos desaceleração -de 6,6% neste ano para 6,1%.
Sem a China, o resto dos emergentes chegou a uma espécie de estabilidade. Inicialmente seria uma boa notícia. O problema é que esperamos que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) continue a elevar os juros. Isso significa que vai haver mais competição por capital entre os EUA e emergentes. Se você tem 1,5% de juro real nos EUA e 2,5% em emergentes, por que vai ficar com o risco emergente? Isso vai forçar uma reprecificação nos emergentes.
A outra coisa é que, na segunda metade do próximo ano, todo mundo vai estar discutindo os próximos cenários recessivos nos EUA. Quando isso acontece, você tem um baque na confiança e no apetite a risco. Então, embora o crescimento dos emergentes não pareça tão ruim em 2019, provavelmente vai ter um apetite a risco menor por ativos emergentes, seja dívida ou ações.

Publicidade

P – Isso vai forçar os emergentes a subir os juros?
LO – No momento em que você começar a ver os mercados desenvolvidos subirem os juros, você vê mais competição por dinheiro. Se os emergentes querem continuar competindo por dinheiro, precisam subir os juros, para compensarem os investidores pelo risco. Esperamos que mais da metade dos emergentes suba os juros no próximo ano, incluindo o Brasil.
Esperamos a primeira alta da Selic em junho de 2019, levando o juro a 8,75% no final do próximo ano. Muito disso é uma precaução, porque não esperamos que a inflação suba.

P – Como você vê o Brasil no próximo ano?
LO – O desafio do Brasil, todos sabem qual é. O Brasil não tem um problema de contas externas, o problema é fiscal. E não há outra forma de resolver que não seja uma reforma da Previdência. Esse é o maior item, se você olhar para o orçamento no Brasil, que levou à dinâmica explosiva. A dinâmica vai continuar crescendo se não houver reforma. A esperança é que Jair Bolsonaro, quando assumir, faça uma pressão agressiva por isso.
Claro que ele não tem maioria no Congresso, então ele vai precisar do apoio de outros partidos. Muita da incerteza remanescente sobre se ele terá a capacidade política de passar uma reforma decente e de relevo é o apoio que terá de outros partidos. Como ele não tem maioria, nós precisamos moderar nossas próprias expectativas de quão agressiva a reforma da Previdência será.
Pode ser mais modesta, o que significa que, daqui a alguns anos, seja preciso fazer outra. Essa é a questão. Mas algo tem que acontecer neste front. A coisa mais importante para os mercados é ver uma reforma da Previdência, mesmo se for uma modesta, sendo aprovada em 2019. Não há tempo a perder.

P – E o mercado vai dar algum tipo de prazo para ele, um ano, seis meses?
LO – Historicamente, e isso não é só no Brasil, vemos em todos os emergentes, a lua de mel é muito curta. Se um governo não pressiona para conseguir as coisas no começo, cada ano que passa se torna mais difícil. Na segunda metade de qualquer governo, as pessoas já começam a falar das próximas eleições. Os políticos não querem apoiar nada, então aprovar no Congresso se torna mais problemático. O mercado terá paciência, mas no sentido de que algo terá que acontecer em 2019.
Se passarmos o ano inteiro e nada acontecer, vamos ver pressões, porque aí a relação PIB/dívida continua a crescer, você tem o risco de mais rebaixamentos, e nós já estamos vendo uma situação difícil para emergentes de uma maneira geral.
O Brasil tem a oportunidade de se distinguir do resto dos emergentes ao aprovar a reforma. Porque faria algo bom por ele mesmo em um tempo em que a classe inteira de ativos emergentes estará sob pressão por causa do Fed, das discussões sobre a recessão americana, etc. E talvez o Brasil continue atraindo fluxo de capitais, mesmo que possamos ver saída de outros emergentes. E se o Brasil não fizer a lição de casa, acho que, como todo o resto, o Banco Central pode precisar subir mais os juros porque você vai ver mais pressão no real, e mais saída de capitais e mais risco de inflação. As coisas estão muito delicadas no momento, acho que o mercado está colocando muita esperança em Bolsonaro, deliberadamente. Vamos esperar que ele faça isso.

P – Que outras reformas são importantes?
LO – Nada é tão importante quanto a reforma da Previdência. A esperança é que, se Jair Bolsonaro quiser usar uma bala política para conseguir fazer algo, mesmo que o restante seja adiado, ele tem que fazer a reforma da Previdência. Esperamos que ele não seja distraído por outras coisas, pensando que ele pode fazer a reforma depois, que vai ter tempo. Porque não vai ter tempo.

P – Quais as perspectivas para o Brasil no próximo ano?
LO – Neste ano estamos vendo 1,2% de crescimento, e isso vai para 2,3% no próximo ano. Então é uma dinâmica de crescimento melhor, a inflação ainda sob controle. Neste ano temos 3,9%, no próximo ano, 4,4%. O real vai ficar mais fraco. Neste ano, deve terminar em R$ 3,9, isso sobe para R$ 4,1. Mas estamos basicamente esperando moedas mais fracas ao redor do mundo.

P – Quais os principais desafios para fortalecer a economia brasileira?
LO – Precisa diversificar, exportar mais. Precisa basicamente se abrir, expor os produtores locais à competição. O problema é que muitos dos produtos feitos no Brasil são caros, então é difícil exportar. Eu lembro que, quando eu cresci no Peru, muitos carros que eram importados da Nissan, Honda, Volkswagen, vinham do Brasil. Em algum momento eles pararam de importar do Brasil porque a produção era muito cara, e o governo peruano começou a importar do México, que é mais longe, mas era muito mais barato.
Então basicamente o Brasil precisa fazer reformas. Cortar impostos, mais flexibilidade no mercado de trabalho, mais eficiência para tornar a produção no Brasil mais competitiva internacionalmente. O Brasil tem uma indústria forte, mas a maioria vai para consumo doméstico, não para exportação.
Outra coisa que o Brasil precisa fazer, que eu acho que Jair Bolsonaro quer fazer também, é abrir o comércio além do Mercosul. Porque o Mercosul está sendo um clube de países protecionistas que se apoiam e, quando tem um problema, começam a impor tarifas uns aos outros. Não foi uma dinâmica de bloco comercial. Se o Brasil se abrir, vai forçar uma competição para os produtores brasileiros, que precisam dessa competição. Eles precisam ser forçados a se desenvolver e a se tornar mais eficientes.

P – Que oportunidades você vê para o Brasil?
LO – O mercado gastou a maior parte de 2018 muito preocupado com as eleições. E se você olhasse a posição dos participantes do mercado em ativos brasileiros, em ações e renda fixa, diminuiu pela maior parte do ano. Acho que há espaço para os investidores comprarem ativos brasileiros se Bolsonaro começar a entregar as reformas. Vai ser um ano difícil, mas podemos ver o Brasil como entregando os melhores retornos em emergentes, se os problemas forem enfrentados.
O México, por exemplo, é o contrário. Os investidores estão muito expostos ao México, em títulos e ações, e agora estamos muito preocupados com os sinais iniciais do [presidente eleito] AMLO. Então o Brasil pode se posicionar para receber o fluxo de dinheiro que sai do México.

Publicidade