Após promover um encontro com as principais vítimas de abusos sexuais por parte de religiosos chilenos, nas últimas semanas, e depois, com 34 bispos deste país, desde a última segunda-feira (14), o papa Francisco recebeu nesta sexta-feira (18) o pedido de renúncia de toda a delegação de religiosos que havia viajado a Roma.
Os escândalos de pedofilia e abusos sexuais no Chile por parte de bispos e sacerdotes ganharam projeção durante a visita do papa ao Chile, em janeiro. Durante sua passagem pelo país, um grupo de vítimas insistiu em reunir-se com o pontífice para entregar-lhe provas dos abusos, mas o papa Francisco se recusou a recebê-los e reafirmou acreditar na inocência dos religiosos.
O caso, porém, cresceu tanto nos meios, que o pontífice chamou as vítimas a Roma para escutá-las. O principal acusado é o bispo Juan Barros (um dos que renunciou nesta sexta), que é acusado de ter encoberto e participado dos atos de pedofilia pelo qual já havia sido afastado de seu posto o sacerdote Fernando Karadima.
Em um comunicado, os bispos disseram que entregavam o caso ao papa para que “livremente decidisse o que fazer com cada um de nós.” No texto, também pedem desculpas “pela dor causada às vítimas, ao papa, aos povos de Deus e ao país por nossos graves erros e omissões.”
Os bispos afirmaram que continuarão em suas funções até que o papa decida seu futuro.
Na última segunda-feira (14), o papa havia se reunido, no Vaticano, com os 34 acusados pelas vítimas para analisar as denúncias de “abuso de poder e sexuais”.
Francisco também teria apresentado o resultado de um informe realizado no país por um enviado do Vaticano, o arcebispo Charles Scicluna. Após a leitura desse documento, o papa pediu que todos refletissem e orassem.
O detonador dos abusos foi o chamado caso Karadima, acusado por abusos cometidos nas décadas de 1970 e 1980. O papa Francisco atribui ao caso Karadima a disseminação desse tipo de delito, de abusos a menores, citando o informe de seu enviado ao país.
Isso, segundo a interpretação do pontífice, estaria por trás do fato de o Chile vir se transformando, nos últimos tempos, no país mais laico da região, depois do Uruguai, e estaria causando o afastamento de fiéis da Igreja Católica.
Esse distanciamento dos fiéis ficou evidente durante a visita de Francisco ao país, no começo do ano, em que houve episódios violentos, como a queima de igrejas.
Quando o pontífice recebeu o informe de seu enviado, Scicluna, que entrevistou mais de 60 vítimas dos religiosos chilenos, enviou uma carta aos bispos dizendo ter cometido um “um grave erro” ao defender os religiosos chilenos, e os convocou a Roma, onde houve o encontro da segunda-feira (14).
Depois dos dias de reflexão, os bispos, então, apresentaram sua renúncia nesta sexta (18), deixando nas mãos do papa Francisco a decisão sobre seu destino. “Estes dias de diálogo com o papa foram importantes para que todos refletissem obre uma mudança que é necessária”, diz o comunicado dos religiosos. Além de pedir perdão às vítimas, os bispos as elogiaram por sua “valentia e perseverânça em busca da verdade”.
À imprensa italiana, Fernando Ramos, bispo auxiliar de Santiago, disse que o relatório do enviado do papa que fez as investigações no Chile causou “imenso espanto e grande preocupação” devido à “extensão e a quantidade dos delitos apontados”. E acrescentou: “o texto lido pelo papa indica com claridade uma série de fatos absolutamente reprováveis que ocorreram dentro da igreja chilena em que foram usados de modo inaceitável o poder dos religiosos, que abusaram por consciência e sexualmente, de pessoas que estavam sob nossa proteção”.
Os 34 bispos depois se expressaram individualmente diante do pontífice e nesta sexta-feira entregaram sua carta de renúncia. No Brasil, existem atualmente 321 bispos.
A vítima que liderou as acusações, e que vinha dialogando com o papa, Juan Carlos Cruz, que hoje vive nos EUA, declarou por meio das redes sociais. “Todos os bispos renunciaram. Inédito e bom. Isso muda as coisas para sempre.” (Folhapress)