O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), rebateu nesta terça-feira (19) as críticas do colega Gilmar Mendes sobre a condução das investigações da Lava Jato pela PGR (Procuradoria-Geral da República) e disse que eles têm “diferentes visões da vida e do país”.
“Não acho que há uma investigação irresponsável. Há um país que se perdeu pelo caminho e naturalizou as coisas erradas”, afirmou.
Na última sessão do STF em 2017, os ministros julgam recursos dos investigados nas ações que envolvem o presidente Michel Temer. Os alvos da PGR pedem para que as investigações sejam sobrestadas, assim como as duas denúncias apresentadas contra o presidente da República, que foram barradas pelos deputados federais.
Gilmar interrompeu o voto do colega Dias Toffoli para criticar a condução do ex-procurador-geral Rodrigo Janot na Lava Jato. Ele e Janot protagonizaram diversos embates públicos ao longo dos últimos dois anos.
Gilmar disse que o STF se depara agora com “o que é o peso de um trabalho mal feito”, o qual classificou de “precipitado”, “sem análise” e que “causa esse tipo de constrangimento” para o tribunal. Com o voto de Gilmar, a segunda turma do STF livrou nesta segunda-feira (18) quatro políticos denunciados por Janot na Lava Jato e seus desdobramentos de virarem réus no Supremo.
“Ontem decidimos vários casos que com base em delação não poderia se oferecer a denúncia. O que é importante é que o relato era totalmente falso”, disse Gilmar.
Segundo ele, há um sentimento “Janotista”.
“Esse era o trabalho que se fazia. Trabalho mal feito. Acabamos de ver a policia federal. o delegado da Polícia Federal dizer trabalho mal feito”, afirmou, em referência aos relatórios da PF que não sugerem indiciamento de políticos por não encontrarem indícios de autoria e materialidade dos crimes.
Durante as críticas, o ministro usou as expressões “grande patifaria”, “grande erro” e “populismo criminal judicial” e “serviço malfeito, corta e cola”.
“Erros graves que temos cometido. A história não vai nos poupar.”
“Há diferentes de formas de ver a vida e todas merecem consideração e respeito. Eu gostaria de dizer que eu ouvi o áudio ‘Tem que manter isso aí, viu’. Eu quero dizer que eu vi a fita, eu vi a mala de dinheiro, vi a corridinha na televisão”, afirmou, em referência ao momento em que um vídeo feito pela PF mostra o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures pega uma mala de dinheiro entregue pela JBS e sai correndo em frente a uma pizzaria em São Paulo.
Ele acrescentou que leu os depoimentos de delatores da Lava Jato, como os do doleiro Alberto Youssef e do corretor de valores Lúcio Funaro, que incriminaram dezenas de políticos.
“Vivemos uma tragédia brasileira, a tragédia da corrupção que se espalhou de alto a baixo sem cerimônia. Um país em que o modo de fazer política e negócios funciona assim: o agente político relevante escolhe o diretor da estatal ou ministro com cotas de arrecadação. E o diretor da estatal contrata em licitação fraudada a empresa que vai superfaturar a obra ou o contrato público para depois distribuir dinheiros. Aí não faz diferença se foi para o bolso ou se foi para a campanha, porque o problema não é para onde vai [o dinheiro], mas de onde vem”, afirmou.
Barroso disse ainda que “a cultura de desonestidade que se cria de alto a baixo com maus exemplos em que todo mundo quer levar vantagem, todo mundo quer passar os outros para trás, todo mundo quer conseguir o seu, sem mencionar as propinas para financiamento, tudo documentado”.
E então defendeu a condução de Janot na Lava Jato.
“São diferentes visões da vida e do país. Não acho que há uma investigação irresponsável. Há um país que se perdeu pelo caminho, naturalizou as coisas erradas, e temos o dever de enfrentar isso e de fazer um novo país, de ensinar as novas gerações de que vale a pena fazer honesto, sem punitivismo, sem vingadores mascarados, mas também sem achar que ricos criminosos têm imunidade. Porque não têm. Tem que tratar o menino pego com cem gramas de maconha da mesma forma que se trata quem desvia milhões de reais.” (Folhapress)