São Paulo – Quando Neymar levou as mãos às costas naquele 4 de julho de 2014, o Brasil imediatamente colocou as mãos na cabeça. A seleção perdia ali seu melhor jogador, a esperança de levar o time ao hexa da Copa do Mundo. E olha que a jogada do colombiano Zúñiga, que derrubou Neymar e um país inteiro, nem falta foi considerada pelo árbitro.
O atacante teve a terceira vértebra lombar esquerda fraturada e deixou o gramado da Arena Castelão, em Fortaleza, de maca para não voltar mais. Para muitos, o Brasil perdeu o Mundial ali. Neymar era o cara. Felipão sempre soube disso, mas teve pouco tempo para repensar o time sem ele. O rival da semifinal era a Alemanha, candidata ao título desde que pisou no Brasil. Deu no que deu.
Sem Neymar, com o grupo abalado, a surra foi doída, com ecos para sempre na história do futebol. “Eu queria muito essa Copa, disputar uma final, mas não deu”, disse Neymar antes da eliminação do Brasil, ainda na Granja Comary, em Teresópolis (RJ), já de volta de Fortaleza após a contusão. Sua tristeza era do tamanho do País.
Para contar a dependência da seleção a Neymar, é preciso voltar no tempo quatro anos. Dunga era o técnico e o Brasil ganhava tudo. Havia Kaká, Robinho, Luis Fabiano, Elano e outros que davam ao treinador a certeza de não precisar de um moleque que assombrava na Vila Belmiro. Na verdade, eram dois: Neymar e Paulo Henrique Ganso. Era tratados como bons jogadores, mas promessas. Neymar ainda tinha cabelo sarará. Nem de longe era o craque em que se transformou de um Mundial para o outro.
Em 2014, quando apresentou a lista para a Fifa e para a torcida brasileira, Felipão não pensava em uma equipe sem o menino do Santos, que já jogava no Barcelona. Era ele e mais 10, em uma condição até diferente de outras Copas. Neymar se transformou no único craque do time. Não havia outro como ele. Por isso, quando deixou o campo diante da Colômbia, o Brasil parou.
Na abertura da Copa do Mundo, na vitória brasileira por 3 a 1 sobre a Croácia, Maradona já fazia a leitura da importância do atacante. “O Brasil jogou bem, mas teve problemas nas laterais. É um time muito dependente do Neymar. Não é um time imbatível”, disse o argentino. Pelé, antes do Mundial, disse o seguinte. “Não é só o Neymar que vai ganhar a Copa. Precisamos de uma equipe. Pela primeira vez na seleção vejo a defesa melhor do que o ataque. Não podemos colocar a responsabilidade de vencer em cima do Neymar”.
O torcedor levará para sempre a dúvida sobre o resultado se Neymar estivesse em campo. Nunca se saberá. Machucado, viu a surra sem poder ajudar. De lá para cá, carrega o Brasil nas costas. Não há sequer um companheiro para dividir o fardo. No tri do México, em 1970, Pelé era Pelé, mas havia Rivellino, Gerson, Tostão… Em 1994, Romário teve a ajuda de Bebeto, que contou com uma zaga imponente e um meio de campo seguro. Em 2002, Ronaldo tinha Rivaldo ao seu lado e Ronaldinho Gaúcho chegando por trás. Em 2014, havia Neymar e muitas incertezas.
Nesse um ano dos 7 a 1, a fama do craque aumentou na mesma proporção que a dependência do Brasil de seu futebol. Desde que assumiu o posto de Felipão, Dunga nunca escondeu isso. Seus companheiros também sabem dessa realidade e aceitam a situação. Não há outro como Neymar. No Barcelona, ganhou tudo ao lado de Messi e Suárez. Aumentou fortuna e fama. Fora de campo, a negociação do seu contrato do Santos para o Barcelona continua a ser investigada pela Justiça. Há processos na Espanha contra ele e seu pai, suspeitos de terem levado dinheiro não declarado na negociação.
Nesse intervalo de 365 dias, Neymar ganhou condição de “pop star” na seleção. Com Dunga, atuou em 11 partidas. Ganhou 10 e marcou 9 gols de um total de 20, quase 50%. Seus números já eram bons com Felipão: entrou em campo 27 vezes, ganhou 19 e marcou 18 gols. Da mesma forma, foi importante quando esteve sob o comando de Mano Menezes. Em 27 jogos, comemorou 16 vitórias e balançou as redes 17 vezes – 31% dos gols do Brasil. Ao todo, Neymar já marcou 44 gols pela seleção.
E foi dessa forma que ele levou o Brasil para o Chile na Copa América, primeiro torneio pós 7 a 1. Dunga deu a Neymar a confiança de que ele precisava, além da braçadeira de capitão. O Brasil suou para se classificar. Na partida contra a Colômbia, marcada pelo encontro de Neymar com seu algoz da Copa, Zúñiga, nova confusão. Neymar estava irreconhecível com a bola nos pés e mais ainda nas discussões.
Na véspera, ele e o pai tinham sido acusados em outro processo na Espanha. O Brasil perdeu o jogo e Neymar foi expulso. De novo o time teria de se virar sem ele. Fracassou diante do Paraguai. O filme dos 7 a 1 se repetia, em curta metragem, um ano depois, gerando incertezas e desconfiança.
(Estadão Conteúdo)